Sabia. Sempre soube aliás, mas ela até esse dia não sabia que eu sabia.
Reconheci-a logo no primeiro dia que entrei por aquela porta daquela empresa. Minutos antes de ser entrevistado na sala de reuniões, entrevista que poria fim a um longo calvário de anos de desemprego, aquela aparição fazia com que ficasse entretido a conversar comigo mesmo, se seria mesmo ela que trabalhava ali.
A vaga só pode ser minha, pensei. Vens a uma entrevista, numa empresa que tem, claramente, nome de banda de Metal Gótico ... ou de outro Metal qualquer! e ainda por cima trabalha aqui uma vocalista de uma banda, que tu até viste umas quantas vezes atuar ao vivo? Isto só podia ser um sinal!
Seis meses passaram e eu nunca lhe disse que sabia bem quem ela era, ou se quisermos, que sabia da outra vida dela, que os outros colegas já lhe tinham ouvido falar, mas que no fundo ninguém tinha conhecido como eu, porque afinal, eu havia estado em vários concertos da banda dela. Mas o mais interessante é que, mais tarde, viemos mesmo a descobrir que uma outra colega, tinha estado também no mesmo festival, onde a banda dela tocou e onde eu mesmo estive também. E o mundo é de facto mesmo muito pequeno. Como estou sempre a dizer, nós estamos todos ligados, cruzamo-nos com diferentes pessoas, que ainda nem sequer conhecemos, mas que mais à frente estarão bem perto de nós. Naquele festival estivemos lá os três, cada um na sua vida e nenhum conhecia os outros dois, provavelmente até nos cruzamos, e um dia haveríamos de trabalhar os três juntos.
E eu tenho histórias ainda bem mais improváveis e rocambolescas que esta, e que aconteceram, curiosamente, também em festivais... e isto faz-me pensar que já não vou a um festival há uns anos. O que eu andarei a perder?!
E eu tenho histórias ainda bem mais improváveis e rocambolescas que esta, e que aconteceram, curiosamente, também em festivais... e isto faz-me pensar que já não vou a um festival há uns anos. O que eu andarei a perder?!
Estávamos em 2005. Eu atravessava o recinto do Vilar de Mouros com um amigo meu, e ela passava por nós, já depois de ter atuado, naquela sua pose altiva e segura de si. Tinha os cabelos pretos, lisos e compridos, e vestia um casaco de pele, preto, também ele comprido. O meu amigo vira-se para mim e diz que ainda lhe vai pedir um autógrafo. Mas não pediu. A banda dela tinha sido a primeira a abrir as hostilidades, numa noite que, depois de Anathema, que toda a gente adorou menos eu, e ainda iria acabar ao som de Within Temptation e Nightwish. E eu estou em crer que esta terá sido, pelo menos a terceira vez que vi a banda dela atuar.
Por isso sim, eu sabia bem que ela já tinha tocado numa banda conhecida. Mas ela não sabia que eu sabia. Mas também eu ia fazer o quê? Chegava ao pé dela, quase a babar-me como uma groupie e dizia-lhe? E assim do nada, sem vir em conversa? Eu não sou desse género, por norma sou bastante discreto até. Mas aquela fora, talvez, a primeira oportunidade que eu tinha de lhe fazer ver, que sim, que eu sabia, e em boa verdade também não tinha qualquer motivo para fazer disso segredo.
O desconforto e embaraço foi quase enternecedor. Aquela minha colega de trabalho já quase não parecia a mesma mulher que havia atravessado de forma altiva e segura de si, naquele recinto daquele grande e mítico festival. Estava surpreendida, mas num surpreendente embaraço.
Já há bastante tempo que lhe tinha dito que um dia traria um CD para ela autografar. E falei, meio por falar, e às vezes talvez pareça que não seja para levar a sério. Talvez isso seja uma caraterística minha, dizer algo e as pessoas entenderem isso um eterno protelar, mas quando eu no fundo sei que as coisas vão acontecer, mas não tem de ser no dia seguinte. Eu já aqui escrevi que quando quero algo tenho tempo, não precisa ser no dia seguinte, nem na semana seguinte, nem no mês seguinte. Posso até esperar pela encarnação seguinte se for preciso. As coisas acontecerão quando tiverem de acontecer.
E aconteceu precisamente esta semana. Eu precisava levantar dinheiro e o multibanco aqui da aldeia está fora de serviço. Parece que uns empreendedores incompetentes tentaram arranjar forma de rebentá-lo mas falharam. Clara falta de formação! Então, logo após o almoço decidi ir a pé até ao hipermercado, que fica a uns oito minutos, a passo bem rápido da empresa. Mas, só para me contrariar, também este multibanco não tinha dinheiro para me dar. Então, já que estava ali, resolvi entrar e comprar uma caneta da acetato - a dúvida desde logo foi depois escolher entre 0,4 ou 0,6mm! - especialmente para a minha colega de trabalho me autografar o CD, que diga-se já andava há uns bons meses no porta (não luvas) mas porta-tralhas do carro. E claro que tinha de ser com uma caneta especial, ela não me ia assinar o CD com uma caneta azul qualquer lá do escritório! Eu sou atento aos detalhes, e afinal este não era um autógrafo de oportunidade, não é atriz-toda-boa que passa pelo caçador de autógrafos que tenta de imediato arranjar uma recordação. A minha colega está ali todos os dias, à minha disposição, bastava eu querer, então a caneta não podia ser uma qualquer.
Chegado à empresa fui ao carro buscar o dito CD e levei com ele a caneta, ainda virgem, dentro do hímen da embalagem plástica, e entreguei-lhe para então ela, finalmente, me me dar o autógrafo.
E depois ainda acusas as outras pessoas de terem momentos groupies!
ResponderEliminarOh pá, mas isto não foi um momento nada groupie!! Eu demorei quase dois anos a entregar-lhe o CD! E eu não o escrevi no post (e houve tanta coisa que poderia ter escrito que a esta hora ainda estaria a escrever!) mas eu só pedi o autógrafo porque esta senhora é minha colega de trabalho! E isso faz toda a diferença! Aliás, eu não sou mesmo nada caçador de autógrafos, nem mesmo das bandas que gosto mesmo muito e que já poderia ter! Eu ao contrário de certas pessoas sou muito discreto!
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