domingo, 8 de maio de 2016

Dia das Mães Sozinhas

Depois de andar algum tempo como que perdido pela cidade, porque quando as alternativas são várias e não definimos previamente o programa de festas, tal como aliás eu sempre gosto de fazer, mesmo sozinho, como foi e é agora na maior parte das vezes o caso, acabamos por nos perder por entre as diferentes opções. Afinal estando sozinhos, sem um amigo ou companheira, existe um mar de possibilidades. Podemos ir onde nos apetecer. Só temos de decidir onde ir.

Acordei sem sequer saber que era Dia da Mãe. E dou-me por feliz por não ter sabido. Isto significa que devo andar mesmo a leste deste mundo, que diga-se, cada vez mais detesto, para não ter tropeçado em qualquer publicidade a avisar-me que tinha de me lembrar que a minha mãe existe. Bem que alguém me tinha dito no dia anterior, que como no dia seguinte era um dia especial para a mãe, iria dar um passeio com ela. Não sou de fazer muitas perguntas. "Talvez a mãe faça anos". Só no dia seguinte, quando passava os olhos pelas capas dos jornais é que percebi que era Dia da Mãe. 

Até que lá cheguei ao local que iria visitar pela primeira vez. E a verdade é que eu gosto sempre de descobrir novos sítios. Novas primeiras vezes. 

Estacionei a carroça, (o cavalo preto agora fica mais vezes em casa) e saio descontraidamente. Passo os olhos de forma discreta e observo  tudo o que se passa em redor. No meio de toda a ação de pessoas que passam, uma aparição chama-me a atenção.

Agora há um tipo de mulher que há um ano vejo constantemente, em todo o lado. Tal como há um determinado carro. Há sempre um, daquele modelo daquela marca e precisamente daquela cor. Antes, até podia nem reparar, mas agora vejo-o em todo o lado que vou. Tal como o mesmo perfil de mulher. 

Saí da carroça, e no meio de toda a ação de algumas pessoas que se cruzavam, uma mulher que jogava à bola com uma criança de imediato é o centro das minhas atenções. A mulher, não sei, deveria ter uns trinta anos, por aí. Cabelos pretos pelo meio das costas, corpinho de sereia, quase de mulher adolescente com uns óculos de sol que lhe tapavam quase metade da cara. A criança, também ela de cabelos pretos brilhantes, não sei, talvez tivesse nove ou dez anos. Mulher e criança jogavam alegremente à bola. "Ainda nem entrei mas ao menos já valeu a pena cá ter vindo" pensei olhando pelo lado positivo.  



Ao ver aquele cenário só poderia imaginar. Quem seria aquela mulher e aquela criança e o que seriam um ao outro? Uma tia gira que se separou recentemente, e que agora tão cedo não tem pachorra para homens e tem agora muito tempo livre para ficar com o sobrinho, enquanto a irmã faz um programa romântico de fim-de-semana com o marido? Também poderia ser a mãe do miúdo. - Mas ainda tão jovem? Se calhar nem trinta anos tem. Mas também poderia ter tido o filho já depois dos vinte. 

Esta é uma das vantagens de sair sozinho. Observar.  Quando saímos com alguém a nossa atenção centra-se nessa pessoa, ou pelo menos assim deveria ser. Tudo em redor desfoca e focamo-nos muito mais nessa pessoa. Estando sozinhos estamos no nosso mundo e observamos tudo com muito mais pormenor e temos tempo até para nos ouvirmos a nós mesmos. 

E lá entrei. Fui fazer a minha visita demorada e tranquilamente. Até que, do ponto mais elevado onde estava, olhava lá para baixo e via, de novo, aquela mesma mulher jogando à bola com a mesma criança.  Admirava como ela tocava a bola com os pés e como mulher e criança interagiam. 

Mas a resposta à minha dúvida ia ser dada.

"Mãe". Disse a criança para a mulher que já tinha a sua cara exposta, desprotegida daqueles óculos escuros que lhe tapavam quase metade da cara. E afinal, aquela bonita mulher, de cabelos pretos pelo meio das costas, de corpinho de sereia não era tia, nem tinha outra qualquer relação com aquele menino. Ela era, evidentemente, mãe daquele rapaz que herdara os seus mesmos cabelos pretos brilhantes. 

Era um domingo à tarde. Uma mãe jogava à bola com o filho em frente de uns prédios de apartamentos. Mas e o pai? Perguntei-me onde poderia estar o pai. E será que o pai ainda estava junto com a mãe? Poderia estar a trabalhar no estrangeiro...ou poderia estar em casa a ver televisão... ou poderia estar em mil outros sítios diferentes. Poderia até já ter morrido sabe-se lá Mas fosse como fosse, a verdade é que, num domingo à tarde, naquele Dia da Mãe, em que toda a gente menos eu valoriza, aquela mulher estava ali, sozinha com o seu filho. 

Terminei a visita e comprei algo para alimentar o corpo. Isto das aparições estimulam-me a mente mas não alimentam o meu estômago de passarinho que precisa de andar sempre petiscar. Saí (e haveria de voltar a entrar) enquanto comia tranquilamente. Gosto de comer devagar, com tempo, de saborear os alimentos. Deu para perceber que a bola de carne de frango, que comprei aquela senhora (que aproveitou logo para me cravar uma rifa!) tinha molho de leitão. 

Cá fora de novo, já a mãe não jogava à bola com a criança. Eu continuava a comer enquanto caminhava um pouco, de máquina fotográfica ao ombro, para lá e para cá, enquanto ensaiava uns ângulos e ficava chateado com os carros que estavam estacionados em frente do sítio que queria fotografar. "Cá virei num dia de semana, para tirar uma fotografia decente sem carros" pensei. 

Entretanto outra mulher e outra criança brincavam sozinhas, também à bola, a uns dez metros onde tinha visto a outra mãe e o filho. Esta mulher, também ela magra, vestida de forma desportiva, com calças de fato de treino cinzentas e também com óculos de sol mas cabelo pintado de amarelo, brincava, sozinha, com uma menina de dois ou três anos. 

No dia da Mãe, reparei em duas mulheres. Duas mães que brincavam sozinhas com os seus filhos. Hoje não é o dia da Mãe pensei. Hoje é o dia das Mães sozinhas.  

8 comentários:

  1. Pois, acho que as mulheres estão a começar a ficar inteligentes. Ou já não têm paciência para companheiros ou já aprenderam que não são cãezinhos de estimação que só podem sair com o dono atrás.

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    1. Olha que eu não concordo muito com essa visão. Repara, hoje, como antes, fazem-se filhos mas os divórcios e separações dispararam brutalmente, e curiosamente até acho que o aparecimento dos filhos fá-los disparar ainda mais porque cria um foco de instabilidade no casal e depois (apesar do aumento das guardas partilhadas) os filhos acabam invariavelmente por ficar mais ao cuidados das mães. Tenho um exemplo no trabalho de uma mulher que depois do divórcio ficou sozinha com o encargo dos dois filhos pequenos e ainda teve de ir para tribunal pedir a pensão de alimentos. E ainda por estes dias ouvia alguém dizer que depois ninguém está para aturar os filhos dos outros, referindo-se a mulheres livres mas com filhos. Ou seja, o homem divorcia-se, mas continua livre para continuar a propagar os seus genes, ao passo que as mulheres, apesar de quererem voltar a encontrar outro príncipe (des)encantado, passam a ser olhadas com desinteresse por carregarem consigo um ou mais brindes.
      Se alguma mulher passar por aqui que me desminta, mas tenho para mim, que é muito mais fácil um homem poder ser cobiçado mesmo tendo filhos (que muitas vezes estão com a mãe) do que uma mulher ser cobiçada tendo em casa crias de outro macho.

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  2. Bom,e pelo teu comentario,tem de ter todas "corpo de sereia" para serem,como dizes,"cobiçadas"! Agora imagina as que o nao tem!!

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    1. Olá UmaMaria bem-vinda!

      Olha que isso do corpinho de sereia (ou de golfinho se preferires!) tem muito que se lhe diga! A começar desde logo no aumento de 15Kg nos homens mal assinam o papel do casamento! Ou seja, no após-separações, muitas vezes serão os homens que estão com mais bagagem-extra que as mulheres, até porque (parece-me) que existe uma muita maior pressão da sociedade para que as mulheres voltem rapidamente ao peso normal depois de terem as crias que com os homens que ficam com barriga de grávida provocada pelo levantamento do copo de cerveja.
      E depois há outra questão. Acho que a exigência para com a beleza/corpinhos mais atraentes, será maior aquando do investimento na primeira relação. Depois dos divórcios estão todos no mercado e quero acreditar que as pessoas, na segunda tentativa, talvez queiram encontrar alguém com corpinho de sereia mas é no cérebro ou nas qualidades, mais que privilegiar umas mamas ou um cu mais ou menos proeminente. Como costuma citar uma amiga minha muitas vezes "as conexões físicas são comuns, raras são as conexões mentais". Mas logicamente que apesar de tudo todos nós temos olhos e gostamos de um embrulho apresentável!

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  3. Reconheço que o meu comentario podera ter sido um pouco precipitado...mas que ha uma grande preocupaçao,a meu ver exagerada,com o "embrulho",la isso ha! Mas pronto. Como dizia o Woody Allen, "a vida e um grande restaurante!" e ha que manter as aparencias. E claro que eu,quando recebo presentes,nao me interessa a embalagem mas sim o objeto.

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    1. Também não podemos ser hipócritas. Os olhos também comem, e no que às relações diz respeito também há a química e o desejo. Há até quem diga que nos sentimos, sem nos apercebermos, atraídos por pessoas com um sistema imunitário oposto ao nosso, porque a natureza lá saberá o que faz. Mas os olhem comem. As pessoas vão comprar um carro, será que, para o orçamente que têm, vão fazer a compra mais inteligente? O mais económico e o mais fiável ou vão comprar o modelo que acham mais giro ou que mais estatuto social dá?
      E é verdade que depois há as aparências, e o interesse. Um velho, gordo e careca, pode ser muito pouco interessante, mas se for rico, rapidamente passa a ser mais interessante que qualquer outro homem que seja jovem e bonito. É uma pergunta que por vezes faço: será que fôssemos cegos, as nossas "escolhas" românticas seriam as mesmas?

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  4. Certamente que nao porque os sentidos que faziam a escolha seriam outros...mas olha, eu tenho uma amiga bastante gorda casada com um homem bastante magro. Cada um deles e extremamente interessante e fazem um casal perfeito!

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    1. Tudo é muito relativo e cada caso é um caso. Nem de propósito eu tenho uma colega gorda (ok quase todas têm excesso de peso e também pudera, tais sais os mantimentos que têm nos cacifos que dava para estar um mêm num bunker!) mas ela disse-me que não se sentiria bem ao lado de um homem magro, porque se ia sentir, e a palavra é dela, um "potezinho". E conheço outra mulher, que é ainda é muito jovem e com bastante peso, e que me diz que é o corpo que está a fazer com que os homens não se aproximem dela. Tal como grande parte das mulheres escolhem ou sentem-se atraídas por homens mais altos que elas. Outro exemplo, um amigo meu disse-me que nunca namoraria com uma mulher que fumasse! E o que eu acho é que se as pessoas tiverem uma listazinha com pré-requisitos nunca vão encontrar quem as satisfaça! O que eu acho é que nós não deveríamos escolher. O amor escolhe-nos a nós, e muitas vezes, quando não estávamos minimamente à espera disso.

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