domingo, 27 de dezembro de 2020

A Luta de Classes e o Ódio às Minorias nas Pequenas Coisas do Trânsito


Patrões, trabalhadores, ricos, pobres, capitalistas, anarco-sindicalistas, homens, mulheres, brancos e pretos, esquerda e direita... No fundo em bom português "cada um puxa a brasa à sua sardinha". Mas há coisas muito simples de observar para vermos como as pessoas não se sabem colocar no lugar dos outros e ostracizam sempre o mais fraco. 

Olhemos, por exemplo, para a estrada. Já percebi só de ouvir os colegas e pessoas à minha volta falar, bem como lendo o que se escreve nas redes sociais o quanto os portugueses em geral odeiam os ciclistas. Porquê? Há alguma coisa racional nisto tudo? Se calhar ainda diz muito do país atrasado, ou do pensamento atrasado que ainda temos, ao contrário de muitos países da Europa onde o uso da bicicleta é visto como algo muito positivo, onde até se criam faixas só para bicicletas (como na imagem) enquanto, pelo contrário, o uso do carro é demonizado. 

Fazer ciclismo, seja de lazer como eu e muitos portugueses fazem, seja de forma mais profissional com bicicleta de estrada, a verdade é que é uma prática saudável, que faz muito bem ao corpo e além dos benefícios para a saúde evita gastos com o SNS (que somos todos que o pagamos), mas também, e não é nada de desprezar, é uma prática amiga do ambiente porque não poluiu. No entanto as pessoas odeiam os ciclistas. Faz isto algum sentido?

Não, não faz. As pessoas odeiam os ciclistas como odeiam os pretos, como infelizmente ainda muitos homens odeiam as mulheres, como muita gente odeiam os estrangeiros, ou as pessoas que têm tatuagens, que têm os cabelos compridos, que fazem swing, no fundo, odeiam tudo o que é diferente delas.

Eu ando todos os dias de carro. Mas também uso a bicicleta. E morasse eu mais perto do emprego que certamente iria trabalhar de bicicleta. Quero com isto dizer que estou nos dois lugares. Se calhar quem critica os ciclistas não anda de bicicleta. Mas se calhar, se dum de um dia para o outro os brancos ficassem pretos se calhar entenderiam melhor o racismo. Se calhar se os homens de um dia para o outro virassem mulher, se calhar, entenderiam melhor a discriminação e assédio que as mulheres são alvo. Se calhar, se  também andassem de bicicleta na estrada perceberiam o perigo que é levar uma razante de um carro, e prestariam mais atenção sobre as notícias a dar conta das dezenas de mortes de ciclistas nas estradas portuguesas, vidas que se perdem de forma estúpida, simplesmente causada pela irresponsabilidade de alguns assassinos ao volante. Se calhar, se também andassem de bicicleta nas estradas não se punham a queixar dos segundos que perdem para ultrapassar um ciclista, ainda que eu saiba quão preciosos são esses segundos para poderem atualizar a rede social enquanto conduzem. 

Toda a gente tem direito a andar na estrada: peões, ciclistas, animais, carros, camiões. Os ciclistas foram equiparados aos automóveis, ou sea, agora têm prioridade nas rotundas e sempre que se apresentem pela direita, quando antes isso não acontecia e tinham que parar para deixar passar toda a gente. Bem sei que os maiores anticorpos contra os ciclistas é por causa das ultrapassagens. Mas 'meu amigo', se não há espaço, pois que esperem. Todos nós esperamos nove meses para nascer, não foi? 

Nas estradas há dois ódios de estimação: os ciclistas e os carros sem carta. "Porque só andam a atrapalhar". É como se não tivessem o mesmo direito que os outros a andar na estrada. É o mesmíssimo pensamento que muitas pessoas, que acham que lhes corre sangue azul nas veias, pensam dos pobres nas universidades, pensam dos pobres que estudam doze anos, pensam dos pretos ou das mulheres à frente das empresas ou à frente de um país. 

O trânsito nas estradas pode ser uma boa metáfora para a sociedade e para a politica que rege a sociedade. Devemos viver em comunidade, devemo-nos respeitar uns aos outros, e não achar que somos melhores que os outros, que temos mais direitos que os outros, principalmente que os mais desprotegidos. Se todos fizermos a nossa parte, automobilistas e ciclistas, o mundo, seja nas estradas ou na vida em geral, será bem melhor para todos. 

O Brio Pode Mais Que o Frio

 

Ontem, enquanto pedalava pelas ruas do Porto e observava tranquilamente tudo o que se passava ao meu redor, fiquei com uma dúvida depois de por mim terem passado, em momentos diferentes, dos carros descapotáveis com a capota aberta. A temperatura máxima para o dia eram 12º, não era propriamente calor, e eu perguntei-me: será que o ar condicionado faz efeito com a capota aberta?

Na rádio tinha ouvido aconselharem o uso de roupa quente, casacos, luvas, gorros, tudo o que se tiver à mão e ao gosto do freguês para as pessoas se aquecerem. A maioria das pessoas que via na rua assim faziam, muitos casacos,  cachecóis, carapuços e gorros. Mas eis senão quando passa por mim uma jovem de cabelos aloirados, de topzinho fininho preto, sem mangas e toda ela também descapotável!  

Bem sei que os jovens, até porque eu já fui um, não é?!, têm mais sangue na guelra e são mais acalorados, mas o calor é outro, chama-se brio. Há uma expressão portuguesa que retrata bem este tipo de situações: "O brio pode mais que o frio". 

sábado, 26 de dezembro de 2020

Porque é Que os Asiáticos Resolveram o Problema Pandémico e os Ocidentais Não?

 Ontem, dia de Natal, a grande generalidade dos portugueses ainda estava a dormir porque se deitou muito tarde porque ficou à espera do Pai Natal que este ano não veio porque lhe mataram as renas todas na Quinta da Torre Bela e já eu andava de bicicleta junto ao rio Douro. Mas não satisfeito, logo após o almoço que aqui em casa dos meus pais é sempre ao meio-dia, meti a bicicleta no reboque e rumei em direção à cidade do Porto. Deixei o carro a três quilómetros do Freixo, peguei na bicicleta e fui dar uma volta, para exorcizar do meu corpo os últimos vestígios de bolo-rei da noite anterior. Fiz o passadiço de Valbom e rumei ao passadiço de Rio Tinto, passando pelo Parque Oriental. 

Ainda era cedo e fui vendo poucas pessoas a caminhar. Maioritariamente ninguém usava máscara, e na rua, a caminhar ao ar livre eu também não vejo grande problema com isso uma vez que o distanciamento facilmente se consegue. Eu também não ando de bicicleta com a máscara colocada, ainda que de vez em quando lá passa uma pessoa com ela colocada. 


No entanto, comecei a prestar atenção. Passo por um casal de asiáticos (eu não os distingo, se são japoneses, chineses, coreanos ou vietnamitas!) e ambos com a máscara corretamente colocada. Adiante outro asiático de meia-idade, sentado num banco com uma criança, também de máscara colocada corretamente. Depois de feito o passadiço de Rio Tinto decidi rumar até à Ponte da Arrábida e ao Jardim do Passeio Alegre. Fui passando por cada vez mais pessoas na rua quando me aproximei do jardim, e aí já ia vendo mais pessoas com máscara mas a grande maioria não usava. Continuo a dizer que isto não é uma crítica, é unicamente uma constatação, pois o que a lei diz é que o uso da mascara só é obrigatório quando o distanciamento não é permitido, e relembrar que estamos a falar de espaço ao ar livre. Mas fui contado, e a verdade é que passei por uns dez conjuntos de asiáticos e, sem exceção, estavam TODOS de mascara e corretamente colocada.

Sobre a China muita gente coloca dúvidas como é que eles erradicaram o vírus tão rapidamente e já fazem a sua vida normal e vão aos bares e discotecas. Colocam-se dúvidas porque é um regime autoritário que não cumpre os direitos humanos e devemos sempre ter cautela com as informações que de lá vêm. Contudo a China não foi o único país asiático a resolver o problema da pandemia, foi a grande generalidade. O Japão, por exemplo, pertence ao G7 (os países mais industrializados do mundo) e é de todos eles o país que está melhor. 

Podem-me dizer que por aquelas bandas eles estão mais preparados porque já convivem com as máscaras há mais tempo e é verdade. Em muitas cidades chineses sei que já se usava máscara simplesmente para as pessoas se protegerem da poluição. Existe essa familiaridade com esse objeto que para nós, excluindo as pessoas que já as tinham que usar nos seus trabalhos, era ainda uma novidade. 

Mas os asiáticos resolveram os seus problemas com a pandemia porque cumprem! Os asiáticos que estão em Portugal poderiam comportar-se como qualquer português e não usar a máscara, ou usá-la no queixo, mas não, eles usam-nas sempre e de forma correta. Estão em Portugal, e aqui não há nenhum regime autoritário de pontos que os possa prejudicar. Da Ásia também conheço nem ouvi falar em grupos negacionistas como aqui na Europa, e que infelizmente chegaram também a Portugal, que são contra o confinamento e contra o uso das máscaras como os conhecidos grupos de mentirosos pela verdade.

Os asiáticos têm um sentido de comunidade muito forte. Ajudam-se uns aos outros e respeitam o próximo. Nós portugueses e ocidentais em geral, só pensamos no nosso umbigo. Devemos guardar distanciamento e respeitar as regras para que a pandemia acabe mais depressa? Nada disso, eu faço o que me apetece e ninguém manda em mim e têm que respeitar a minha liberdade individual de ser um atrasado mental. 

sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

As Pessoas Com as Vacinas São como os Cães Pela Comida!


É extraordinariamente interessante como funcionam as pessoas e os comportamentos de grupo. Foi-se falando da chegada das vacinas, que eu confesso que não estava à espera que fosse para breve, até porque já nos tinham dito que chegariam em Setembro. Olhando à minha volta, mas principalmente para o que ia lendo nas redes sociais, parece que ninguém queria ser vacinado (eu incluído). Os motivos eram os mais variados, porque foi feita depressa demais, porque não sabemos que efeitos podem causar; pessoas que escrevem nos jornais falaram até em alterações do ADN (que outras rapidmente se aressaram a desmentir) e por aí a fora com as mais variadas teorias da conspiração, associadas ao Bill Gates, que isto é mas é tudo para nos controlar, com um chip incorporado na vacina!

Entretanto no dia 8 de dezembro as primeiras pessoas do mundo começaram a ser vacinadas no Reino Unido. Mas em Portugal, avançava-se na imprensa, no dia 16 de dezembro, que apenas 39% das pessoas estavam disponíveis para tomar a vacina no imediato. A vacinação foi avançado e foram sendo difundidas cada vez mais imagens e informação sobre o assunto, e, estranhamente, oito dias depois, os 39% de portugueses que estavam dispostos a tomar a vacina passaram para uns incríveis 98%! 

As pessoas não são muito diferentes dos cães. Quem já teve cães sabe que eles agem exatamente da mesma forma. Se deitarmos qualquer coisa para um cão comer, ele muitas vezes chega, olha, e dá meia volta. Mas, se de repente aparece outro cão que olha e começa a comer com grande vontade, então o primeiro regressa e é capaz de começar a rosnar porque também quer comer a mesma comida que antes não gostava! (

Foi precisamente o que aconteceu este ano com as vacinas da gripe em que o governo comprou vacinas mais do que suficientes para todos os grupos de risco mas depois não chegaram. Foi o que aconteceu com o papel higiénico dos supermercados e com muitas outras coisas que desapareceram das prateleiras. 

Muitas vezes o ser humano nem é um cão mas sim um macaco de imitação. 

sábado, 19 de dezembro de 2020

Os Livros Que Li em 2020


 Estamos a poucos dias de terminar o ano de 2020, e acho que pela primeira vez, porque fui tomando nota, sei precisamente todos os livros que li este ano. Não são muitos, eu também nunca fui de ler muito, mas é um número redondo: um por cada mês do ano. 

Comecei o ano com um pequeno livro de cariz romântico, "Noites Brancas" o segundo que li de Dostoiévski, depois do Pobre Gente.

Depois peguei no livro "Ratos e Homens" de Steinbeck simplesmente porque era um livro citado em Lost, a minha série preferida: É de Of Mice and Men - Tu Não Lês? E a verdade é que ao longo das seis temporadas, vários livros são citados. Portanto, neste caso podemos dizer que as séries também podem incentivar à leitura, pelo menos comigo funcionou, e posso dizer que gostei muito deste primeiro livro que li de Steinbeck. Muito bom. O livro foi publicado em 1936, a seguir à grande depressão nos Estados Unidos, fala-nos duma grande amizade entre dois homens e das muitas dificuldades que é viver no mundo rural dos anos trinta nos Estados Unidos. 

Quando gostamos muito de um autor é normal queremos ler mais coisas que tenha publicado. Foi o que me aconteceu, e então, logo a seguir a Ratos e Homens resolvi ler "As vinhas da Ira". E ainda que o fiz pois é que grande livro e não foi à toa que a academia sueca atribuiu o Nobel ao escritror americano. Gostei mesmo muito e recomendo a todos. O livro o grande êxodo dos americanos do Oklahoma rumo à California em busca de uma vida melhor, e depois a frustração de lá chegados verem o preconceito e racismo dos próprios concidãos, que os maltratam e exploram, quando não os matam mesmo. Um retrato extremamente atual do que é capitalismo selvagem da sociedade americana. 

Depois de dois livros seguidos de Steinbeck peguei no Outubro do Patriarca de Garcia Márquez mas ao fim de vinte páginas, talvez porque não fosse o melhor momento par o ler, resolvi encostá-lo e pegar no estoicismo de Séneca em "Cartas a Lucílio", o livro mais inspirador do ano.

E ao quinto livro comecei entrei nos tempos da ditadura, o tema mais lido do ano  com o primeiro volume de Andanças para a Liberdade de Camilo Mortágua. 

Seguidamente, porque já tinha o livro e quis conhecer mellhor o perfil do general sem medo Humberto Delgado, e confrontar com a opinião de Camilo Mortágua, resolvi ler "Obviamente Demito-o" antes de me embrenhar nas aventuras do segundo volume.

Depois de completado o segundo volume das Andanças de Camilo Mortágua resolvi ler "Opressão e Repressão - Subsídios para a História da PIDE" para ficar a perceber ainda melhor todo o modus operandi da polícia fascista de Salazar. 

Depois de cinco volumes sobre o combate ao Estado Novo e à ditadura fascista, de novo o regresso a um romance, um que romance, o clássico Ana Karenina.  

Para desenjoar de um livro com tantas centenas de páginas, e porque nas semanas seguintes se comemorava os duzentos anos de do nascimento acabei ler uma pequena biografia de Engels.

Após umas duas semanas sem saber muito bem em que livro dos muitos que tenho em casa para ler, acabei por pegar no livro "Memórias Íntimas e Confissões de um Pecador Justificado de James Hogg que para já estou a gostar bastante.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

Probabilidades e Numerologia: 17

 Num  destes dias de fim-de-semana prolongado andei a arrancar uma data de azevinhos e coloquei-os num vaso para depois transplantar apara garrafões de água. Depois de almoço fui ao monte e trouxe um carro-de-mão cheio de terra. Depois disso, fui então pegar num monte de garrafões de água que guardo para o efeito e cortei-lhes a parte de cima para servirem como vasos e fiz-lhes uns furos no fundo sem grande cuidado para como é lógico escoar a água. 

Quando já faltava pouco para acabar o trabalho pensei "bom, já estou a ver que a terra não vai chegar e terei que ir de novo ao monte buscar mais terra para os azevinhos. 

Mas a verdade é que, quando olhei, restavam precisamente quatro azevinho e quatro garrafões e a terra chegou e não sobrou um só bocadinho. Qual a probabilidade disto?, pensei. O número mágico foi dezassete!

Provavelmente sou eu que reparo sempre nestas coisas e valorizo quando acontecem e ignoram quando não batem certo, mas a verdade é que me estão sempre a acontecer! 


domingo, 6 de dezembro de 2020

SIC: Tenham Noção a Bem da Informação!


 Sim, é verdade, eu não vejo televisão, mas não é preciso ver televisão para estar minimamente informado do que se passa na televisão. Este foi, de longe, um dos piores anos que me lembro para o jornalismo,  em que a pressa de dizer alguma coisa foi inimiga da verdade, mas se foi um dos piores anos para o jornalismo, foi especialmente mau para a SIC.

O caso mais mediático foi desde logo a capa falsa do New York Times sobre a Festa do Avante! em pleno Jornal da Noite apresentado por Clara de Sousa. A pressa de denegrir o partido de Jerónimo de Sousa, que  este ano foi alvo de uma nojenta campanha por parte dos média não os impediu sequer de fazer a coisa mais simples que se faz no jornalismo, que é, confirmar a fonte, e vai daí apresentam uma imagem manipulada e falsa que corria pela internet!

Outro erro gritante e inadmissível foi quando, em Março, pleno início da pandemia, resolve passar uma reportagem sobre confrontos entre a polícia e as pessoas dando a entender que seria por causa da pandemia e essas imagens eram de 2011!!

Mas ontem à noite acontece o insólito! Dão a morte, sempre de lamentar do jornalista Pedro Camacho mas mostram imagens do Paulo Camacho, ele mesmo ex-jornalista da própria SIC!



Fazer jornalismo não é ir às redes sociais e partilhar a primeira merda que se vê. Nem passar qualquer coisa na televisão sem confirmar primeiro o que se está a fazer. Para isso não precisamos de jornalistas, e se o jornalismo quer ser relevante é bom que não seja ele mesmo a difundir mentiras senão deixa de ter credibilidade. E de facto, infelizmente, o jornalismo de qualidade está cada vez mais em vias de extinção. 

sábado, 5 de dezembro de 2020

PERSEPOLIS


(1978) "Naquela época tinha uma vida tranquila e sem percalços. Uma vida de criança. Adorava batatas fritas com ketchup, o Bruce Lee era o meu herói preferido, calçava sapatilhas Adidas e tinhas duas grandes obsessões: poder um dia depilar as pernas e tornar-me o último profeta da galáxia"

Continuando ainda a saga de ir vendo os filmes daquela enorme compra que fiz (todos a 1€) o filme que verdadeiramente me surpreendeu ultimamente foi este Persepolis. 

Esta é a história de uma menina que cresce no Irão durante a Revolução islâmica mas é também a história autobiográfica de Marjane Satrapi (ilustradora e romancista) e a autora dos livros que deram depois este filme. A destemida Marjane de nove anos que é fã de Bruce Lee vê a esperança do povo iraniano ser destruída (com a queda da ditadura) quando os fundamentalistas religiosos tomam o poder, forçando as mulheres a usar o véu e prendendo milhares de pessoas.

Marjane é uma menina muito esperta e, apesar das proibições, consegue descobrir a cultura punk, os Abba ou os Iron Maiden. Mas quando o tio é cruelmente executado e as bombas começam a cair sobre Teerão durante a Guerra com o Iraque, o medo instala-se. Muito preocupados com o comportamento ousado de Marjane os pais acabam por tomar a difícil decisão de a enviar para uma escola na Áustria. 

Aí, sozinha, Marjane é alvo de discriminação e confundida com o fundamentalismo religioso, exactamente aquilo de que fugiu do seu país. Mas, com o tempo acaba por ser aceite. Quando termina o liceu, Marjane decide regressar ao Irão. Entretanto depois de regressar casa, porque nem sequer de mão dada pode andar na rua com o namorado (para um ano depois depois se divorciar, com o apoio da avó, figura importante no seu crescimento) e aos 24 anos percebe que não pode continuar a viver no seu país e acaba mesmo por emigrar para França...

Este é um filme de animação graficamente muito bonito. A história real é comovente, trágico mas ao mesmo tempo bem humorado e até divertido em alguns momentos. É um filme obrigatório para que as pessoas percebam que em qualquer país, por mais progressista que seja, a liberdade nunca está totalmente conquistada. E se permitimos que os extremistas religiosos tomem o poder, muito rapidmente podemos recuar séculos e entrar em novo período de obscurantismo. Acho até que é até um filme didático e que pode servir para ensinar aos mais novos que "quem adormece em democracia pode acordar em ditadura". 

Esta é uma grande história de vida que deu um livro e que posteriormente deu origem a este grande filme que ganhou vários prémios internacionais.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

Este País Não é Para Velhos. Mas Não é Só Para Alguns


 Jerónimo de Sousa tem 73 anos.

Marcelo Rebelo de Sousa tem 72 (dentro de dias)

Donald Trump tem 74 anos

Joe Biden tem 78 anos

Aos candidatos americanos à presidência da república, pode ter acontecido, mas não me recordo que algum jornalista ter perguntado a Trump ou Bidden se iam levar ou não o mandato presidencial até ao fim. Mas neste fim-de-semana que passou os jornalistas portugueses não falaram de outra coisa que não fosse se Jerónimo de Sousa iria ou não levar o seu mandato à frente do PCP até ao fim. 

Espero que, por uma questão de equidade, quando por estes dias Marcelo Rebelo de Sousa avançar com a sua candidatura à presidência da república, todos os jornalistas, e até para mostrarem que são completamente isentos, também lhe perguntem frontalmente se espera levar o seu mandato de cinco anos até ao fim ou se é só para ficar lá um ou dois anos e depois ir gozar a velhice com os netinhos. 

domingo, 29 de novembro de 2020

Sozinho



"...Confinado, estou vivo, em algum lugar pelas folhas de Outono

Caindo no meio

Porque ninguém está lá para manter minha cabeça erguida

Ninguém está lá para acalmar minha mente (...)

Sozinho estou com medo

Para encontrar vida vazia

Noites sem dormir, dias vazios

Sozinho...


Alone / Ramp (2003)

sábado, 28 de novembro de 2020

200 Anos do Nascimento de Engels

 Hoje, 28 de Novembro de 2020, passam duzentos anos do nascimento de Engels. Algumas breves notas deste génio humanista.

"Friedrich Engels nasceu a 28 de Novembro de 1820 na cidade de Barmen. O seu pai era fabricante de têxteis. A Prússia Renana, terra natal de Engels, foi a primeira região da Alemanha onde se iniciou a marcha vitoriosa da indústria de máquinas e da grande produção capitalista nascidas na Inglaterra. Na Prússia Renana já começavam a aparecer os primeiros quadros do proletariado industrial e a evidenciar-se as contradições entre a classe operária e a burguesia. 

A miséria e as desgraças de que Engels fora testemunha desde criança, causaram-lhe uma impressão inapagável. Nas "Cartas de Wuppertal", sua primeira obra, Engels descreve com uma sincera compaixão as duras condições de vida dos operários fabris e artesãos de Barmen e Elberfeld. A principal causa das desgraças e sofrimentos dos operários, no dizer de Engels são "os desmandos revoltantes dos donos das fábricas". 

O pai de Engels era um homem religioso, conservador e despótico. Além de Friedrich, ele tinha mais três filhos e quatro filhas. Estes três filhos seguiram a carreira do pai e as filhas casaram com homens do seu círculo Somente o modo de vida de Friedrich estava em flagrante contradição com o espírito que reinava na família. Sedento de saber e voluntarioso, ele revelou muito cedo uma inteligência aguda e perspicaz, o dom de ter ideias próprias e uma índole independente. Lendo uma carta do pai de Engels dirigida à esposa, vemos que a educação do filho, que contava então com 15 anos lhe causava grande inquietação. 

"Exteriormente, como sabes, ele tornou-se mais bem educado, mas apesar das severas sanções anteriores, ele, ao que parece, nem mesmo por temor ao castigo, deseja aprender a obedecer ser reservas. Para grande desgosto meu, hoje, descobri novamente na sua escrevaninha um livro vil da biblioteca do século XIII... Que Deus salve a sua alma! Muitas vezes sinto medo por este rapaz que, em geral, é excelente."

Jovem de raro talento, Friedrich, interessava-se profundamente pela literatura, arte, música e o estudo de idiomas. Compunha versos, desenhava muito bem caricaturas. De índole alegre e jovial, Engels era fisicamente resistente e muito ágil. Praticava com entusiasmo hipismo e esgrima, era um exímio nadador. Engels conservou este amor ao desporto por toda a vida. 

Em Setembro de 1837, Engels teve que abandonar o ginásio sem ter concluído o último ano. O pai, desejando que o seu primogénito seguisse a carreira de comerciante, tratou de habituá-lo a trabalhar no comércio. Primeiro, Engels, durante um ano, trabalhou no escritório do pai e depois partiu para servir numa grande casa comercial em Bremen. 

Mas a perspetiva de seguir essa carreira nem de longe seduzia o jovem Friedrich. Em Bremen, grande porto comercial, Engels teve a possibilidade de ler jornais ingleses, holandeses e franceses e publicações proibidas na Alemanha. Os livros e jornais ampliavam a visão do mundo de Friedrich, sendo, além disso, um meio excelente para dominar línguas estrangeiras. Engels, frequentava com agrado os teatros, concertos, apreciava sobretudo as sinfonias de Beethoven.

Em Bremen, o jovem Engels também observava a vida dos trabalhadores que nada possuíam, mas eram "o que de melhor pode ter o rei no seu Estado". 

O pai de Engels, preocupado com o rumo do desenvolvimento espiritual do filho, enviou-o precavidamente para a casa dum pastor de Bremen. Mas justamente sob o teto desta casa, Friedrich, atacado por dolorosas dúvidas religiosas, rompeu para sempre com o credo dos seus ancestrais. 

Começou a pensar cada vez mais nos problemas sociais e políticos do desenvolvimento da sociedade. A situação social e política formada nesta altura na Alemanha em vésperas da revolução e nos países vizinhos fornecia um material abundante para meditações, exercendo uma influência excecional sobre a formação intelectual do jovem Engels. 

Depois de sepultar o filho, Marx escrevia a Engels: "Já suportei muitas angústias, mas só agora sei o que é uma verdadeira desgraça... No meio de todas as terríveis torturas por que passei durante estes dias, sempre me animou a lembrança de ti e da tua amizade, e a esperança de que juntos ainda temos muito a fazer, neste mundo, algo de razoável." 

Engels fazia tudo ao seu alcance para que a família de Marx não passasse e mal. Quando se lhe ofereceu a oportunidade de proporcionar a Marx uma ajuda material suplementar escrevendo artigos, ele aproveitou-a com satisfação. Em Agosto de 1851, o jornal progressista americano New York Daily Tribune propôs a Marx que escrevesse artigos para um periódico. Numa carta a Engels, Marx pediu a sua ajuda: "No que respeita ao New York Daily Tribune, peço-te que me ajudes, pois estou ocupadíssimo com a economia política. Escreve alguns artigos sobre a Alemanha a partir de 1848." Engels pôs imediatamente mãos à obra, enviando sistematicamente um artigo após outro a Marx, que os remetia ao New-York Daily Tribune". Foi assim que surgiu a célebre série de artigos "Revolução e Contra-Revolução na Alemanha". Só depois de publicada a correspondência entre os dois, é que se constatou que se tratava de uma obra de Engels e não de Marx. 

Verdadeiro poliglota, Engels dominava (falava e escrevia) doze idiomas e lia em quase vinte. Sabendo tantas línguas, Engels pôde dedicar-se a problemas gerais da linguística como tal e da linguística comparada, lançando um sólido fundamento marxista destas ciências.

Friedrich Engels Breve biografia - Eugénia Stépanova (1986)


sexta-feira, 27 de novembro de 2020

A Amizade de Marx & Engels

"Em quase todos os livros que tratam da amizade se fala dos grandes pares de amigos da antiguidade (...) Daí a impressão de que hoje já não existe a verdadeira amizade, de que esta pertence apenas e irremediavelmente ao passado. É uma impressão ilusória (..) 

Verificamos, então, que existem também no nosso mundo nobre figuras de amigos, de amizade que duraram quase toda a vida, e que tiveram um certo peso na História. O caso mais óbvio e importante é o de Marx e Engels. A sua amizade data de 1844. Engels tinha então vinte e quatro anos, Marx vinte e seis. Tinham-se conhecido num encontro breve em Colónia, e colaborado a mesma revista. Conheciam-se, portanto, mas não tinha nunca acontecido entre eles o encontro revelador, aquele do qual nasce a verdadeira amizade. Este acontece em Paris, onde ficam juntos dez dias. Foi um período extraordinário e entusiasmante. Começaram mediatamente a trabalhar juntos no livro que seria depois editado sob o título A sagrada família. No ano seguinte Engels junta-se a Marx em Bruxelas e aqui escrevem juntos A ideologia Alemã e, em 1848, o Manifesto do Partido Comunista, o livro que viria a influenciar a história do mundo. 

Marx e Engels completavam-se, tanto no carácter como no pensamento. Foi Engels que ensinou a Marx os primeiros rudimentos da economia, lhe descreveu as condições do proletariado, porque as conhecia em directo. Foi ele que deu a Marx a chave económica para modificar o idealismo hegeliano. Marx consegue, ao contrário, dar forma sistemática às intuições do amigo, construir a rigorosa demonstração daqui que o outro entrevia. O próprio Marx escreve a Engels "sabes como sou lento em perceber as coisas, e com sigo sempre os teus exemplos". Por outro lado, Engels encontrou em Marx o seu mestre espiritual e gostou sempre de se apresentar como o seguidor, o segundo violino do amigo. Em 1850, Engels toma a decisão de voltar a trabalhar na editora Ermer & Engels, de Manchester, fundada por seu pai. Como assistente geral ganhava cem libras estrelinas por ano e, com aquele dinheiro, mantém Marx e a sua família dezanove anos. Era um trabalho de que não gostava e que fazia para permitir ao amigo dedicar-se à sua grande tarefa, a compilação de O Capital. Quando finalmente em1859, pôde deixar o trabalho e voltar à atividade política e de estudo, sente-se renascer. 

Engels era caçador entusiasta, um caminhante incansável, um grande bebedor, e sempre calmo. Mesmo durante o período em que trabalhava, conseguiu escrever diversas coisas que Marx admirava profundamente. Mas não publicou nada com o seu nome, para não entrar em conflito com o seu pai e, assim, correr o perigo de não poder mais ajudar o seu amigo Marx. Marx, por outro lado, fazia de tudo para não ser pesado ao amigo, trabalhava esforçadamente e vivia as maiores restrições. Apenas excecionalmente lhe pedia ajuda, e então, cheio de tristeza, lamentava-se de ser um fardo para ele. Houve só um momento em que a sua amizade pareceu desmoronar-se. Tinha morrido Mary Burns, com quem Engels vivera durante vinte anos, e Marx, todo absorvido nos seus problemas de economia, limitou-se a mandar uma carta de circunstância. Engels sentiu-se ofendido e escreveu-lhe. Marx teve então a coragem de lhe falar sincera e diretamente de todas as suas preocupações e Engels ficou feliz por reencontrar o amigo. Engels era sereno, Marx atormentado. Engels escrevia com fluidez, de maneira constante, Marx tinha repentes destrutivos e criativos. No entanto confiava totalmente em Engels, tanto para os problemas familiares como para os políticos. Esta confiança estava bem depositada. Por sua morte, em 1883, Elgels dedicou-se a pôr ordem nos inúmeros e caóticos papéis de O Capital. O segundo volume estava muito avançado e Engels poderá escrever a sua introdução em 1885. Para o terceiro e quarto volumes, pelo contrário, é-lhe exigido um enorme esforço. E só consegue publicar o terceiro. 

A amizade entre Marx e Engels e em particular a dedicação de Engels, não podem ser consideradas como o entusiasmo que se estabelece entre companheiros de um movimento. Evidentemente esta amizade nasce como movimento. O encontro de 1844 foi, entre ambos, um verdadeiro estado nascente.



segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Fica Comigo


"Oh, I, I can see the light
Stay with me
Away from the darkest of nights
Stay with me"


"Stay With Me" / In Flames (2019)

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

O Negador do Racismo Condenado Por Racismo


 Estávamos no Verão, em plena pandemia, e o líder partidário André Ventura do CHEGA, que tinha criticado a manifestação contra o racismo que se fez em Portugal, na sequência da morte de George Floyd, isto porque afinal estávamos em pandemia, resolve, ele mesmo, dando o dito pelo não dito, porque afinal a sua manifestação dos negadores de máscaras não ia infetar ninguém, resolve ele mesmo fazer a sua manifestação afirmando que "não há racismo em Portugal". 

Estamos a falar do líder partidário que é apoiado por nazi-fascistas, incluindo, por exemplo, Mário Machado condenado a dez anos por ter matado um negro em que o seu único crime foi ter-se cruzado com ele no Bairro Alto. Estamos também a falar do líder partidário que mandou a deputada eleita da nação Joacine Moreira "ir lá para para a sua terra. 

Hoje ficamos a saber que o líder partidário que nega que exista racismo em Portugal, foi ele mesmo condenado por racismo. Este é um daqueles casos em que se costuma dizer que a realidade ultrapassa a ficção.

terça-feira, 17 de novembro de 2020

Pra Cima de Puta

 "Tentando documentar as suas recordações, voltou a folhear os álbuns dos Jogos Florais enquanto Sara Noriega arranjava qualquer coisa para comer. Viu cromos de revistas, postais amarelecidos dos que se vendiam como recordações nos portais de loja e foi como uma passagem fantasmagórica pela falácia da sua própria vida. Até então fora sustentado pela ficção de que era o mundo quem passava, os costumes, a moda:  tudo menos ela. Mas naquela noite viu pela primeira vez de forma consciente como ia passando a vida de Fermina Daza e como passava a sua própria, enquanto ele não fazia mais nada do que esperar. Nunca tinha falado dela com ninguém porque se sabia incapaz de dizer o seu nome sem que se lhe notasse a palidez dos lábios. Mas nessa noite, enquanto folheava os álbuns, com em tantas outras vigílias de tédio dominical, Sara Noriega teve uma dessas tiradas acidentais que gelavam o sangue.

- É uma puta - disse. 

Disse-o ao calhas, vendo uma gravura de Fermina Daza disfarçada de pantera negra num baile de máscaras e não precisou de mencionar ninguém para que Florentino Ariza soubesse de quem falava. Temendo uma revelação que o perturbasse para toda a vida, este apressou-se numa defesa cautelosa. Alegou que só conhecia Fermina Daza de vista, que nunca tinham passado dos cumprimentos formais e não sabia nada do que se passava na sua intimidade, mas dava como certo que era uma mulher admirável surgida do nada e enaltecida pelos seus próprios méritos. 

- Por obra e graça de um casamento por interesse com um homem de que não gosta - interrompeu-o Sara Noriega. 

- É a maneira mais baixa de ser puta."

"O Amor em Tempos de Cólera" / Gabriel Garcia Marquez (1985)

Queres Ser Meu Amigo? Então Sê Como Engels Foi de Marx

 "Marx concluiu o primeiro volume de "O Capital" sob condições extremamente difíceis. De par com imensos estudos teóricos, realizava uma obra colossal e complexa dirigindo a Internacional. A permanente tensão e as privações materiais minavam a saúde de Marx, que já se encontrava abalada. 


Num dos momentos críticos, Marx, pedindo a Engels de novo ajuda, escrevia-lhe: "Asseguro-te que preferia que me cortassem o dedo polegar do que ter de escrever esta carta. A ideia de que metade da vida se vive a depender de outrem pode levar ao desespero. A única coisa que me anima é a consciência de que ambos atuamos como sócios, eu dedico o meu tempo ao aspeto teórico e partidário da causa comum". 

Com o afeto e a fidelidade de amigo e com o grande ilimitado desvelo de membro do Partido pelo seu grande guia, Engels ia sempre em auxílio de Marx. Como a saúde deste piorou muito, Engels, alarmado, depois de consultar os médicos, pede a Marx que mude para Manchester para descansar e tratar a sério da doença que poderia ter um desfecho funesto.

"...Faz-me a mim e à tua família o único favor - permite que cuidemos da tua saúde. O que será do movimento se contigo suceder alguma coisa? Ora se te portares como até agora, isso será inevitável. Com efeito, não tenho nem terei sossego, seja dia ou noite, enquanto não te tirar dessa embrulhada: todos os dias que não recebo notícias tuas, fico preocupado, pensando que pioraste outra vez"

A ajuda proporcionada por Engels na composição de "O Capital" não se limitou ao aspeto material. Marx geralmente consultava Engels a respeito dos problemas teóricos mais importantes, expondo nas cartas as suas deduções e pedindo a opinião de Engels sobre várias questões. Marx pedia frequentemente auxílio ao amigo a respeito de diversas questões práticas da economia em que Engels era grande perito (...)

A 16 de Agosto de 1867, Marx comunicou a Engels que tinha concluído a revisão do último (49.º) caderno de "O Capital". O prefácio também já fora remetido. "Deste modo, este volume está pronto - escreveu Marx. - É só graças a ti que isto se tornou possível. Sem os sacrifícios que fizeste por mim, eu jamais conseguiria realizar a obra colossal que exigiram os três volumes. Abraço-te, cheio de reconhecimento!.. Saúdo-te, meu caro e fiel amigo!"

"Desde que no mundo existem capitalistas e operários ainda não apareceu um livro que tivesse tamanha importância para a classe operária" - escreveu Engels sobre "O Capital". 

Marx precisou de vinte e cinco anos de tensas pesquisas científicas para que a sua doutrina económica adquirisse uma forma clássica e perfeita.  

domingo, 15 de novembro de 2020

A Vespa Parasitóide e o Hospedeiro Adormecido

 Por entre os pingos da pandemia e das melhores eleições americanas dos últimos anos, cheias de imprevisibilidade e comédia, em que o candidato que perde diz que ganhou e manda parar a contagem de votos enquanto estava a perder!, eis que o PSD decide coligar-se com os fascistas do CHEGA com vista a governar o arquipélago dos Açores, mas, afinal, veio-se a descobrir que, ao contrário do que Rio queria fazer crer, o acordo é nacional. 


De uma assentada rui toda a argumentação de 2015 e a ladainha do PS ter sido governo sem legitimidade democrática e consegue ainda fazer muito pior: aliar-se aos fascistas da extrema-direita. No fundo o que o PSD mostra é que teve dor de cotovelo da coligação inesperada de esquerda que se formou porque tinha maioria para poder derrubar o governo de Passos e Portas que ostracizava o povo retirando-lhe sucessivos direitos e não dizia que o povo era "maricas" como fez esta semana Bolsonaro, mas disse que era "piegas" e a porta do país era a serventia da casa para quem não estava bem. Rui Rio faz agora nos Açores a mesmíssima coisa que o PS fez em 2015, mas não tendo nojo de se juntar aos racistas, xenófobos, misóginos que querem castrar pessoas ou tirar os ovários às mulheres.

O Partido Popular Democrático, mais à frente Partido Social Democrata foi um partido criado depois do 25 de Abril por Sá Carneiro e era assumidamente, dito pelo próprio, um partido de Esquerda. Entretanto como bem sabemos, depois de Cavaco, Durão e Passos Coelho, qualquer pessoa afirma sem margem para dúvidas que o PSD é de Direita, ou Neo-Liberal, que privilegia a defesa dos interesses dos mais ricos, apesar de, à semelhança dos vários partidos existentes, haver diferentes sensibilidades. 


Sobre o CHEGA. 

Pela mão de Passos Coelho, o verdeiro Dr. Frankenstein, pessoas como eu, que não faziam ideia que o senhor era comentador da bola no CMTV, foi lançado o monstro do populismo-fascista André Ventura como candidato à câmara municipal de Loures e rapidamente começou a falar que Portugal tinha um problema com os ciganos. O homem exagerou de tal maneira que o próprio CDS decidiu retirar-lhe o apoio à candidatura e avançou com o seu próprio candidato. 

Entretanto ficamos a saber ao que vem André Ventura. Apoiado por nazis e pessoas de extrema-direita, racistas e xenófobos, incluindo pessoas como Mário Machado condenado em tribuanal a dez anos de cadeia por matar um preto em Lisboa, e apoiado também por fundamentalistas cristãos, tem tido um discurso de ódio e provocação em linha com o pior que temos visto no mundo, replicando comportamentos de Trump e Bolsonaro, e, com os seus grupos, como os recentes conhecidos dos "médicos e jornalistas pela verdade" e com os seus exércitos de bots espalha mentiras pela net, financiados por grandes grupos financeiros. As suas propostas para "ajudar" o povo passam por acabar com o Serviço Nacional de Saúde (que daria imenso jeito agora nestes tempos de pandemia!), acabar com escola pública, diminuir os impostos aos mais ricos pondo os pobres a pagar mais! E tem gente que adere a estas ideias!

E entretanto Rui Rio decide coligar-se com esta gente, e relembro que Ventura o chamou de "pacóvio"!

Isto faz-me lembrar da vespa parasitóide que para quem não conhece eu passo a descrever. Esta vespa, como o nome indica é parasita, ou seja, colocando os ovos num hospedeiro, geralmente uma lagarta injetando-lhe os seus ovos. Ora o que acontece é que os ovos eclodem e as pequenas larvas vão-se alimentando do hospedeiro. Este continua a comer e a comer, mas sem se aperceber está só a alimentar as vespas parasitas. E é isto que irá a acontecer. Cheio de sede de poder, o PSD acha que será governo mais facilmente aliando-se ao ao CHEGA, mas não se apercebe (ou não quer perceber e o pior cedo é o que não quer ver) que será a ser uma mera barriga de alugar para os parasitas nazi-fascistas do CHEGA crescerem e se espalharem.  


Aos Vossos Avós Foi Pedido Que Fossem Para a Guerra...



"Penso que foi no Inverno de 2020 que os olhos de toda a gente estavam sobre nós. Eu tinha 22 anos, estudava engenharia quando a segunda onda chegou. Com 22 anos queres é festas, estudar, conhecer novas pessoas, sair e estar com os amigos. Contudo o destino tinha planos diferentes para nós. Um perigo invisível ameaçava tudo aquilo em que acreditávamos. De repente o destino do nosso país estava nas nossas mãos. Corajosamente fizemos o que o nosso país esperava de nós. Fizémos a única coisa certa. 

Nada! Absolutamente nada! Dia e noite enfiamos o cu em casa e lutamos contra a transmissão do vírus. O sofá estava na frente de batalha e nossa arma: paciência. Por vezes temos que rir quando lembramos estes tempos do passado. Foi o nosso destino. 

Foi assim que nos tornamos heróis durante o Inverno de Corona 2020. Sê um herói também e fica em casa. 

(Campanha publicitária do governo alemão) 

quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Ana Karenina

 "Todos os géneros de felicidade se parecem, mas todas as desgraças têm o seu carácter peculiar. "

É com esta frase que começa o Ana Karenina, livro de Tolstoi que acabei por estes dias, e que posso garantir que acaba "bem". Este é um livro sobre relações de amizade e de amor, de traições, mas também sobre as dúvidas existenciais que nos assolam. É um livro sobre a vida e por isso intemporal. É um livro sobre todos nós ou, sobre todos aqueles que já amaram; sobre os que amaram e não foram correspondidos, sobre aqueles que se deixaram amar mas por quem as regras da sociedade não acham aceitável; sobre todos aqueles que já amaram e foram trocados por outro; sobre todos aqueles que já amaram e foram correspondidos. É também um livro sobre as dúvidas existenciais que nos assolam, como o medo da morte e sobre o porquê de aqui estarmos e se afinal isto faz algum sentido...

Neste romance identifiuei-me principalmente com a personagem de Levine, que se sentia bem era no campo, que preferia a companhia dos trabalhadores e não tanto a socializar na alta sociedade ou com o seu próprio irmão, destacado escritor e que gostava sempre de lhe ganhar as discussões.


Gostei muito do livro, que acabei por ler em tempo recorde (pensei inicialmente só lá para o Natal o conseguir acabar!) e de seguida vi o filme e nunca tinha visto, nenhum dos vários que já se fizeram. Vi a edição de 1997, com Sophie Marceau no papel de Ana Karenina, Sean Bean como Vronsky e Alfred Molina como Levine. O filme tem uma fotografia muito bonita e lindas paisagens (foi filmado na Rússia) mas logo nos primeiros minutos tudo me começou a parecer como se estivesse a ver unicamente fotografias ou fragmentos dos momentos mais importantes de tudo que li. E como é lógico nem de longe nem de perto o espectador do filme compreenderá a densidade e os dramas de cada uma daquelas personagens, nem todos os pormenores que levaram a certas tomadas de posição, mas há que compreender que não será fácil pegar num livro com tantas páginas (as edições modernas têm mais de mil) e conseguir contar tudo, porque para tal seriam precisas muitas horas.  

De qualquer forma eu recomendo o livro. Achei muito bom. 


terça-feira, 10 de novembro de 2020

Viva a Meritocracia!


É fácil falar-se em "meritocracia" quando segundo a OCDE, uma família portuguesa pobre precisa de 5 gerações até os descendentes terem um salário médio.

Sobre a "meritocracia" o que pouca gente sabe é que é um termo pejorativo, inventado Michael Young, escritor de esquerda, no seu livro satírico de 1958 e que se chamava The Rise of Meritocracy

A obra retrata uma Inglaterra do futuro em que as pessoas são classificadas de acordo com sua inteligência, medida por testes padronizados. Os "mais inteligentes" recebem a melhor educação e têm acesso aos melhores empregos, e os “menos inteligentes” ficam com o que sobra. Mas esse sistema, que Young batiza de “meritocracia”, contém distorções evidentes:  os “mais inteligentes” são-no, em parte, justamente porque recebem educação de qualidade – sem a qual os "menos inteligentes" jamais terão qualquer hipótese de ascender. O livro mostra como um sistema aparentemente justo se pode tornar uma máquina de produzir e agravar injustiças. Termina na Revolta da Meritocracia, uma convulsão social que se passa em 2033. 

Resumindo: o termo “meritocracia” é pejorativo. Isso não impediu que, ao longo das décadas, fosse mudando de significado – e acabasse adotado pela direita como exemplo de coisa positiva, o que Young detestava. "O livro era uma sátira, uma advertência (que, nem preciso dizer, não foi ouvida)”, escreveu ele em 2001, um ano antes de morrer, no artigo Down with Meritocracy publicado no jornal inglês The Guardian.  

Ironicamente a piada de Young virou dogma e hoje dizem-nos que vivemos em tempos de "meritocracia" e que tudo aquilo que alcançamos depende apenas do nosso trabalho árduo. E se não conseguimos a culpa é nossa, é porque não nos esforçamos o suficiente, porque afinal, para direita, todos podemos ser ricos. Viva a "meritocracia"!!

sábado, 7 de novembro de 2020

Conversas Improváveis (57): 400 Matchs no Tinder

"Finalmente cheguei ao fim da lista proposta pelo tinder.  99% de quem entrou em contacto comigo é entediante e tem sempre a mesma conversa: "olá, boa noite, tudo bem, que fazes, se onde és,..." seca ou enviam o whatsapp logo nas 3 primeiras mensagens e insistem por uma foto. 
Não há foto, tirei a exactamente para poder pôr likes em todos os perfis e constatar factos. Há excepções com quem gostaria de continuar a falar mas são mesmo excepções."



Como eu expliquei, mais ou menos, no meu perfil eu fiz swipes para a direita a todos os perfis (antes tinha foto minha e não fazia isso mas tirei para experimentar) fiz a lista até ao fim.

Tive uns 400 matches (calculo que muitos homens façam o mesmo) e não iniciei conversa com nenhum. Mas uns cento e tal iniciaram conversa comigo. Mas como disse umas pouquíssimas são interessantes. Algumas que são interessantes descubro depois que são de homens comprometidos.

Portanto imagina que uns 10 têm conversas interessantes, desses 10, metade é comprometido".

Mais Historiadores, Menos Epidemiologistas


Na pandemia de pneumónica de 1918, difundida pelo mundo por causa do regresso das tropas da casa, a máscara foi o grande método de proteção, conjuntamente com outras recomendações como não cuspir, não tossir nem espirrar em cima das outras pessoas e evitar os grandes aglomerados de pessoas. A pandemia chega aos Estados Unidos em Outubro, e voluntariamente quatro em cada cinco pessoas usa uma máscara para se proteger e para proteger os outros. Entretanto graças a bandalheira que se instaurou, o uso da máscara acabou mesmo por ser obrigatório e com multas pesadas para quem não cumprisse. 

Os jornais publicaram instruções sobre como as pessoas poderiam fazer suas próprias máscaras em casa. Pessoas que não cumpram podem enfrentar pena de prisão, multas ou ter seu nome publicado no jornal, revelando que são os “preguiçosos das máscaras”.
E se hoje em dia os avisos chegam por telemóvel, há cem anos os conselhos importantes como o de arejar as casas eram afixados nos autocarros.


Mas depois do uso generalizado de máscara ter resultado e as infeções tinham baixado muito, as autoridades de saúde resolveram levantar estar restrições logo em Novembro, um mês depois da chegada da pandemia aos Estados Unidos. Houve imensas festas na rua, milhares de máscaras espalhadas pelo chão, com as pessoas a dançar e abraçadas umas às outras. Resultado: as infeções voltaram a subir e a máscara acaba por voltar a ser obrigatória em 1919, só que desta vez há enormes manifestações contra o uso das máscaras, prisões, devido àquilo que se designa por "cansaço pandémico".


Ora, se a política prestasse mais atenção aos historiadores e à história, já teria antecipado que, ou se ataca a dispersão de uma pandemia logo no início, com medidas obrigatórias ou, se deixar as coisas nas mãos da responsabilidade individual a coisa vai descambar com ajuntamentos como os que vimos por estes dias na Nazaré e já com mais de três mil casos diários reportados. Mais. Quando depois quiser impor alguma coisa, começarão a aparecer os negacionistas dos movimentos anti-máscara ou, pior, dos negacionistas da própria pandemia, exatamente como aconteceu em 1918.

Não era preciso inventar muito, bastaria olhar para o que aconteceu há cem anos. As mesmas formas de combater a transmissão da doença, as mesmas reações que as pessoas começaram a ter fruto do cansaço pandémico. Por isso, se calhar, teria sido bem mais importante os governos rodearem-se de historiadores e não tanto de epidemiologistas. 

quarta-feira, 4 de novembro de 2020

"Mentirosos pela Verdade"

 Depois de termos sabido que nos "médicos pela verdade" não existia um único epidemiologista, mais engraçado ainda é descobrir-se que nos "jornalistas pela verdade" não existe um único jornalista!!

A fonte é da conhecida jornalista da RTP, Rita Marrafa de Carvalho que fez a  seguinte publicação no Twitter:




Posto isto, eu acho que vou criar uma página intitulada "Mentirosos pela Verdade" para mostrar às pessoas todas as mentiras em que precisam de acreditar! Nós, os mentirosos, nós é que dizemos as verdades!

Editado: Recomendo esta reportagem sobre os "jornalistas e médicos pela verdade". Muito elucidativa:



sábado, 31 de outubro de 2020

Revolta - Hecatombe Genocida

 REVOLTA é um projeto musical de grandes músicos brasileiros formado por João Gordo (Ratos de Porão, vocal), Prika Amaral (Nervosa, vocal), Moyses Kolesne (Krisiun, guitarra), Guilherme Miranda (Entombed AD e Krow, guitarra), Castor (Torture Squad, baixo) e Iggor Cavalera (Cavalera Conspiracy e Mixhell, bateria) que se juntaram há um mês para com a sua música protestar contra o que está a acontecer no Brasil. O primeiro vídeo é "Hecatombe Genocida" que ataca a forma como Bolsonaro está a gerir a pandemia. 


A primeira música e vídeo que foi lançada chama-se "Hecatombe Genocida" e critica violentamente a forma como Bolsonaro está a gerir a pandemia.




"Necropolítica
Narcisista
Eugenia
Assassina
Perpetuando a Morte
E a pobreza eterna
Jesus Nazifacista
Protege a Milícia
Negacionismo
Terraplanista
Ignorância no coração

Cem mil mortos entupindo
O poço da escuridão
Misturado com ódio e veneno
A justiça vai caindo
Fascistas na contramão
Cloroquina Nióbio e Grafeno
Extermina toda a razão
Patriotas de pele mais clara
Escória que ainda exala
O odor podre da corrupção"



E no caso do Brasil o fundamentalismo religioso de ultra-direita, esse cristianismo fundamentalista foi o único grupo que se organizou durante décadas para tomar o poder. E agora eles tomaram. Então não achei que em 2020 iríamos estar a discutir se a Terra é plana...

REVOLTA - "Hecatombe Genocida" (2020)

A Pandemia Como Se Fosse Um Incêndio

Vamos imaginar que esta pandemia que vivemos, era de um incêndio que se tratava e não de um vírus e a floresta eram as pessoas Vejamos então as diferentes abordagens que já tivemos até agora:

- É só uma fogueira chinesa, fraquinha que não tem problema nenhum. 

- Mas não está nada a arder. É tudo uma grande mentira dos média que querem meter medo na cabeça das pessoas. 

- É só uma fogueirazinha como qualquer outra e fogueiras sempre houve e vamos ter que viver com isso.

- Isto está tudo a arder mas não podemos só pensar em salvar as árvores. Temos é que pensar em salvar a economia. 

- Vamos deixando arder enquanto fazemos as nossas vidas normalmente porque isto há-de passar. 

- É preciso primeiro apagar o incêndio e salvar as árvores todas. A economia regenera, as árvores ardidas não.

Eu tenho para mim que a forma de ter resolvido a pandemia era ter apagado o incêndio rapidamente quando ainda estava no inicio mas fazendo o devido rescaldo, tal como fizeram muitos países, como por exemplo a Nova Zelândia que esteve três meses sem um único caso, ou o Vietnam que tem uma população de 95 milhões de pessoas e, graças ao lema: "Se continuarmos vivos a riqueza e a economia pode vir depois" só conta até ao momento com 34 mortes por COVID-19. 

A Europa faz-me lembrar aquele clube inexperiente que pela primeira vez vai às competições europeias e depois só obtém derrotas e empates. 

segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Amor em Tempos de Máscaras


 Hoje saí de casa para mais um longo e duro dia de trabalho sem ter nada que fazer, entretido nos últimos capítulos do Ana Karenina intercalando com vegetar de vez em quando com o telecrã. Saio, no carro o relógio ainda marca 8:30 porque ainda não me dei ao trabalho de acertar as horas, ponho o motor a trabalhar, ligo os médios e lá vou eu, devagarinho aldeia abaixo. 

Um quilómetro depois, passo pela mesma menina de todos os dias, sozinha na paragem de autocarro, e ainda há tão pouco tempo uma criança e agora cada vez mais com formas de mulher. Vestia hoje calças brancas  que condiziam com a máscara branca. 

Continuando a descer por entre mais curvas e contracurvas, quinhentos metros adiante, tendo já começado a subir em direção à estrada nacional, e logo após a curva mais fechada de todo o percurso, o momento romântico do dia. 

Mal percorro a curva e começo a ver a nova prolongada subida, deparo-me com dois adolescentes na paragem. Trata-se mesmo só de uma paragem de autocarro, sem as comodidades, por falta de espaço, do comum abrigo, mais ou menos moderno, de betão ou de vidro, e com o banco onde as pessoas se podem sentar. Eles eram uma rapariga, em quem reparei primeiro, cheiinha, de cabelos escorridos pelos ombros, e sorridentemente desconfortável de máscara no queixo. Ele, mais alto e trinca-espinhas, abraçava-a pela cintura e tomava conta do momento, beijando-a, certamente não tão à vontade quando a minha carroça lhes surgiu na estrada. 

É assim que, em tempos de pandemia, que os mais jovens vivem os seus primeiros amores, na clandestinidade de uma máscara caída no queixo. 

domingo, 25 de outubro de 2020

Dica Para Ser Feliz

 - Como podes tu passar sem fumar, Kóstia! O charuto não nos dá só um prazer, é como o coroamento do nosso bem-estar. Eis a verdadeira vida! Era assim que eu queria viver.

Mas quem to impede? - perguntou Levine sorrindo.

- Sim tu és um homem feliz, porque possuis tudo aquilo de que gostas; gostas de cavalos, tem-los; gostas de cães, também os tens, assim como caça excelente; enfim, adoras a agronomia e podes-te ocupar dela.

- É talvez porque aprecio o que possuo e não desejo muito vivamente o que não tenho - respondeu Levine pensando em Kitty. 

Ana Karenina / Tolstoi (1877)


O Que É Isso dos "Médicos pela Verdade"?

"Fui ver a página dos Médicos pela Verdade e virologistas lá não há. Há anestesistas o que é muito bom, porque isto é para anestesiar o cérebro, não é? (Cyntia de Benito)

"Uma pessoa que não acredita em Deus não pode ser padre. Uma pessoa que acredita que a terra é plana não pode ser astronauta; e uma pessoa que diz que não se pode testar uma pessoa e que é contra o uso das máscaras, pode ser presidente dos Estados Unidos, mas não tem o direito de exercer medicina".

"Existe uma politização da doença e esse movimento (Médicos pela Verdade) faz parte desse movimento, da negação das evidências científicas por uma crença irracional contra tudo que já foi descoberto. (Jair Ratner)



Joana D'arque

 

Quem quiser namorar com uma figura histórica, tem uma boa oportunidade indo ali para terras de Viana do Castelo. Basta deixar-se apaixonar por uma Joana para poder dizer que está a namorar com a Joana D'arque! 

O segurança do Lidl de Dark

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Conversas Improváveis (56): O Negacionista da Pandemia


Ontem, um senhor já meu conhecido, depois de me perguntar como é que as coisas iam e de eu ter dito (como quase sempre) que vai tudo "mais ou menos" vem-me com teorias dos negacionistas:
"Sabe, um amigo fez me uma pergunta que me deixou a pensar : tu conheces alguém q tenha morrido de COVID?" E é verdade, eu não conheço ninguém que tenha morrido do vírus.

De imediato lhe respondi: mas que grande populismo! Já agora diga-me, o senhor conhece alguém q tenha morrido de gripe ou pneumonia no ano passado? É que não conheço e no ano passado não morreram duas mil pessoas, foram sim nove mil mortos!
E olhe, eu não conheço nenhuma pessoa que tenha ganho o euromilhões, se calhar podemos também dizer que aquilo é tudo inventado para tirar dinheiro das pessoas e dar a ganhar à Santa Casa!


sábado, 17 de outubro de 2020

O Politicamente Correto da App STAYAWAY COVID

Numa altura em que, e depois de se ter passado a mensagem errada que, em pleno verão tínhamos que regressar o mais rapidamente às nossas vidas normais, e chorava-se pelos ingleses porque não vinham para cá, e num tempo em que regressaram as festas e festinhas, os espetáculos com milhares de pessoas, as feiras do livro (que segundo Marcelo "deviam ter quatro vezes mais pessoas" o futebol, as touradas e os espetáculos, as excursões e passeios de autocarro, mas pior os ajuntamentos nas ruas, as festas de família, os casamentos de centenas de pessoas, basicamente tudo voltou ao normal e só havia um perigo muito sério daquela gente que come criancinhas ao pequeno-almoço: a Festa do Avante! Esse é que era o perigo, já os comícios do CHEGA com centenas de pessoas sem máscara não incomodou ninguém, nem a DGS nem Rui Rio ou a bastonária dos enfermeiros que esteve presente no congresso, nem o próprio Marcelo. Não incomodou, ao contrário da festa comunista que, à semelhança do 1º de Maio foi um exemplo de organização como não se viu igual em Portugal. 

E, como dizia, numa altura em que, todos os especialistas já tinham alertado, porque é matemática, que Outubro a pandemia poderia ser muito pior que em Abril, eis que o senhor primeiro-ministro se lembra de dizer que vai fazer uma lei para ser votada no parlamento a obrigar o uso da aplicação STAY AWAY COVID-19!

Bom, para começar estes são os telemóveis cá de casa:


E eu vou-vos contar uma coisa. Eu até já tenho um telecrã e tudo! Sim, comprei uma dessas mini-televisões com internet na mão a 31 de Julho, porque já sabem, a seguir entrava a gosto! É verdade. Eu tenho andado um pouco afastado aqui dos meus queridos diários e não tenho tenho contado muita coisa.  Mas este telecrã é um simples ponto de acesso à internet. O meu telemóvel, está está o cartão SIM que permite efetuar chamadas continua a ser o mesmo: o Nokia 5800 que se vê na imagem. Mas continuando. Eu até já tenho uma bugiganga eletrónica e posso-vos assegurar que  mal saiu a aplicação portuguesa eu instalei-a.

Logo muito se falou muito da privacidade. Mas o que eu gostava de saber é, como é que se pode vir falar de falta de privacidade de uma aplicação que é totalmente anónima? Depois também não deixa de ser muito curioso que as mesmas pessoas que vêm falar em privacidade dizem-nos em redes sociais como o Facebook e usam ferramentas como Google ou outras aplicações como Instagram, ou outras aplicações russas e chinesas que sabe-se lá, como já se provou com o escândalo do Facebook e a Cambridge Analytica, o que fazem com os dados pessoais das pessoas. Como é que alguém que usa todas essas redes sociais, vem depois dizer que não instala a aplicação por causa de questões de "privacidade"? Inventem outra desculpa, essa só faz de vós completamente idiotas.

E a aplicação STAYAWAY COVID-19, como é que funciona?

Bom, isso é que é importante saber, e não foi devidamente informado ou as pessoas não se informaram devidamente. O próprio Rui Rio, por exemplo, cometeu uma enorme gafe no Twitter, quando o conselheiro de estado Lobo Xavier fez um teste positivo, e ele afirmou que a aplicação o deveria ter avisado imediatamente e não avisou! Mas isso não é assim que funciona!

A aplicação funciona da seguinte forma:

Depois dum infetado fazer um teste a confirmar que está infetado, tem que inserir um código que é dado pelo médico na aplicação, e então depois são automaticamente avisadas todas as pessoas que estiveram em contacto com esse infetado nas duas semanas anteriores durante quinte minutos e a menos de dois metros. Só nestas condições é que alguém é avisado!

Contudo, apesar de eu mesmo ter instalado a aplicação, que não meu caso de pouco servirá porque eu acho que não estou com ninguém mais de quinze minutos e a menos de dois metros, sou liminarmente contra a obrigatoriedade da instalação na aplicação, porque facilmente se percebe que é inconstitucional. 

E este é o melhor exemplo do que é na verdade o tão falado "politicamente correto". Recomendar a instalação da aplicação? Sim. Fazer uma lei a obrigar? Não! E não há nada de errado em agir corretamente na política, bem pelo contrário.

A lei é completamente inconstitucional porque nem toda a gente sequer tem telemóvel! Olhem, sabem quem por exemplo não tem telemóvel? O Sobrinho Simões, o médico talvez maior especialista de cancros em Portugal. Sabem quem, por exemplo, não tem um smartphone? O constitucionalista Jorge Miranda, que na rádio, depois de afirmar que essa lei é inconstitucional disse que tem um telemóvel "muito simples" para sua própria proteção. Portanto, há pessoas que nem sequer têm telemóvel, outras não possuem um equipamento onde possam instalar a aplicação ou nem sequer sabem mexer devidamente no equipamento. 

Mas disse-se uma coisa ainda pior! Permitir que a polícia peça os smartphones e verifique a instalação da aplicação. E isto deixa-me incrédulo! Em tempos de pandemia, em vez de se colocar as polícias todas na rua, a verificar se os restaurantes estão a cumprir as regras do distanciamento, se nas ruas as pessoas cumprem as regras e não há ajuntamentos, não!, vamos permitir que as polícias andem por aí, livremente, qual regime militar, a pedir os equipamentos às pessoas a ver se têm ou não a dita aplicação! Mais, colocando os próprios polícias e pessoas em risco, não fossem os telemóveis a coisa mais suja que os humanos usam e uma fonte de verdadeiro contágio! 

Tudo isto acabou por ter o efeito contrário ao pretendido. A ideia da aplicação que até poderia ser boa, ainda que não seja uma aplicação que vai travar a pandemia, apenas coloca a pessoa de sobreaviso a ter cuidado com os outros porque esteve em contacto com alguém infetado, acaba por gerar uma onda de indignação, e causa verdadeiros anti-corpos contra a dita aplicação.

Ainda assim, dou algum desconto porque vivemos tempos muito complicados. E se a mim é muito fácil estar aqui a criticar à posteriori, quando na Europa estarmos bem longe de ser os piores, bem mais difícil será para os responsáveis tomar medidas. Ainda assim continuo incrédulo como é que alguém se foi lembrar duma coisa destas.