"A ditadura perfeita terá a aparência da democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão sequer com a fuga. Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e ao divertimento, os escravos terão amor à sua escravidão."
sábado, 28 de agosto de 2021
Tristes Efemérides Numerológicas
sexta-feira, 27 de agosto de 2021
Polígrafo SIC Anda Perdido Há 100 Dias a Caminho de Marte
quarta-feira, 25 de agosto de 2021
Pra Cima de Pasquim
terça-feira, 24 de agosto de 2021
Estamos Todos Vacinados Mas Porque é Que Morrem Dez Vezes Mais Pessoas em Portugal?
terça-feira, 17 de agosto de 2021
Qualquer dia Estamos a Acabar uma Relação com um Emoji
A propósito das afirmações de Cristophe Clavé, que relaciona o empobrecimento da linguagem com o emburrecimento coletivo (temos primeira vez uma geração com um QI inferior ao dos pais) aqui deixo alguns excertos do programa "O Amor é" da Antena 1 com Júlio Machado Vaz e Inês Menezes.
"Ao simplificarmos cada vez mais a linguagem é inevitável que, atrás da linguagem vá também o processo de pensamento.
Vou-lhe dar um exemplo, que por caso me irrita bastante. Eu gosto muito de adjetivos e, hoje em dia, assistimos, quer na televisão, quer nas redes sociais, hoje em dia parece que só temos um adjetivo que é o "incrível". O incrível dá para tudo. Não quer dizer que eu não o use, porque eu também o uso, mas, tudo está resumido ao incrível e isso terá a ver com este empobrecimento da linguagem, com esta preguiça. Nós não vamos procurar outra forma de adjetivar, serve-nos o incrível.
Se nós não conseguimos articular (antes de dizer as palavras nós pensamos). Numa discussão estamos a elaborar um argumento. Se a poupo e pouco isso se vai tornando cada vez mais difícil nas nossas cabeças, antes de as escrevermos ou dizermos, isto vai empobrecer a nossa capacidade de argumentar. Perante essa incapacidade de argumentar, uma das pseudo-soluções é a emoção tomar o lugar do processo de pensamento. E então o que acontece é que, com meia dúzia de palavras, o que nós acabamos por verificar é que desaguamos no conflito, as posições são rígidas, tão mal explicadas, as pessoas não têm maleabilidade. Veja por, por exemplo, à medida que nós vamos tendo mais dificuldade de criar aquilo que é dito - e não é só a palavra pura e dura - é a maneira como a palavra é dita. Nós vamos perdendo a capacidade de discernir, de vez em quando, entre o insulto e o humor. E isso pode ser catastrófico num diálogo.
As nuances da linguagem. Há palavras muito próximas. Quem tem muito bom vocabulário tem a capacidade de fazer um autêntico degradé no seu léxico, e isto é, muito enriquecedor, para a pessoa, porque tem ao seu dispor uma paleta, não de cores, mas de palavras, para traduzir o que sente, muito mais rica, mas também para quem ouve.
O Maior Inimigo do Progresso São os Velhos Hábitos
Numa overdose de idas ao hospital consecutivas, e com uma dia ao centro de vacinação pelo meio, tropeço em duas coisas que julgava que já estariam erradicadas no nosso país, hábitos que julgaria extintos, e, se não fosse pelo senso comum, então, ao menos que tivesse sido pelo poder da lei, mas parece que estava a só a ser ingénuo porque parece que há hábitos que custam a ser extintos.
A questão tem que ver com os símbolos religiosos nos hospitais. E logo à partida há dois interesses que podem parecer colidir: o da liberdade religiosa e o da laicidade do Estado. Vivemos num país com liberdade religiosa. Cada um pessoa professar a religião que quiser, acreditar no Deus que melhor lhe convier, que não pode ser discriminado por isso. Tudo bem, nada contra. Mas também vivemos num país que, supostamente (e é mesmo supostamente mas pronto, façamos de conta) é laico. E isto quer dizer que já não vivemos num país onde a religião é lei, como ainda há tão pouco tempo acontecia em que era obrigatório, ao lado do quadro com a fotografia do ditador, um belo crucifixo. Portanto, o Estado nem é católico, nem protestante ou testemunha de Jeová; o Estado não tem religião nenhuma e, cada pessoa é livre de ter ou não ter nenhuma religião.
E como é que um Estado se exibe verdadeiramente laico? É simples, não tomando nenhum partido religioso, não exibindo símbolos que violem essa imparcialidade. Para tratar todos por igual, as diferentes religiões, os ateus e agnósticos, é manter uma neutralidade religiosa.
Como vivemos demasiado tempo num Estado religioso, esses resquícios de parcialidade eram olhados sem estranheza, afinal, a quase totalidade da população era católica. Mas, libertados desse jugo de 48 anos de ditadura fascista e católica, em que os crucifixos eram obrigatórios, as coisas começaram a mudar e era preciso que o Estado se mostrasse, efetivamente, laico, e que não o fosse só no papel.
Foi então que, por exemplo, os crucifixos nas escolas e hospitais começaram a incomodar, não porque pessoas como eu não respeitam a liberdade religiosa dos outros, mas porque consideramos que, quando vamos a um departamento público, seja uma escola, hospital, ou repartição de finanças, estando em espaço neutro, este tem que ser isento e livre de manifestações religiosas. Cada pessoa, individualmente, pode levar o seu terço ao pescoço, uma burka, ou o que lhe apetecer, mas o espaço em si, bem como todos aqueles que representam o Estado, não, porque o Estado tem o dever e obrigação de representar todos por igual, sejam da religião da maioria, de outra religião qualquer, ou, como eu, que não têm religião nenhuma.
Disse que nós vivemos num Estado "alegadamente laico" porque não o é na prática. Diz-se laico mas é só mesmo para constitucionalista ver. Um Estado verdadeiramente laico começa logo por não poder ter feriados religiosos! E um Estado verdadeiramente laico, não pode ter uma RTP, televisão pública, a transmitir em direto, todas as semanas, celebrações católicas! É uma completa aberração! A televisão pública até poderia ter programas sobre diferentes religiões, sobre diferentes pensamentos filosóficos, ouvir a voz dos agnósticos e dos ateus, mas um Estado laico não pode, de todo, exibir celebrações religiosas seja de que religião for! Talvez lá chegaremos um dia, quando a religião se extinguir na Europa, e cada vez está mais perto disso, mas, entretanto lá temos que gramar com este absurdo.
Contudo, convém lembrar que a questão dos crucifixos, já fez jurisprudência em 2009, quando o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, deu razão e decretou uma indemnização a uma mãe italiana que reclamou do crucifixo na escola dos filhos.
É então um pouco incompreensível para mim, quando entro numa enfermaria de um hospital público, e deparo-me com uns quantos bonecos da santinha da Fátima. Eu, se quiser ver arte sacra vou à igreja, ainda que a bíblia, ironicamente, condene o uso de imagens, mas não tenho de levar com bonequinhos religiosos quando vou ser tratado num hospital! Eu se fosse crente ia rezar à igreja porque tendo fé certamente que Deus me salvaria da doença; mas sendo um herege sem religião vou-me tratar ao hospital, por isso cada macaco no seu galho. À religião o que é da religião, ao hospital o que é do hospital.
Mas, ainda não refeito ainda desta surpresa, qual não é o meu espanto quando, no dia seguinte me dirijo ao centro de vacinação da minha região, no pavilhão multiusos de Gondomar, e, enquanto aguardo aqueles trinta minutos depois de levar a segunda dose da vacina para a COVID-19, fico boquiaberto quando, num grande televisor aparece o autarca do PS a fazer propaganda eleitoral!
Mas que merda é esta? Um centro de vacinação é num pavilhão para permitir maior afluência e vacinar o maior número de pessoas, mas é na mesma como se fosse um hospital, é um sítio do Estado, e portanto deve ser neutro e isento de manifestações ou propagandas políticas!
Mas isto não deixa de ser ainda mais gravede, quando o senhor presidente da câmara de Gondomar, Marco Martins, se mostrou, pasme-se!, muito incomodado, com as bandeiras vermelhas do Partido Comunista Português, aquando este celebrou os cem anos do partido.
Vivemos num país plural, de liberdade religiosa e política, e, felizmente, que longe vão os tempos do partido único fascista da ditadura religiosa, mas um autarca que se mostra muito incomodado com a propaganda política dum outro partido, ironicamente, não se sente incomodado por violar as regras da Comissão Nacional de Eleições e andar a fazer propaganda eleitoral num centro de vacinação público!
Acho que é admirável o que o nosso país evoluiu, a todos os níveis, nestes últimos quarenta e sete anos de democracia. Nas infraestruturas, acessibilidades, do ponto de vista da educação, no acesso aos cuidados de saúde, na cultura, etc. Mas, infelizmente, ainda há velhos hábitos, tão entranhados e até olhados com normalidade, que parece que custa muito ser erradicados duma sociedade plural, democrática e respeitadora de todos.
domingo, 8 de agosto de 2021
Ironias de um País Ingrato que Não Merece os Seus Heróis
Só que, se olharmos para trás, parece que tudo merece dia de luto nacional: cantar o fado mereceu dia de luto a Amália. Jogar à bola mereceu dia de luto nacional a Eusébio. Até uma religiosa mentirosa compulsiva, sim, um país laico meteu-se nesses assuntos da religião, e achou por bem conceder-lhe dia de luto nacional! Já o fazedor do 25 de Abril não teve direito à homenagem de um mísero dia de luto nacional para lembrar a memória do seu feito.
Ah, mas ó Konigvs, tens de compreender que ele foi uma figura polémica...
Claro que compreendo. Otelo manteve-se sempre fiel aos princípios que levaram os militares a fazer o 25 de Abril. Devolver o poder ao povo, construir um país socialista, fazer a reforma agrária. Compreendo também que o grande mal de Otelo foi lutar pelo seu sonho e não arranjar um tacho num qualquer partido, e teria sido tão fácil ir para qualquer um deles, até porque, se calhar, foi convidado por quase todos. E certamente que se estivesse filiado no PS ou PSD, aí sim, certamente teria sempre direito ao seu diazinho de luto nacional, porque afinal foi o herói de Abril! Mas Otelo teve o descaramento de não se deixar corromper e a política tem sempre muito medo de pessoas com coluna vertebral.
Diz-se que Otelo foi polémico. Se calhar foi, polémico principalmente para todos aqueles, que não são poucos, e que odeiam o 25 de Abril e os cravos vermelhos.
Mas se Otelo foi "polémico", o que dizer então da figura do terrorista Spínola? Spínola tudo fez, depois do 25 de Abril, para instalar uma nova ditadura de extrema-direita. Spínola liderou em 1975 um movimento terrorista, o Movimento Democrático de Libertação de Portugal (MDLP), que andou a colocar bombas em sedes do partido comunista (e socialista), que mataram diversas pessoas, incluindo o famoso padre Max e Maria de Lurdes e tantos anos volvidos ninguém foi responsabilizado.
Fez-se o 25 de Abril, mas rapidamente meteu-se essa ideia romântica de devolver o poder ao povo na gaveta. O povo rapidamente ficou a chuchar no dedo e o dinheiro novamente começou a ser desviado do esforço de todos, para o bolso de alguns, muito poucos, ficarem com o dinheiro todo.
Cavaco Silva, ex-primeiro-ministro e ex-presidente da república, que nos tempo do fascismo foi dar o nome de bom comportamento à PIDE, também negou a pensão a Salgueiro Maia, outro herói do 25 de Abril (que também não teve direito a dia de luto nacional) enquanto a concedia a dois ex-PIDE pelos "altos serviços prestados".
Mas depois há coisas, de facto, muito irónicas. Faz-se o 25 de Abril, acabou-se com 48 anos de ditadura, inscreveu-se na Constituição que os partidos fascistas são proibidos, mas o Tribunal Constitucional não viu nada de errado com o racista, homofóbico e xenófobo partido Chega. Nem viram nada de errado na entrega de milhares de assinaturas falsas para fundar o partido, processo que ainda está a ser investigado pelo Ministério Públiico. Nem ninguém viu nada de errado com a lista que permitiu a Ventura ser eleito deputado e que não cumpria os critérios.
E, ironia das ironias. Dias depois da morte de Otelo Saraiva de Carvalho, ficamos a saber que, pela primeira vez, na recente história da democracia portuguesa, um bombista terrorista de extrema-direita do MDLP vai sentar o cu na suposta casa da democracia, eleito por um partido ilegal. Um bombista terrorista de extrema-direita vai substituir um deputado racista eleito por um partido ilegal.
Otelo (e os militares) acabaram com a ditadura salazarista devolvendo-nos a liberdade, mas nunca devemos tomar a Liberdade por garantida. E a mim revolta-me ver este estado de coisas. Revolta-me ver um país ingrato com quem nos libertou dum jugo de repressão, de fome e de morte. E revolta-me que, apesar de teros tido quarenta e oito anos de ditadura repressiva, apareça um partido fascista ilegal, que os juízes do Tribunal Constitucional simplesmente não viram nada de errado, e que tenha levado 500 mil portugueses a votar no seu líder racista, homofóbico, xenófobo e fanático religioso nas últimas presidenciais.
São tudo sinais a que deveríamos estar muito atentos, porque, como se sabe, "quem adormece em democracia, acorda em ditadura".
# Spínola e Os Ataques À Bomba Patrocinados pela Igreja Católica em 1975
terça-feira, 3 de agosto de 2021
E Quando Não Há Química Digital?
A história já tem alguma distância temporal, até porque aconteceu no primeiro verão de pandemia!, mas é rápida de contar. Numa das melhores aplicações de engate que existem (Custo Justo ou OLX!) enontrei-me com uma vendedora a quem comprei uns quinze livros. Ela foi sempre muito simpática. Encontrei-me com ela na estação de comboios e acabamos por ficar a conversar uns quantos minutos porque a conversa começou a ficar muito interessante. Achei-a extremamente culta, e isso cativou-me ainda mais que as boas pernas ou o decote proeminente. Entretanto chegou a hora de pagar e ela não tinha troco. Como me vendeu os livros a um preço simbólico, acabei por a contrariar, que queria ir levantar dinheiro, e dei-lhe cinco euros a mais. "Então depois escolhe mais livros ou dou-lhe a diferença".
Essa ponta solta fez com que acabássemos a trocar mensagens. Tratávamo-nos sempre na terceira pessoa e eu sempre fui (como sou sempre) bastante respeitoso, ainda por cima sabia lá bem eu se a senhora era comprometida ou não. Ainda por cima tinha-me dito que "estamos a mudar" por isso estava a despachar dezenas, se não centenas mesmo, centenas de livros. E "estamos" é plural, é mais do que um. Mas começou a chegar a um certo ponto que percebia-se que ela estava a ser muito explícita no interesse - fosse ele qual fosse - na minha pessoa.
Começamo-nos a tratar tu, a trocar mensagens, mas ela queria ir para um canal de conversação. Tudo bem. Mas coisa já nas mensagens por telemóvel não começou lá a fluir muito bem, e de forma meio despropositada pergunta-me se eu sou sempre assim, "lento" para tudo. Posteriormente percebi que estava bloqueado na rede social que usámos para teclar, durante, sei lá, um dia? Dois?
Não houvesse tecnologia, provavelmente ia-mos sair, quem sabe até, com algum convívio íntimo e nunca se sabe o que poderia dali acontecer. Assim a senhora foi ver o meu perfil da rede social, fez os seus juízos de valor - "porque é que não gostas dos Estados Unidos" - e, aquilo que até poderia ser uma bela amizade, acabou digitalmente mais depressa que começou, porque, ao que parece, não tínhamos química digital.