"A ditadura perfeita terá a aparência da democracia, uma prisão sem muros na qual os prisioneiros não sonharão sequer com a fuga. Um sistema de escravatura onde, graças ao consumo e ao divertimento, os escravos terão amor à sua escravidão."
O PSD tem social democrata (esquerda) no nome mas saiu do armário e agora identifca-se como CH€GA.
Vai daí e depois de um congresso sem nenhuma ideia, e, se calhar para abafar o escândalo do ministro dos negócios estrangeiros Paulo Rangel que insultou militares, lançou-se o soundbite: é preciso libertar as aulas de cidadania das "amarras ideológicas". Amarras que nós mesmos criamos!
Recordando:
"Nuno Crato, então ministro da Educação, definiu como estratégico o ensino de temas como a igualdade de género, a sexualidade e o combate aos preconceitos. Disciplina não era obrigatória, mas assumia-se como importante “dotar as crianças e os jovens de conhecimentos, atitudes e valores” que os ajudassem “a fazer opções.”
O PSD agora identifica-se CH e de partidos de gays radicalmente contra os direitos dos homossexuais, não se pode esperar muito mais do que estas anedotas.
Termino com o humor da Susana Romana, hoje, na Notícias Magazine. Ide ler, aprende-se sempre alguma coisa de política a rir:
Qualquer pessoa minimamente interessada por política conhece a origem das palavras e o porquê de se designar "esquerda ou "direita" aos diferentes partidos. Ainda assim tenho sérias dúvidas que a maioria das pessoas, até das pessoas que votam, que conheçam saibam porquê, o que, diga-se, considero grave.
E mais grave ainda, é ir votar sem saber quem são aqueles que o defendem - sem ter "consciência de classe - e isso já não é uma suspeita, é mesmo uma constatação. Basta olhar para os resultados eleitorais para perceber isso. A maioria não tem qualquer conhecimento político e vota como quem anda no mundo - e é a maioria - por ver andar os outros.
O jornalista e escritor argentino Martin Caparrós publicou na revista El País Semanal um texto extremamente interessante (também concedeu esta semana uma entrevista que saiu na revista do jornal La Vanguardia) porque responde a essa dúvida, da origem das palavras "esquerda" e "direita" na política, mas vai mais longe. Explica também, muito claramente, quais são os propósitos da direita. E fala numa só direita, não há cá centro direita, mais à direita ou extrema-direita, mas sim, "a direita". O que defende a direita?
"Os espanhóis falam de direitas porque acreditam que são muitas; nós, os sul-americanos, dizemos direita porque talvez suspeitemos que todas são uma. Mas o significado político da palavra vem de Paris e celebrou, há algumas semanas, 235 anos: "No dia 29 de agosto começámos a reconhecer-nos: os que defendiam a sua religião e o seu rei reuniram-se à direita do presidente para evitar os gritos, os insultos e as indecências que ocorriam na parte oposta, à sua esquerda", escreveu nas suas memórias o barão de Gauville, deputado da nobreza na Assembleia da Revolução Francesa. Foi o nascimento da definição política mais eficaz dos últimos séculos: a esquerda, a direita.
Funcionou, manteve-se: era muito clara, muito gráfica e tão arbitrária que, embora agora pareça estranho, aqueles senhores poderiam ter ficado ao contrário e diríamos ao contrário, e seria o mesmo. De qualquer forma, continuamos a falar de direitas e esquerdas, com as suas matizes. Durante anos, as direitas quiseram disfarçar-se de centros. Mas viram que as esquerdas o conseguiam melhor e tiveram de se lançar à sua direita. Por isso, agora, as que mais se destacam chamam-se “extrema-direita” ou “ultradireita”.
Estamos impressionados porque a “extrema-direita” ressuscitou quando a dávamos por morta. Durante décadas, foi a etiqueta que quase todos evitavam; agora, pelo contrário, é uma que muitos procuram, mesmo quando não está muito claro o que significa, o que querem dizer. O que sim está claro é que nos vendem a ilusão de um movimento global unificado — “a extrema-direita avança no mundo” — quando as diferenças entre eles são inúmeras.
Às vezes parece que dizer “extrema-direita” é tão vago como dizer “populista”. Vago, digo, no sentido de preguiçoso, descuidado. É uma concessão que lhes fazemos e deveríamos deixar de a fazer. Definir todos esses oportunistas dispersos como parte do mesmo grupo dá-lhes poder, agiganta-os — e, por isso, vale a pena ser mais preciso e realçar as suas diferenças.
Que são tantas: alguns são estatistas, outros querem destruir o Estado; alguns são nacionalistas, outros são pura globalização; alguns veneram o mercado, outros desconfiam dele; alguns respondem a velhas tradições fascistas, outros acabaram de se inventar; muitos são bons cristãos, outros mais supersticiosos; vários são muito homofóbicos, outros um pouco menos. E costumam ser antissemitas como os seus antecessores, mas inventaram uma nova forma de o ser: apoiar o seu camarada de Israel.
O que os une, se é que há algo, é a forma como aproveitam a frustração reinante e oferecem a esses frustrados a expectativa de uma “mudança social”. É curioso: em vários países, essas direitas conseguiram aparecer como a única reacção contra um status quo que supostamente todos os outros representam. E assim tornam os outros em “conservadores” que querem manter a democracia, estas sociedades onde tantos não vivem as vidas que merecem.
Isso, sim, é uma mudança: a direita sempre se definiu por conservar, por lutar para que nada mudasse, porque qualquer mudança seria pior, destruía a ordem. Não se podia ser de direita sem uma religião, que garantia que tudo ia continuar igual, porque era a vontade de um deus. Nem se podia ser de direita sem algum dinheiro, porque a direita existia para garantir que os pobres não o “roubariam”. Nem sem se agarrar às velhas tradições e às velhas regras. Agora, pelo contrário, muitos dos eleitores de direita são trabalhadores que temem ser substituídos por migrantes, perder os privilégios que deveriam ter por terem nascido mais perto. Estas novas direitas expressam e exploram como ninguém o medo do diferente.
Mas a meta que realmente os unifica a todos é a que silenciam: melhorar a vida dos ricos. Fazem-no de muitas maneiras. O enredo fiscal é um dos seus favoritos: passa despercebido e beneficia-os muito. E assim alcançaram o seu objetivo.
Objetivo com renovada eficácia: se há algo que estas novas direitas têm em comum é a sua capacidade de conseguir que os pobres votem para defender os interesses dos ricos. Descobriram que estas novas máscaras extremistas podem dar um aspeto moderno e atraente às políticas de sempre, e tentam usá-las. Usar os descontentes para melhorar a situação dos mais satisfeitos é o truque mais velho do manual e, por isso, de vez em quando muda de nome comercial: agora chama-se extrema-direita quando deveria chamar-se grande direita, o governo tradicional dos poderosos de sempre. Ou direita pura e simples, que é o que é e tem sido desde aquele dia em que todos os nobres que defendiam o rei decidiram agrupar-se num dos lados da sala - e entrincheirar-se ali.
La Palabra derecha | Martín Caparrós | El País Semanal | 20 de Outubro de 2024
Que haja gente a votar sem sequer saber distinguir o que é a "esquerda" da "direita", sim, é muito parvo, por exemplo, haver gente que ache que a Iniciativa Lacoste é de esquerda, mas, pronto, tudo bem, é, como eles diriam "a iliteracia" política que temos. Agora, haver deputados na assembleia da república que não sabem qual o papel da Polícia no Estado de direito democrático, que está inscrito na Constituição da República Portuguesa, que qualquer político deveria conhecer de cor, deveria dar imediata expulsão do parlamento. Não, a polícia não existe para matar ninguém. Pelo contrário, existe para estar ao serviço e defender as pessoas. Porque, felizmente, o regime fascista-católico de Salazar, Marcelo e Cerejeira acabou em Portugal há 50 anos.
Logo após aquelas patéticas declarações do governo, querendo mostrar que estavam preparadíssimos para qualquer terramoto, lembrei-me de imediato de Cândido ou o Otimismo de Voltaire, e, particularmente daquela parte em que Cândido e Pangloss passam por Portugal quando se dá o terramoto de 1755 e como Voltaire satiriza a Igreja que, no livro, decide prevenir futuros tremores de terra com autos de fé. Aqui fica o excerto da minha edição (que tem duas obras "Cândido" e "O ingénuo" e, no final, deixo um vídeo em que a pessoa faz todo o enquadramento histórico:
"Estas reflexões fizeram com que Cândido tomasse uma decisão e fosse imediatamente procurar o seu caritativo anabatista; lançou-se-lhe aos pés; pintou-lhe uma quadro, tão, tão tocante do estado a que o seu sábio se encontrava reduzido, que Tiago não hesitou um momento: levou o Doutor Pangloss para casa e mandou-o tratar, à sua custa, com o maior esmero. O doente só perder, na cura, um olho e uma orelha, Como escrevia bem e sabia perfeitamente aritmética, Tiago fê-lo seu guarda.-livros. Dali a dois meses, necessitando de se deslocar a Lisboa em negócios do seu comércio, levou, com satisfação, os dois filósofos no seu navio.
Pangloss dava-lhe frequentes lições de otimismo, mas o bom Tiago dizia-lhe:
- É preciso que os homens tenham corrompido um pouco a natureza, pois, não tendo nascidos lobos, tornaram-se como eles. Deus não lhes deu canhões nem baionetas e eles inventaram canhões e baionetas para se destruírem. E ainda podia acrescentar à lista das perfeições, que têm adquirido, as bancarrotas escandalosas e fraudulentas, e o zelo da justiça que se apodera dos bens do falido e não dá nem um quarto aos credores.
- Pois tudo isso era indispensável - respondeu o doutor zarolho - e dos males particulares resulta, necessariamente, o bem geral; de maneira que, quanto mais numerosos são estes males, maior é a felicidade do todo. Enquanto ele assim dissertava, escureceu o céu, começaram ventos a soprar dos quatro cantos do mundo, e o navio foi assaltado pela mais medonha das tempestades, à vista do porto de Lisboa.
IV
Tempestades, naufrágio, tremor de terra e as desventuras do doutor Pongloss, de Cândido e do anabatista
Metade dos passageiros, enfraquecidos, sentindo-se morrer entre convulsões causadas pelos balanços de uma embarcação agitada em direções opostas, carecia do vigor necessário para se aperceber daquele perigo iminente. A outra metade lançava gritos e fazia promessas. As velas estavam feitas em pedaços, os mastros partidos, o barco já se fendia; poucos manobravam, ninguém governava, ninguém se entendia. O anabatista que estava na coberta, ajudava um pouco à manobra; um marinheiro furioso, deu-lhe um empurrão tão grande que o atirou ao chão, mas o impulso foi de tal modo violento, que ele próprio foi de cabeça borda fora. Teve a sorte de ficar enganchado num pedaço de mastro partido e, ao ver isto, o bom Tiago correu a socorrê-lo, ajudando-o a subir para bordo; no meio deste esforço, novo vaivém do barco atirou-o ao mar, à vista do marinheiro, que o deixou perecer, sem se dignar, ao menos, tentar salvá-lo.
Cândido aproxima-se e vê o seu benfeitor, que um momento reaparece entre as ondas, para ser de novo engolido por elas; quer arrojar-se ao mar para lhe acudir, mas o doutor Pangloss impede-o provando-lhe com os seus habitais silogismos, que a rada de Lisboa tinha sido formada expressamente para aquele honrado anabatista nela perecesse. Enquanto provava isto a priori, o barco abriu-se ao meio e afogaram-se todos quantos lá iam, exceto Cândido, Pangloss e o bruto do marinheiro que tinha feito afogar o virtuoso anabatista, e que se salvou nadando que nem um peixe, até à margem, onde chegaram depois os dois amigos, agarrados a uma tábua.
Quando se recompuseram um pouco, meteram-se a caminho de Lisboa. Traziam com eles algum dinheiro e esperavam matar a fome de que sofriam, já que a sua boa sorte os tinha salvo da tempestade. Porém, mal tinham posto os pés na cidade, chorando a desgraçada morte do seu benfeitor, sentiram a terra tremer-lhe debaixo dos pés; o mar embraveceu-se ainda mais e arrastou os navios que estavam ancorados no porto. Turbilhões de chamas e de cinzas cobrem as ruas e as praças, as casas desmoronam-se, os telhados afundam-se e os alicerces dispersam-se; trinta mil habitantes de todas as idades ficam sepultados nas ruínas daquela opulenta cidade. O marinheiro, entre palavrões e assobios ia dizendo:
- Qual poderá ser a razão deste fenómeno?
- dizia Pangloss e Cândido gritava:
- Isto é o fim do mundo, o nosso último dia!
O marinheiro corre, intrépido, pelo meio dos destroços, desafia a morte em busca de dinheiro, encontra-o, apodera-se dele, embriaga-se e, depois de cozer a bebedeira, compra os favores da primeira rapariga fácil que encontra, entre as ruínas das casas destruídas, rodeado de mortos e moribundos. Pangloss foi puxar-lhe pelo casaco, dizendo:
- Oh homem, isso não me parece bem! É faltar diretamente à razão universal, é uma péssima ocasião para se pôr com essas coisas.
Vai para o Diabo, que eu não estou aqui para ouvir sermões! - respondia o outro. - Eu sou marinheiro, sou de Batávia; em quatro viagens que fiz ao Japão, quatro vezes marchei sobre o crucifixo; vens-me tu agora para aqui com as tuas idiotices da razão universal!
Cândido estava estendido no meio de uma rua, quase coberto de terra e de destroços, mal ferido pelas pedras que lhe tinham caído em cima. Lamentava-se em voz dolente e rogava a Pangloss que lhe fosse arranjar um pouco de azeite de vinho, pois a cada momento se sentia expirar.
- Este terramoto não tem nada de extraordinário - respondia Pangloss. - A cidade de Lima sofreu, no ano passado, iguais sacudidelas; mesmas causas, mesmos efeitos; há decerto uma longa veia de enxofre subterrânea, desde Lima até Lisboa.
- Não há nada mais provável - disse Cândido. - Pela Virgem Santíssima trazei-me um pouco de azeite e vinho. - Como provável? - replicou o filósofo. - A que chamas tu provável? - Sustenho e afirmo que a coisa está demonstrada e certíssima (...)
V - Como se celebra um auto-de-fé para que não haja tremores de terra, e Cândido desemprenha nele um dos principais papeis
Em consequência disso, agarraram um biscainho que se tinha casado com a sua comadre, e dois portugueses que, ao comer um frango, tinham separado a gordura para a beira do prato; quanto ao doutor Pangloss e ao seu discípulo Cândido, quando acabaram de comer, entrou meia dúzia de polícias que amarraram ambos: um porque tinha falado, e o outro por ter escutado com certo ar de aprovação e complacência.
Puseram-nos, separados, em apartamentos fresquíssimos, onde nunca foram incomodados pela luz do sol. Dali a oito dias, enfiaram-nos nuns sambenitos que pareciam feitos de propósito para eles, e adornaram-lhes a cabeça com mitras de papel; a mitra e o sambedito de Cândido tinham pintadas chamas voltadas para baixo, e os diabos que saltavam entre estas não tinham rabo nem garras; mas a Pangloss pintaram-lhe as chamas vitadas para cima, e os seus diabos tinham garras de gavião e rabos compridos e retorcidos como chicotes. Com estas galas levaram-nos, em procissão, a ouvir um sermão muito comovente, ao qual se seguiu excelente música em cantochão.
Cândido foi açoitado em cadência, enquanto o coro cantava; o biscainho e os dois homens que não tinham querido comer a gordura do frango foram queimados a fogo muito lento e Pangloss foi enforcado, apesar de isto não ser costume. Naquela mesma tarde, a tarde voltou a tremer com assombro, estrondo".
Há uns anos tinha aqui uma rubrica de títulos de textos ou ideias que em breve publicaria. Mas agora o tempo tem-se feito pouco e os ponteiros do relógio parece que andam cada vez mais depressa. Nos últimos meses quase não tive fins de semana tive e andei sempre muito ocupado. E, se às vezes tenho algum tempo, acabo por não ter disponibilidade mental para parar e escrever e prefiro ficar a vegetar na net ou a ler a imprensa, que, confesso, virou um pouco vício que me come bastante tempo.
E são tantos os posts em falta.
Há mais de dois anos visitei o Budha Eden e ainda não publiquei nada no Bucólico-Anónimo. Há duas semanas estive no festival de jardins espanhol e também ainda nem a meio vou. E há umas quantas mais semanas passaram 35 anos que regressei de novo á escola onde fiz o 9ºano, escola que agora é secundária e considerada uma das melhores do distrito do Porto. A história por detrás do porquê de lá ter regressado era o que iria escrever. E poderia ainda refletir sobre como acho que descobri algo em que sou bom. Tenho muitos interesses, mas acho que não bom em nenhum. Talvez neste caso seja de facto melhor.
Depois do sismo que abalou o país mas em que, felizmente, ficamos a saber que temos um governo extremamente preparado caso aconteçam catástrofes em que não aconteça absolutamente nada, pensei em transcrever a partes do livro de Voltaire em que ele fala do terramoto de 1755...
Por estes dias cheguei a casa e pensei que poderia escrever qualquer coisa como: "O melhor da minha rua para a primeira divisão". Também poderia escrever sobre a primeira vez que estive no IPO e dizer que é sítio cheio de citações positivas...
Há algum tempo também escrevi umas frases soltas sobre o meu assustador medo de ficar sozinho no mundo a que dei o título de "O penúltimo medo". A proximidade da morte levantou-me também outras questões. Por exemplo, há pessoas que, na iminência da morte, viram-se para Deus ou para a religião na tentativa inútil de travarem a inevitabilidade. Diz-se que, por vezes, até acontece aos ateus. Mas não creio que seja o meu caso. Perante o sofrimento indigno e intolerável revoltar-me-ia ainda mais perante a ínfima possibilidade da sua existência e, caso me cruzasse com ele(a), a vontade seria dar-lhe uma valente paulada para ver se acorda para a vida.
A silly season de verão já passou, os Jogos Olímpicos também, e os incêndios já lá vão e só quando arderem mais casas ou morrerem mais pessoas, lá regressarão, de novo, os mesmos especialistas de sempre, com as soluções de sempre, mas, ao menos, ainda bem que está de regresso a silly season anual da aprovação do orçamento do Estado (e essa é a grande vantagem de não termos governos de maioria absoluta, uma chatice, com tudo aprovado automaticamente).
Mas relembremos os últimos episódios sobre essa personagem de seu nome V€ntura, com € dos muitos milhões com que é financiado e que não explica a proveniência, o tal que se demitia se ficasse atrás de Ana Gomes nas presidenciais.
No início V€ntura disse que só negociaria o Orçamento de Estado se fosse aprovado um referendo à imigração.
Como ficou a falar sozinho, de seguida afirmou que votaria contra o Orçamento do Estado e essa decisão era irrevogável. Ponto final. Irrevogável a sério e não "como o outro pateta fez há dez anos".
Já a espumar pela boca devido à sua irrelevância, porque só se fala do romance orçamental entre Pedro Santos e Montenegro, eis que vem dizer que admite viabilizar o Orçamento do Estado!
Nada disto surpreende, só pode mesmo surpreender os idiotas que achavam que ele diz "as verdades"! Mas quais verdades? As que os homossexuais devem arder no inferno ou que os homossexuais são fofinhos e merecem ser tratados condignamente? Que devemos fazer cercas sanitárias a certas etnias ou que os ciganos são fofinhos? Que vota contra taxas às petrolíferas mas depois diz que os seus grandes lucros são imorais e deve ser taxados? Que é preciso aumentar salários mas que depois vota contra o aumento do salário mínimo? Quais verdades?
No meio disto tudo há algo muito curioso. Ocorreu-me, "olha com quem", logo a mim que adoro a língua portuguesa que, o oposto de verme e não ter coluna vertebral - numa palavra: integridade - é desonestidade ou corrupção.
Então, o político que tudo diz e diz o seu oposto é o político mais corrupto e mais desonesto. Ironicamente é aquele que anda sempre com a corrupção na boca, afirmando querer acabar com ela!
Artigo muito interessante (publicado no El País no último fim de semana) que aborda o porquê de, nestes tempos de absurdo, as pessoas procurarem significados e explicações que vão muito além dos dados e das evidências.
"Durante uma sessão terapêutica, um dos meus pacientes, perplexo com a efervescência das eleições nos Estados Unidos, comentou: "Nunca me interessou a política, e ainda menos a desse país. Então, porque é que não consigo desviar os olhos daquela personagem vetusta e caricatural? [Trump]". Ao que ele próprio respondeu: "Porque é absurdo... uma palhaçada." Outro paciente, de meia-idade, bem-sucedido no trabalho, veio ver-me atormentado por uma ordem que afirma: "Se não rezares duas horas antes de ir trabalhar, vais ser despedido", e questiona o sintoma: "Se é absurdo, por que é que o faço?" Quanto mais vívida é a sua experiência obsessiva, mais premente é a compulsão.
Vivemos numa era de desconcerto que acarreta uma panóplia de absurdos. Não apenas no que diz respeito à política mundial. Somos atraídos pelo absurdo do absurdo. Mas o que constitui o sentimento do absurdo? E que mecanismos permitem que uma manifestação psicológica tão sem sentido seja tão importante para a vida psíquica do ser humano?
Travis Proulx, da Universidade de Cardiff, que tem vindo a estudar as respostas psicológicas ao absurdo, explica: “Quando falamos de absurdo, referimo-nos a violações dos nossos modelos mentais; é um tema ao qual os filósofos existencialistas dedicaram grande parte do seu pensamento. A morte é a ameaça mais poderosa, viola todos os modelos, mas no quotidiano enfrentamos constantemente violações das nossas expectativas sobre o funcionamento do mundo. Quanto mais os nossos padrões são questionados, mais ansiosos ficamos e mais nos orientamos para a ação para nos afastarmos daquilo que ameaça os nossos modelos de manutenção de significado. ”A pessoa presa no absurdo tende a ver padrões onde não existem, tornando-se mais suscetível a teorias da conspiração ou de causalidade religiosa.
A necessidade de ordem é satisfeita, ao que parece, independentemente da veracidade das evidências. “As ameaças aos nossos quadros de significado, seja qual for a sua origem, motivam-nos a procurar significado noutro lugar", sublinha Proulx. Na fase inicial de ansiedade, o estado de excitação pode medir-se pela dilatação das pupilas: "Estás motivado e vês sinais no ruído", afirma Proulx, cujo trabalho frequentemente utiliza a pupilometria para quantificar a excitação fisiológica perante "o sentimento do absurdo". Além disso, estudos de imagiologia cerebral em pessoas às quais se pediu que enfrentassem dilemas absurdos registam, segundo ele, níveis significativos de atividade no córtex cingulado anterior, “que participa na regulação da atenção e das emoções, no controlo inibitório, no seguimento de erros e na motivação”.
Mas nem todas as incertezas são iguais e não é de esperar que tenham os mesmos efeitos. Acontecimentos traumáticos violam estruturas de significado profundo, tornam-se enigmas existenciais e obrigam-nos a reajustar as nossas expectativas da realidade. “O transtorno de stress pós-traumático conduz a uma vigilância crónica; qualquer pequena anomalia desencadeia uma ansiedade esmagadora que não é adaptativa”. No entanto, dentro de um espectro de absurdo razoável, a ativação do padrão de monitorização de sinais no ruído pode ser benéfica.
Para testar isto, Proulx e o seu colega Steven H. Heine, da Universidade da Colúmbia Britânica, pediram a um grupo de estudantes que lesse uma versão modificada do conto Um Médico Rural, de Franz Kafka, que incluía uma série de eventos absurdos e algo inquietantes. Um segundo grupo leu uma versão diferente, na qual a trama fazia sentido. Em seguida, pediram-lhes que completassem uma tarefa de aprendizagem de gramática, na qual foram expostos a padrões ocultos em cadeias de letras e lhes foi solicitado que copiassem as cadeias de letras individuais e marcassem aquelas que seguiam um padrão semelhante.
Os que leram a versão absurda identificaram um maior número de cadeias de letras. "Estavam claramente motivados a encontrar uma estrutura", concluem os investigadores, "mas o mais significativo é que, na verdade, foram mais precisos do que aqueles que leram a versão coerente. Aprenderam realmente o padrão melhor do que os outros participantes". O teste é uma medida de aprendizagem implícita ou conhecimento adquirido sem consciência. Estamos tão motivados para nos livrarmos do sentimento de estranheza que, sem nos apercebermos, procuramos significado e coerência noutro lugar, canalizando o sentimento para algum outro projeto.
Onde quer que olhemos, o absurdo está por todo o lado. Todas as noites temos um encontro com o absurdo nos sonhos; de dia, tropeçamos nele nos nossos lapsos freudianos; o que seria da piada sem o seu núcleo absurdo? O simples senso comum não nos pode levar muito longe na dimensão do inconsciente, que se expressa de uma forma profundamente absurda.
O absurdo incita-nos a configurar quadros alternativos de significado para manter a integridade do eu e do nosso ambiente. Nas palavras do poeta Pierre Reverdy: "A realidade poética surge do encontro de duas realidades distantes".
David Dorenbaum | Ilustração de Guridi | El País de 6 de Outubro
Gosto muito de conversar com a minha melhor amiga, sobre o que quer que seja mas também sobre política. É muito inteligente e informada e gosto sempre de conversar com ela e ouvir as suas opiniões, mesmo que por vezes discordemos.
Falávamos do preço absurdo das casas - a propósito, obrigado Montenegro, os jovens agradecem o apoio que o governo deu e que originou novos aumentos nos preços das casas - e eu falava no dogma dos neoliberais que acreditam na intervenção divina da mão invisível e que "o mercado auto-regula-se".
Ao que ela responde com esta brilhante frase:
"O mercado auto-regula-se. A cada dez anos há uma crise financeira para regularizar tudo!"
Há um ano, era António Costa primeiro-ministro e, para o PSD, era o "pior primeiro-ministro de sempre". Espalhavam-se cartazes por aí que afirmavam que o "socialismo empobrece", como se o Partido (que no nome tem) Socialista alguma vez tivesse sido socialista ou, como se o próprio PSD não fosse, na sua criação, um partido assumidamente de esquerda (social democracia?) e que Sá Carneiro quis que aderisse à Internacional Socialista. Mas só num tempo em que moda todos parecerem ser de esquerda.
Entretanto acontece o golpe de Estado de 7 de Novembro, há eleições legislativas este ano e a coligação da AD, aquela que tem um partido que defende o espancamento de mulheres vence as eleições com menos de 30% dos votos.
E, de repente, como que por magia, António Costa, o tal "pior primeiro-ministro de sempre" passa a ser a pessoa mais competente do mundo para liderar os destinos europeus e, estranhamento ou, talvez não, o tal partido que, aos olhos do PSD empobrecia o país, é o partido ideal para negociar a aprovação do Orçamento do Estado.
Podem espalhar cartazes por aí: a falta de vergonha na cara empobrece.