segunda-feira, 7 de julho de 2025

O Evangelho da Prosperidade

 


"Nascida no estado do Mississippi, Paula White, de 59 anos, passou, em fevereiro de 2025, de conselheira espiritual de Trump a diretora do recém-criado Gabinete da Fé da Casa Branca. Se o cargo em si já foi contestado por roçar a confessionalidade, a sua ocupante tem recebido críticas até de círculos conservadores próximos de Trump, onde chegou a ouvir-se a acusação de “heresia”. Porquê? Porque, apesar do aparente absurdo das suas tiradas, White enriqueceu - em seguidores e em dinheiro - como pregadora estrela de uma corrente cujos postulados vão longe demais até para os mais dispostos a pôr a fé ao serviço de Trump. É o chamado “Evangelho da Prosperidade”, que White prega a partir de uma megaigreja em Apopka, Florida, segundo o qual a religiosidade está ligada ao sucesso económico. Literalmente. “O dinheiro segue o teu sistema de valores”, afirma White em podcasts, programas televisivos e livros como Money Matters (...)




Embora, em jovem, Trump não fosse conhecido por frequentar outro templo que não fosse a discoteca Studio 54, como político esforçou-se por apresentar-se como presbiteriano. Não que se gabe de uma biografia piedosa, nem finja conhecer as Escrituras. Nem precisa. Como explica a historiadora norte-americana Kristin Du Mez em Jesus and John Wayne (Capitán Swing, 2022), o seu apelo junto do eleitorado cristão não se deve ao seu virtuosismo, mas — pelo contrário — à sua encarnação de uma masculinidade autoritária enraizada no imaginário evangélico.

Com a nomeação de White, o papa da extrema-direita internacional fez um aceno a uma visão muito particular do cristianismo, que, no plano pessoal, é excelente para conferir um verniz sagrado à própria fortuna - mesmo que esta deva mais ao pai do que à providência -, mas que, num plano mais geral, também é coerente com a aversão neoliberal à redistribuição da riqueza. Se é Deus quem decide quem é rico ou pobre, o que pode o Estado fazer quanto a isso?

Contra o cristianismo “original”

Atento a tudo o que se passa no pensamento cristão, o teólogo espanhol Juan José Tamayo já tinha identificado a também chamada “Teologia da Prosperidade” como um dos pilares da ofensiva da extrema-direita religiosa, à qual dedicou A Internacional do Ódio (Icaria, 2020). Segundo este credo em ascensão, observava o autor, se os cristãos não são ricos, “é porque vivem em pecado”. O Evangelho da Prosperidade tornou-se, sobretudo nos Estados Unidos mas também na América Latina, numa das expressões mais cruas da “aliança entre o neoliberalismo económico, o ultraconservadorismo político e o fundamentalismo religioso”, que “está a roubar ao cristianismo a sua mensagem original”, explica agora Tamayo, que acaba de publicar um novo ensaio, Cristianismo Radical (Trotta, 2025), onde propõe uma contraposição teológica ao “cristoneofascismo”.

Desde os EUA, Kristin Du Mez, autora do já citado Jesus and John Wayne, afirma que esta doutrina singular “permeou” o cristianismo americano para além do círculo de pregadores mediáticos. “A ideia de que Deus abençoa os bons cristãos com sucesso material está bastante difundida. Muitas vezes anda de mãos dadas com a oposição a qualquer tipo de ajuda governamental aos pobres, considerados indignos e culpados da sua pobreza”, explica a historiadora. E acrescenta: “Esta mensagem contradiz os ensinamentos cristãos tradicionais sobre a bênção de Deus aos pobres e a ideia de que é mais difícil a um rico entrar no Reino dos Céus do que a um camelo passar pelo buraco de uma agulha.

EL PAÍS – 6 jul. 2025 – Por Ángel Munárriz