É fácil falar-se em "meritocracia" quando segundo a OCDE, uma família portuguesa pobre precisa de 5 gerações até os descendentes terem um salário médio.
Sobre a "meritocracia" o que pouca gente sabe é que é um termo pejorativo, inventado Michael Young, escritor de esquerda, no seu livro satírico de 1958 e que se chamava The Rise of Meritocracy.
A obra retrata uma Inglaterra do futuro em que as pessoas são classificadas de acordo com sua inteligência, medida por testes padronizados. Os "mais inteligentes" recebem a melhor educação e têm acesso aos melhores empregos, e os “menos inteligentes” ficam com o que sobra. Mas esse sistema, que Young batiza de “meritocracia”, contém distorções evidentes: os “mais inteligentes” são-no, em parte, justamente porque recebem educação de qualidade – sem a qual os "menos inteligentes" jamais terão qualquer hipótese de ascender. O livro mostra como um sistema aparentemente justo se pode tornar uma máquina de produzir e agravar injustiças. Termina na Revolta da Meritocracia, uma convulsão social que se passa em 2033.
Resumindo: o termo “meritocracia” é pejorativo. Isso não impediu que, ao longo das décadas, fosse mudando de significado – e acabasse adotado pela direita como exemplo de coisa positiva, o que Young detestava. "O livro era uma sátira, uma advertência (que, nem preciso dizer, não foi ouvida)”, escreveu ele em 2001, um ano antes de morrer, no artigo Down with Meritocracy publicado no jornal inglês The Guardian.
Ironicamente a piada de Young virou dogma e hoje dizem-nos que vivemos em tempos de "meritocracia" e que tudo aquilo que alcançamos depende apenas do nosso trabalho árduo. E se não conseguimos a culpa é nossa, é porque não nos esforçamos o suficiente, porque afinal, para direita, todos podemos ser ricos. Viva a "meritocracia"!!
Dizes - "não foi ouvida", pelo contrário foi bem ouvida pelos sistemas políticos...
ResponderEliminarA descrição que fazes da sátira de Young podia bem ser a descrição de sistema de ensino nacional, onde "alguns " alunos são encaminhados para o ensino "profissional", que de profissional tem pouco mais que o nome e onde a a exigência e os objetivos ficam muito aquém do que deveria ser um sistema profissional de qualidade. Ou mesmo o que se passa nas escolas da periferia, onde é assumido que a exigência "tem que ser inferior e adaptada ao contexto da escola"...
que é isto senão uma Sátira à "meritocracia" liberal???
(porcaria! tinha já o comentário pronto, fiz responder e estava sem net e acabei por perder o que tinha escrito)
EliminarAcabei por falar que ainda ontem na rádio ouvia o programa "90 segundos de ciência" e uma investigadora explicava que estava a investigar a influência do contexto socioeconómico dos pais nos marcadores biológicos das crianças e descobriu que em crianças filhas de pais com menos estudos ou com rendimentos mais baixos, estas tinham maior índice de massa corporal, maior diâmetro da cintura e outras coisas mais técnicas e explicou que estas crianças já estão numa trajetória de maior risco de saúde nos primeiros dez anos de vida.
E são todas estas diferenças que deveríamos combater. A riqueza deveria ser melhor distribuída para que então sim, perante as mesmas condições e oportunidades depois sim, os mais aptos poderia fazer a diferença. Mas infelizmente muitas vezes o mérito é nascer numa boa família, ou ter o mérito de conhecer alguém relevante que dá uma mãozinha e faz as coisas acontecer...
Sobre o livro "the rise of meritocracy" não percebo o porquê de, ao que me parece não estar traduzido para português, e o original custa entre 50 e 70€!!