sábado, 6 de outubro de 2018

De que Serve Tanto Dinheiro aos Ricos?

A meu ver, os homens extraordinariamente ricos, são maníacos, enfermos, psicopatas. Em suma, sejamos  francos: para que serve todo esse dinheiro aos ricos? 

Eles têm no máximo vinte, trinta anos de vida, 7300 ou 10950 dias. De que lhes vale uma coleção de automóveis, se não há possibilidade de utilizar senão um de cada vez? Por muito que possua, ninguém poderá fazer mais de três a quatro refeições diárias; não ocupará mais de uma poltrona nem viajará melhor do que em primeira classe. Por mais que se use a roupa esta não durará menos de uma estação. De cinquenta pares de sapatos, escolhe-se afinal sempre o mesmo par, o que não magoa os pés. Os livros zelosamente guardados, adquiridos aos metros para encher a estante e que o dono jamais emprestaria a um rapaz inteligente, nunca serão lidos, para não estragar a encadernação preciosa. As adegas transbordantes de vinhos caros, tornam-se inúteis , porque o médico de luxo, forçado a dizer alguma coisa para justificar o preço da consulta, recomenda a abstenção das bebidas.

O colecionador hipertrófico de dinheiro acaba colhendo desprezo e ingratidão. Julga-se rodeado de amigos e está entre comparsas, remunerados como coristas de melodrama. Quanto mais se ilude de atrair os homens, tanto mais se vê isolado de si mesmo. 

Certo dia, um rico avarento foi pedir conselho e ensinamentos a um rabino. Este conduziu-o a uma janela e disse-lhe:



- Olha para esta vidraça e diz-me o que vês.
- Vejo muita gente - respondeu o ricaço.
O rabino levou-o então a um espelho e perguntou:
- Que estás vendo agora?
- Vejo-me a mim próprio.
- Muito bem, irmão. A janela e o espelho são ambos de vidro. Mas o vidro do espelho reveste-se duma ténue camada de prata. Entrando de permeio um pouco de prata, deixamos de ver os outros e só nos vemos a nós próprios. 

A camada de prata! A barreira de prata ou de ouro é que leva o operário, o artista, o boémio, o refratário, o irregular, o não-conformista, a repartir com o pobre a sua última nota de cem, ao passo que o multimiliioário, a sociedade anónima, a alta finança afrontam o tribunal, o ridículo, para negar os cinco contos que devem sacrossantamente ou para obrigar outrem a pagar os dez tostões em dívida. 

"O sexo dos Anjos" / Pitigrilli / 1952

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