domingo, 24 de agosto de 2025

O Nosso Amor Nunca Morrerá

 

"Acordado ao amanhecer 
Membros entrelaçados 
O cheiro de fumo 
E o ar do verão 
Os nossos pulmões partilham 
O primeiro fôlego 
E o suspiro “O nosso amor nunca morrerá”

Disgraced - Cairiss (2016)

Outrovertido ou Antissocial Sociável

Sempre me considerei um antissocial sociável. É estranho porque não sou introvertido, bem pelo contrário! mas depois não gosto nem um pouco de festas e ajuntamentos ou até de muito barulho. 

Não sou propriamente envergonhado, sou até muito sociável e tomo a iniciativa. Sempre me achei um pouco estanho, mas, afinal, parece que há muitos outros por aí, tal como eu e agora até lhe arranjaram um nome, porque há uma necessidade muito grande de meter as pessoas dentro de gavetas.

O artigo é do The Guardian "Don’t like joining in? Why it could be your superpower" publicado hoje e a propósito também do livro "The Gift of Non Belonging" do psiquiatra Rami Kaminski.

Este texto também me lembrou de uma pessoa que chegou a dizer-me, quando eu me queixava que estava sozinho, que se sentia sozinha no meio da multidão. 

"Não consigo explicar. Ele é um doce. Um rapaz lindo, por dentro e por fora, e tão brilhante.” Foi assim que começou, há alguns anos, uma sessão com N, uma paciente minha de longa data. O filho dela, A, era um adolescente, e apesar de vir de uma família calorosa, amorosa e com pais atentos, tinha começado a ter dificuldades sociais.

Ele não estava a ser vítima de bullying, nem era excluído na escola. Não estava deprimido, mal-humorado ou ansioso. Na verdade, era popular, querido e estava constantemente a ser convidado para festas, jogos de basquetebol e convívios com grupos de jovens. O problema era que recusava todos esses convites – e N não percebia porquê.

Três semanas depois, sentei-me com A no meu consultório. Pedi-lhe que descrevesse a experiência de ir a festas e outros eventos sociais. “Sinto-me estranho”, disse ele, “como se não fizesse parte daquilo, o que é esquisito porque são todos meus amigos. Sei que gostam de mim e que ficam contentes por eu estar lá, mas continuo a não me sentir ligado. Só me sinto sozinho ou aborrecido quando estou com muita gente, e não quando estou com um ou dois amigos próximos ou quando estou sozinho.” Depois acrescentou: “Não gosto de dizer estas coisas porque faz-me soar como um extraterrestre. Acha que há algo de errado comigo?”

Não achava. Nos meus mais de 40 anos como médico e psiquiatra, trabalhei com líderes mundiais, artistas e profissionais no topo das suas áreas. Muitas vezes, surgia a mesma descrição de vida que A me dera.

São pessoas que preferem sempre jantar a sós com um amigo a participar num jantar de grupo. Quando têm de estar em grandes reuniões, ficam de lado, em conversa profunda com uma pessoa, em vez de “andar a circular”. Preferem fazer trabalhos individualmente do que em grupo, detestam desportos colectivos e acham as tradições e rituais da vida comunitária – festas de empresa, cerimónias de graduação, até feriados religiosos – difíceis ou até desconcertantes. São solistas incapazes de tocar numa orquestra. E eu conto-me entre eles.

A grande maioria destas pessoas não tem diagnóstico psiquiátrico. Não são socialmente desajustados, nem socialmente ansiosos. Depois de muitos anos a observar e a investigar estas características, compreendi que estão enraizadas num traço presente em pessoas de todas as etnias, culturas e géneros: a ausência de impulso comunitário – em outras palavras, o não-pertencimento.

Ao começar a escrever sobre isto, procurei uma palavra que descrevesse este tipo de personalidade tão mal compreendido. A maioria conhece os conceitos de Carl Jung: extrovertido (“virado para fora”) e introvertido (“virado para dentro”). Mas a orientação fundamental do não-pertencente define-se pelo facto de raramente estar na mesma direcção que os outros. Assim nasceu o termo “otrovert” (em espanhol, otro significa “outro”).

Muitos otroverts passaram a vida a assumir que a falta de interesse por festas e outras actividades sociais significava que eram introvertidos. Mas diferem destes em vários pontos essenciais: enquanto os introvertidos tendem a ser reservados e calados, os otroverts, como o meu paciente A, podem ser muito sociáveis e expansivos. Um introvertido dificilmente seria a primeira pessoa a intervir de forma assertiva numa reunião de trabalho. Já um otrovert fá-lo sem problema. Ao contrário dos introvertidos, que ficam exaustos depois de horas de conversa com um amigo, os otroverts ganham energia com essas conversas profundas. Gostam de tempo a sós, mas não para recarregar baterias: sim, para evitar a solidão e desconexão que sentem quando estão rodeados de muita gente.

Para os pais, crianças como A são frequentemente fonte de preocupação. Como a maioria foi educada para ver a pertença a um grupo como pilar de uma vida bem-sucedida, muitos pressionam os filhos a serem mais “sociais”. Na escola, onde os professores são treinados para identificar alunos “mal-adaptados socialmente”, uma criança que não se junta aos colegas no recreio pode motivar chamadas para casa, consultas com psicólogos ou mesmo terapia.

A nossa cultura valoriza imenso o “participar”. Desde cedo aprendemos a partilhar, a brincar bem com os outros e a alinhar o nosso comportamento com o dos que nos rodeiam. Quando outros fazem fila, somos ensinados a ficar nela. Quando falam baixo, somos ensinados a baixar a voz. Ao longo da vida, este condicionamento social reforça um princípio cultural imutável: a pertença a um grupo é requisito para uma vida rica e plena. Para muitos, isto é verdade – mas não para os otroverts.

Damos tanto valor à comunhão que uma postura diferente é entendida como patologia. Otroverts são vistos como estranhos ou errados por preferirem a solidão ao convívio, e sofrem pressão de colegas bem-intencionados que querem a sua companhia ou temem que “percam” a diversão. O que não percebem é que, para os otroverts, há grande liberdade e realização em ficar à margem.

Com esta consciência, podemos permitir-nos recusar o que nos causa desconforto e abraçar quem realmente somos.

Nos últimos anos, tem-se falado muito sobre os níveis recorde de solidão, alienação e polarização da sociedade. Políticos, pensadores e até o cirurgião-geral dos EUA apontam o declínio da vida comunitária como causa principal de problemas de saúde mental, sugerindo soluções como sair das redes sociais ou reforçar as redes de apoio social. Em teoria, são ideias válidas. Na prática, falamos cada vez mais da importância da comunidade, enquanto nos tornamos mais solitários e divididos do que nunca.

Os otroverts não só estão preparados para prosperar neste mundo fragmentado e zangado, como também podem mostrar o caminho aos outros. A razão é simples: vêem as pessoas como indivíduos, não como membros anónimos de um grupo. É fácil odiar um colectivo abstracto que nos ensinam a ver como diferente, inferior ou ameaçador. É muito mais difícil generalizar a hostilidade quando olhamos para as pessoas como realmente são.

Porque não se sentem obrigados a alinhar com a posição ou opinião colectiva, os otroverts são independentes, criativos e pensadores “fora da caixa”. Abordam os problemas de ângulos novos, chegando muitas vezes a descobertas originais e contributos únicos. Como definem o sucesso pelo que alcançam, e não em comparação com outros, são também mais realizados criativa e profissionalmente.

Para um otrovert, aceitar a frase feita “Está tudo bem em seres tu mesmo” representa uma mudança monumental. Muitos viveram a vida toda a sentir-se incompreendidos. Quando finalmente percebem que não há nada de errado em serem como são, é uma catarse profunda.

Com esta compreensão, podemos dar-nos permissão para recusar o que nos incomoda, criar relações ainda mais fortes e autênticas com os que nos são próximos, e abraçar quem realmente somos. Descobrimos então aquilo que Friedrich Nietzsche, o otrovert por excelência, escreveu: “Ninguém pode construir por ti a ponte sobre a qual terás de atravessar o rio da vida, ninguém a não ser tu, tu mesmo.”

Hoje, A floresceu verdadeiramente. Com 24 anos, está a fazer doutoramento em psicologia, ficou recentemente noivo da namorada da universidade e mantém-se próximo dos amigos de infância. De certa forma, continuará sempre a ser observador de grupo e não participante pleno. Mas é participante total da sua própria vida: profundamente satisfeito com o que escolhe fazer e com quem escolhe estar. Num mundo feito para os que aderem, este é o caminho ideal do otrovert.

Dr. Rami Kaminski é psiquiatra e autor de The Gift of Not Belonging

O Mister

 Tinha comentado com os colegas que se iria realizar aqui no Porto um curso de treinador, numa de ver se alguém se juntava a mim e aproveitar esta oportunidade de fazer a formação aqui ao pé de casa, porque os sítios vão variando de ano para ano. Eu até já tinha feito o curso de árbitro em 2019, ainda que nunca tivesse exercido, porque não tenho vida para isso, para trabalhar toda uma semana, chegar cansado ao fim de semana e, depois, passar o fim de semana a arbitrar em torneios, ou ter mesmo que arbitrar mesmo durante a semana.  

O tempo foi passando e ninguém demonstrou interesse, mas, por insistência de um colega, que achava que seria uma boa oportunidade, lá acabei por me inscrever e pagar os 150€ do meu bolso, mas sem saber muito bem naquilo que me ia meter e o que iria implicar. 


O intuito nunca foi ter uma certificação para ser de facto treinador, até porque o ténis-de-mesa é uma modalidade tão técnica, que é preciso saber para depois se mostrar como se executa com os gestos corretos. Ou seja, é preciso ser bom praticante para melhor se ensinar, bem diferente, por exemplo, do futebol, em que não é preciso saber dar um chuto numa bola, nem sequer é preciso ter sido jogador de futebol para poder vir a ser um bom treinador de futebol. O meu intuito foi sim aprender, para por um lado tentar como é óbvio poder ajudar os colegas do clube a evoluir um pouco mais tecnicamente, mas também para estar por dentro dos meandros da modalidade. 

Em breve fui contactado e fiquei a saber que a parte teórica seria ministrada em três fim-de-semana, quatro horas à sexta-feira depois de oito horas de trabalho, e sábados e domingos o dia todo. Mas pronto, era um pequeno esforço que tinha de ser feito. Paralelamente teria também que assistir a quatro treinos das seleções nacionais jovens, algo que fiz logo num dos primeiros fim de semana do início da época desportiva. 

E seguiu-se o estágio, duas horas e meia por semana em contexto de clube, mais os quatro relatórios que teria que fazer e entregar para poder concluir o curso. E não deixa de ser curioso como as coisas mudam. Há seis anos estava na bancada a ver uma atleta do clube sagrar-se campeã nacional, agora, um atleta que vem do lazer e nunca sequer foi federado estava ali, a fazer o curso de treinador.

Chamemos turma ao grupo de onze ou doze inscritos que, vindos de todas as partes do país, incluindo as meninas da ilha do Pico que tinham de apanhar dois ou três aviões para chegar até ao Porto, ou o venezuelano sempre bem disposto e com muito apetite, que vinha da ilha da Madeira. Ao contrário de mim, todos eles já eram treinadores, simplesmente não tinham a certificação. O Hermenegildo, que até tinha uma fotografia com o Ma Long no telemóvel (o equivalente ao Maradona do ténis-de-mesa) até já tinha curso, mas creio que o IPDJ não validou o certificado angolano.

Ao contrário do ano anterior, em que o grupo de inscritos era bem superior, um grupo mais pequeno permitiu aos formadores proporcionar um acompanhamento mais próximo e por outro lado cria também maiores laços de proximidade entre os alunos. 

Eu era o mais velho da turma e sempre tive consciência das minhas limitações técnicas, quando me comparava com os restantes colegas, todos bem mais evoluídos. E no estágio também senti esse desconforto. Eu estava num clube que está há quinze anos na primeira divisão, e eu era um matreco que não sabia fazer um top spin de esquerda! E não ratas vezes tinha ali ao lado um atleta que ainda há não muito tempo andava na seleção principal!

Outro desafio que iria enfrentar no estágio eram as crianças. Eu não tinha qualquer experiência com crianças, porque não lido com elas (excluindo as crianças adultas). Não tenho filhos, nem sobrinhos ou afilhados. Acho que sempre tratei as crianças como adultos. Ora um treinador de grau I está orientado para a iniciação e, por conseguinte, formação de crianças ou iniciação. E essa também foi uma experiência social que tive. 

Ser professor deve ser fascinante porque todas as crianças são diferentes (e darão origem a adultos todos diferentes). Durante este ano que passou estive com cerca de uma dúzia de crianças, entre os cinco e treze anos, com maior número de rapazes mas também com meninas. Vi de tudo. Crianças extremamente focadas (mais as meninas) e crianças sempre cansadas e que se aborrecem facilmente e outras até bastante preguiçosas (meninos). Uma até muito instável e do nada parece começar a querer chorar. Ou outro, que a tutora logo me preveniu, "fica atento e não o deixes fazer o que quer". Mas também não durou muito lá, afinal, um clube não é uma escola pública e tem as suas regras e até interesses. 

"Tu também queres tudo."

Este não foi um ano fácil. Bem pelo contrário, foi mesmo dos piores anos da minha vida, mas, ainda aqui estou. Inscrevi-me no curso em final de maio ou junho do ano passado, dois ou três meses depois da minha mãe começar a adoecer. Todas as segundas-feiras fui para o estágio e, a partir de março deste ano, quando foi internada no IPO, era mesmo o único dia que não a visitava, porque saía as cinco da tarde do trabalho e às cinco e meia tinha de estar no estágio até às 8h da noite. E eu sei que a minha mãe tem razão, eu meto-me em demasiadas coisas ao mesmo tempo e não paro. Só faltei mesmo ao estágio nas duas últimas semanas, em que até tirei "férias", férias essas que não terei este ano, porque tirei simplesmente os dias para aproveitar ao máximo todo o tempo possível para estar juntinho dela, até ao fim.

O importante para mim foi a aprendizagem, as conversas com os colegas, estar por dentro, entender o que é a modalidade, que além de desporto também é negócio, como em tudo nesta sociedade. Ter também tido a oportunidade de ter estado com dois atletas da seleção e ouvi-los falar da sua experiência. E, claro, no estágio, ter podido passar muitos meses, sendo orientado e poder dar treino às crianças, e poder agora de forma autónoma poder fazê-lo na coletividade onde promovo a modalidade e, como provavelmente iremos para o federado, não precisamos agora de arranjar alguém que assine como treinador, eu mesmo o farei. 

Isso foi definitivamente o mais importante porque, no fundo, não preciso de diploma nenhum porque eu não irei fazer carreira como treinador. Mas meti-me nelas, queria concretizá-las e, mais importante, não queria agora sentir-me culpado, por ter andado a perder tempo com uma formação, quando poderia ter aproveitado mais um pouco a estar ao lado da minha mãe. Está feito, junto ao curso de árbitro o curso de treinador. 

sexta-feira, 22 de agosto de 2025

A Fome e a Miséria em Portugal na Ditadura Fascista de Salazar

Depois das memórias de Henrique Galvão e Camilo Mortágua, eis que terminei agora as memórias de Humberto Delgado, candidato presidencial em 1958, e que afirmou "obviamente demiti-lo-ei" referindo-se a Salazar e, posteriormente, assassinado pela PIDE em 1965. 

Bastante revelador o estado de pobreza do país, após várias décadas de ditadura fascista do governo de Salazar. para ler e refletir. 


"De alto a baixo, Portugal é um país de pobres, que pedem pão, ou trabalho, ou protecção, e isto inclui, não só os pedintes sem um tostão de seu, mas também o futuro professor que jamais terá o seu lugar se a P.I.D.E. se opuser à sua nomeação, o comerciante que tem de pertencer ao Grémio apropriado se quiser vender alguma coisa e que fracassa com certeza se houver a mínima presunção de que partilha opiniões políticas pouco recomendáveis, e até mesmo o médico que precisa de se treinar nos hospitais civis e que corre o risco de ser reprovado se não pertencer à «ordem estabelecida».

A situação foi analisada há pouco tempo em «The Reporter», nos Estados Unidos. E o artigo concluía: «Qualquer português só pode exercer a sua profissão, seja ela qual for, desde que esteja sujeito ao poder político do Estado», o que não é mais do que outra forma de apresentar o que o próprio ditador disse a um amigo meu: «Serão simplesmente aquilo que queremos que sejam».

Típico desta maneira de ver é o exemplo de Aquilino Ribeiro, o grande escritor, que, aos setenta anos, foi perseguido pela polícia, só porque no seu livro «Quando os Lobos Uivam» critica a sociedade criada por Salazar e sublinha a estupidez e malefícios do sistema totalitário.

MISÉRIA EM PORTUGAL 

Quando se estuda o mecanismo humano, é conveniente começar pela substância que o faz trabalhar. O Português subsiste com uma média de cerca de 700 calorias por pessoa, menos do que o mínimo fixado pela F.A.O. Mas como poderia ser de outra forma, com os salários miseravelmente baixos e a notória desigualdade na distribuição da riqueza, que concede ao trabalhador rural no Alentejo 16 escudos por dia, para os poucos dias da semana em que consegue arranjar trabalho?

(,,,)

Quando, entretanto, em 1958, a minha campanha eleitoral me levou ao Alentejo, mulheres a chorar agarravam-se a mim dizendo-me que no Inverno anterior tinham recebido 8 escudos por dia e, mesmo assim, só durante parte da semana. Podia-se ver a verdade das suas palavras nas crianças que me rodeavam, pele e osso, com grandes olhos tristes que obrigariam qualquer pessoa, inevitavelmente, a dar-lhes um pedaço de côdea.

(...)

A minha secretária Brasileira, Sra. Arajarŷr Campos, disse-me um dia que tivera uma jovem criada Portuguesa, à qual ouviu dizer que em Portugal jamais comera carne, e que, só agora, na casa da sua patroa, podia finalmente comer uns bifes.

Esta esfomeada rapariga tocara num ponto muito importante, pois o consumo anual de carne em Portugal é, efectivamente, de 15 quilos por pessoa, contra 69 quilos nos Estados Unidos, 61 na Inglaterra, 43 na Alemanha Ocidental. Quanto ao leite, o Português bebe 1 litro por mês, em contraste com 20 a 40 litros nos países menos atrasados.

Tudo isto prova que as proteínas fundamentais são um luxo para as classes pobres e médias. Basta olhar para as populações rurais, para se ver como, em pouco tempo, se tornam num simples saco de ossos; as mulheres, entre os quarenta e os cinquenta anos, envelhecem precocemente, e os homens começam a ficar curvados e com as pernas arqueadas, perdendo ambos os sexos, muito cedo, os dentes. A carência de vitaminas origina magreza, ou pelo excesso de carbo-hidratos, obesidade doentia.

Acertadamente, embora com dolorosa acuidade, o consumo de proteínas em Portugal foi assim descrito: «Um pequeno copo de leite por dia, um bife por semana, três ovos por mês, uma galinha por ano». Considerando que muita gente come três ovos por dia e uma quantidade proporcional de outros alimentos, não é de surpreender que, tal como constatei, haja muitas pessoas, tanto nos meios rurais como na cidade, que nunca comem tais alimentos, excepto em dias de festa. No campo, não comem ovos nem galinhas, pois que, mal dando o seu rendimento para se alimentarem, só vendendo estes pequenos extras conseguem comprar alguma coisa para além das necessidades básicas.

Contudo, o trabalhador Português gasta 67 a 87% do seu rendimento na alimentação, e, por consequência, vive pouco melhor do que um animal. Se fizermos uma comparação com um país semi-socializado do tipo democrático-progressivo, como a Suécia, constatamos que somente 31% do orçamento familiar são consagrados à alimentação. Se tomarmos a França como exemplo, o mais politicamente amadurecido e socialmente progressivo dos países latinos, constatamos que 49% do rendimento é consagrado ao mesmo fim.

SALÁRIOS

Um salário só pode ser avaliado com relação ao seu poder de compra. Assim me recordo claramente das lições de estatística que segui, há mais de cinco anos, quando me matriculei na Universidade Americana de Washington, muito embora não passasse de um curioso, interessado somente em aprender um pouco mais acerca de economia. Um trabalhador americano trabalhava cinquenta horas para comprar uma camisa de algodão, um fato e um par de sapatos, enquanto um trabalhador russo precisava de cinco vezes mais para adquirir as mesmas coisas. Isto diz-nos mais do que qualquer declaração em rublos ou em dólares, que falharia certamente, ao darmos qualquer informação acerca do respectivo poder de compra.

Uma análise similar da situação em Portugal dá-nos resultados alarmantes. É difícil calcular o salário do trabalhador rural, porque é geral o desemprego, mas ascende provavelmente a dois terços da média do trabalhador na indústria, que é de cerca de 24 escudos. Uma comparação do rendimento deste último mostra que, para comprar um quilo de carne, ele tem de trabalhar quase um dia inteiro (6 a 7 horas) em contraste com hora e meia na Inglaterra. Quanto ao leite, um inglês só precisa de trabalhar um quarto de hora para comprar um litro, enquanto o trabalhador Português, que, de qualquer forma, nunca bebe leite, teria de trabalhar quatro vezes mais. Um quilo de batatas, um dos ingredientes do «cavalo verde», dieta típica dos habitantes subalimentados do norte, requer quase uma hora do tempo do trabalhador Português, contra cinco minutos na América. Que pode ele fazer se tiver uma família a alimentar, especialmente porque um quilo de pão, alimento básico em Portugal, não custa menos do que uma hora de salário?

Isto prova que o nível nutritivo do Português é equivalente ao de um Tunisiano ou de um Congolês, como acentua o «New Scientist» de 21 de Julho de 1960. Os salários portugueses, que desceram cerca de um terço entre 1938 e 1958, só podem comprar fome, e por isso, na falta de pão, os únicos luxos possíveis são os equivalentes Salazaristas do circo Romano - futebol, fado e Fátima. (O fado é uma canção nacional melancólica e Fátima é uma localidade onde se supõe que tenha aparecido Nossa Senhora em 1917).

O PROBLEMA DA SAÚDE

Na verdade, o Português nasce em circunstâncias pouco usuais, dado que em muitas aldeias jamais se ouviu falar de parteiras ou de médicos e 50% das mães dão à luz sem assistência.

A taxa de mortalidade durante o primeiro ano de vida é de 88 por mil, contra uma média de 50 por mil em 102 países. Durante o reinado de Salazar a posição com relação à Checoslováquia, Japão e Singapura, por muito estranho que pareça, foi invertida, pois, em 1925, era o dobro da de Portugal enquanto agora é precisamente o contrário («W.H.O.», Relatório das Estatísticas Vitais e Epidemiológicas).

Mesmo que o Português não morra no berço, é-lhe quase impossível conseguir cuidados médicos, uma vez que tem de escolher entre comer e receber tratamento; este é muitas vezes demasiado caro, não deixando outra alternativa além da morte. Em Portugal há apenas 1 médico por cada 1 400 habitantes, contra 1 por 800 na Itália; similarmente, existe uma enfermeira por 3 000 habitantes, contra 1 por 500 nas democracias ocidentais. As consequências são inevitáveis e significam que 58 pessoas em cada 1 000 morrem de tuberculose, contra 5 por 1 000 na Holanda, e que, por cada criança que morre de tosse convulsa na Inglaterra, morrem quatro em Portugal, enquanto a percentagem de sarampo nestes dois países é de 1 para 9.

HABILITAÇÃO E ASSISTÊNCIA PÚBLICA

Suponhamos que um Português consegue sobreviver a tudo isto e que pretende comprar uma casa, para casar. O último recenseamento mostra que, num total de 2 047 398 famílias, 2 592 não tinham acomodações, 10 596 viviam em casas temporárias, 2 583 em habitações impróprias, 193 221 em partes de casa. Dos factos que me foram fornecidos por pessoas que vivem no país, posso assegurar que estas estatísticas oficiais ficam muito aquém da verdade.

Não se pode ler à luz de uma lâmpada nem ouvir o rádio, porque, tal como descobri quando passei um Verão em Cela, não há electricidade, apesar das promessas feitas há uns doze anos. Quando finalmente ia ser instalada, visitei a localidade na minha qualidade de candidato à Presidência, e então o Presidente da Câmara de Alcobaça, sob cuja jurisdição se encontra aquela povoação, informou os pobres desgraçados que ali viviam de que, ao fazerem-me um tão entusiástico acolhimento, tinham perdido o direito àquele luxo. Em 1953, só 1 251 das 3 374 freguesias de Portugal, possuíam electricidade, e, ainda assim, 484 já a tinham em 1935, o que implica portanto um singelo aumento de 42 freguesias por ano.

Quando chega a velho e já não pode trabalhar, o Português sem meios pessoais tem de depender dos filhos, ou, como acontece na maioria dos casos, acaba por viver da caridade, porque a assistência pública e as pensões de velhice só raramente são mais do que simples benefícios teóricos.

A situação respeitante à assistência nacional Portuguesa mostra até que ponto o país precisa de sangue novo e de novas ideias. O Estado, muito embora pague muito menos, tira muito mais ao empregado e ao patrão do que em qualquer outro país Europeu; dos 7% ao empregado e 18% ao patrão, 25% cabe ao Socorro Social, contra 5,3% na Inglaterra, 18,66% na Alemanha e 18% na Espanha.

(...)

Não admira, pois, que, no período 1948/53, a esperança de vida média do Português fosse de 49 anos, contra 71 na Suécia, 69 na Holanda e 68 na Inglaterra.

RENDIMENTO NACIONAL

Depois de apreciar o aspecto individual, gostaria de me dedicar à situação mais geral. O trabalhador não tem direitos. O sindicato não passa de uma pequena engrenagem na roda totalitária. O trabalhador não pode estabelecer qualquer opção e mal se atreve a expor as suas opiniões, não sendo pois de surpreender que somente 40% da produção industrial seja consagrada ao pagamento de salários, deixando os outros 60% para lucros de capital, em contraste com os respectivos 70% e 30% dos países democráticos mais avançados. Em Portugal não existem Keynes nem Marx.

Não é igualmente de espantar que, por causa desta medieval estagnação, o rendimento do país per capita não ultrapasse os 182 dólares, contra 1 453 dólares nos Estados Unidos, 342 na Argentina, 209 na Turquia, e isto apesar da sua grande fonte de matérias-primas nas colónias, as quais são, pelo menos, 23 vezes mais importantes do que as da mãe-pátria.

O Regime de Salazar descrito por Henrique Galvão

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

O Livro é Uma Arma de Defesa

Excerto  da entrevista do Jornal de Negócios ao escritor brasileiros Jefferson Tenório, publicada no dia 1 de agosto de 2025


Contou numa conversa literária que ter um livro na mão quando ia na rua o livrou várias vezes de abordagens policiais mais violentas. Tornou-se uma espécie de escudo?

Com 17 anos eu comecei a sair à noite com os meus amigos. E, sendo um jovem da periferia, as abordagens policiais começaram a ficar mais frequentes. Percebi que quando carregava um livro era dispensado da abordagem ou recebia uma abordagem menos violenta. Era como se o livro me protegesse e mostrasse para aqueles policiais que eu era uma pessoa de bem, não era uma pessoa perigosa. Então, passei a andar com um livro para todo o lado.

Essas abordagens tinham a ver com a cor da sua pele?

Eram pelo facto de ser jovem e negro. Aconteceu estar num grupo com três amigos, sendo que um deles era branco e foi o único que não foi revistado. Estamos a falar de uma realidade quotidiana no Brasil. Se eu ficar parado numa esquina durante 30 minutos, provavelmente vai parar um carro da polícia e vai-me revistar. Ainda hoje. Vão perguntar o que eu estou fazendo ali, para onde vou. O que não aconteceria com uma pessoa branca.

Há um racismo estrutural no Brasil?

Não é assumido. Mas há um racismo estrutural que entrou no inconsciente das pessoas. É como se fosse uma espécie de vírus que se instalou no inconsciente coletivo social e que enxerga pessoas negras como pessoas perigosas. Isso já vem de muitos séculos.

O racismo tem-se sofisticado, tem encontrado novas formas de exercer a sua violência nas pessoas.

terça-feira, 12 de agosto de 2025

É Como se os Pais Não Morressem

 


"Não fiques triste. Olha que eu acredito que os pais ficam nos filhos. É como se os pais não morressem. Porque tiveram filhos. Percebes?"

Mal Viver - João Canijo 

segunda-feira, 11 de agosto de 2025

Facilidade na Expressão Escrita

Depois de um monte de fichas, bastante elogiosas, mas em que não se dá grandes detalhes, nesta lê-se que sou "muito nervoso" e que "penso precipitadamente". Por outro lado tenho muita facilidade na expressão escrita, sobretudo nas composições.

3a classe |  1984 

sábado, 9 de agosto de 2025

Anda um Cheiro Nauseabundo no Ar...

 ... um forte cheiro a Troika. A ADEGA - PSD - CDS - CH - travestiu-se de nova Troika.

Ontem, o Tribunal Constitucional decretou que a lei dos estrangeiros que o governo do Luís queria fazer é inconstitucional (como se fosse preciso ser jurista para o saber), mas, o senhor Marcelo, que foi professor de direito constitucional, não quis vetar para assumir a responsabilidade e preferiu esperar e enviar para o Tribunal Constitucional. 

Logo de imediato os fascistas estrebucharam, até me fizeram lembrar o Passos Coelho a barafustar que era preciso escolher melhor os juízes do Constitucional! Passos Coelho, o Grande, que prometia em campanha eleitoral acabar com a austeridade e que a oposição mentia quando afirmava que ele se preparava para aumentar os impostos e cortar salários, o grande primeiro-ministro que reclamava contra a dívida e que, no final do seu mandato, deixou ainda mais país para o país o pagar!




Mas voltemos à ADEGA. Mal o Tribunal Constitucional decretou insconstitucional, Montenegro e André Ventura espumarem pela boca disseram que, apesar do veto, vão persistir na mentira, porque é de uma mentira que se trata, não há nenhum aumento com pedidos de nacionalidade, tal como não há mulheres a cometer fraudes durante o período de amamentação. São mentiras para aplicar a sua cartilha e fazer regressar o país aos tempos da Troika de Passos Coelho.



Anda um cheirinho a fascistas no ar. Ataques às mulheres, aos trabalhadores, aos estrangeiros precários (que os ricos, os unicórnios e esses são bem-vindos), deixar as pessoas morrer ao desmazelo e o SNS a definhar cada vez mais e nem sequer ter aviões tinham preparados para combater os incêndios. 

Há 14 anos a crise económica mundial e a vinda do FMI foi a desculpa perfeita. Só que desta herdaram, pela primeira em democracia, um superavit e, um ano depois, já estão, de novo, a atacar os mais pobres, os trabalhadores, e as mulheres, com uma cartilha completamente reacionária.  

Só no último mês:





















quarta-feira, 6 de agosto de 2025

Alter Ego


No velório, uma prima perguntou:
- Não vais pôr no Facebook que a tua mãe morreu?

Hoje, a mesma pergunta:
"Tu colocaste nas redes sociais que a tua mão morreu?"
Não, até porque eu não tenho redes sociais. 
Quem tem redes sociais é o Königvs.  

segunda-feira, 4 de agosto de 2025

Ser Pobre Não é Crime...

Ser Pobre Não é Crime e o Rendimento Mínimo foi a Melhor Coisa que se Fez  em Portugal nos Últimos Trinta Anos


No tasco que serve presunto com mão - sim, não me enganei, devem ser uns três centímetros de presunto fatiado fininho, com pão - fiquei a saber que, apesar de no ano passado quase todo o concelho ter ardido,  andava a arder novamente aqui na união de freguesias, mas não propriamente aqui na minha aldeia. 

E é curioso que foi preciso, no dia anterior ter ido treinar, para ficar a saber que por lá andava a arder, primeiro porque vi o monte a arder, e depois o colega que ia treinar, escrever no grupo do Whatsapp, que não ia treinar porque tinha ficado de prevenção. 

E no dia seguinte, enquanto almoçava no tasco, fiquei a saber, porque na televisão mostrava o incêndios entre Penafiel e Gondomar. 

De imediato a simpática senhora que serve às mesas diz:

"Era meter os do rendimento mínimo a apagar incêndios".

E logo me ferveu o sangue!

O Rendimento Mínimo, criado por Guterres (que depois a direita como nada sabe fazer nada mudou o nome para Rendimento Social de Inserção) foi a melhor coisa que se fez em Portugal depois de António Arnaut (também do Partido Socialista) ter criado o Serviço Nacional de Saúde. 

Mas não sei porquê, nunca foi um apoio muito popular, pelo contrário! O Estado pode gastar milhões de euros seja lá no que for, por exemplo, num palco para a vinda do Papa, mas se dá 155€ a um pobre, que não dá sequer para se alimentar convenientemente durante um mês, ui que é o fim do mundo!


E é verdade, o rendimento mínimo são 155€, não são, como o outro acólito mentiroso passa a vida a dizer, que são mil euros e dá para ter um BMW à porta. É que cada pessoa que recebe o rendimento não é o Macaco que tem um Pinto da Costa que, apesar de declarar o salário mínimo, consegue construir uma casa de dois milhões de euros!

Mas, para esta senhora pobre - porque se vivesse bem não andava a servir à mesas - ser mais pobre do que ela, e, infelizmente, precisar de ajuda do Estado, é crime.

Para muitas pessoas, receber o rendimento mínimo é como se fosse um crime! E então têm que ser punidos! 

Tenho horror a Pobre!, dizia Caco Antibes!

Que os mais ricos, tenham horror aos pobres, e até calcem botas e vistam calças de ganga quando visitam um bairro social, até aceito, que outros pobres criticam os apoios a outros pobres, mais pobres do que eles, acho verdadeiramente aberrante. 

Eu nasci numa família, que, fruto das circunstâncias era muito pobre. Não passei fome, mas comi muita sopa e a minha mãe teve de trabalhar muito, porque, ao contrário do meu pai, quis pôr-me a estudar. 

E sempre tive apoio escolar. Se calhar, para estas pessoas, também deveria ter ido apagar incêndios! Ou, sei lá, varrer as ruas! Para me punir por eu ser pobre! Afinal eu tive culpa de ter nascido numa família extremamente pobre, que precisou inclusive da ajuda da família para poder ter um abrigo. 

Sim, foi o esforço da minha mãe, mas o Estado deve existir para diminuir as desigualdades e não aumentá-las e perpetuá-las. Senão para que serve um governo? 

Pequenos apoios, tal como, por exemplo, os que Lula da Silva implementou no Brasil, conseguem tirar milhões de pessoas da pobreza. E depois é lamentável que sejam os próprios pobres a criticar os apoios que se dão a outros pobres como eles. 

E, nem de propósito, deixo aqui uma análise de uma longa entrevista que saiu no Jornal de Negócios na semana passada à historiadora Josephine Quinn:

“É do interesse dos ricos e poderosos que os pobres e menos poderosos se ataquem entre si”

Os nacionalismos crescentes e os discurso anti-imigração apoiam-se nesse pressuposto?

"Vemos isso acontecer ao mais alto nível político – nos discursos intermináveis de Putin e nos discursos bizarros de Trump, nos comunicados oficiais – e, ao mesmo tempo, assistimos a um movimento mais “popular” de isolacionismo, populismo e, acima de tudo, de medo de contaminação ou até de aniquilação cultural. Esse medo deixa-me furiosa, porque é um medo fabricado e alimentado pelas classes políticas. Parece um movimento vindo das bases, mas não é. Não é do interesse de 99% de nós estarmos a lutar uns contra os outros. É do interesse dos ricos e poderosos que os pobres e menos poderosos se ataquem entre si. Por isso, se conseguirmos pôr de parte a ideia de civilizações fixas, deixa de haver algo “a defender”, algo “a temer”. E já não há propriamente motivo para lutar. Podemos simplesmente viver juntos, neste mundo que é de todos.

(Josephine Quinn)

domingo, 3 de agosto de 2025

Boas Ideias Pelo Clima

 


Não é sempre, mas às vezes tenho boas ideias. 

Hoje estiveram 41º aqui em Gondomar. 

Se acima de trinta graus nenhum trabalhador pudesse trabalhar e o patrão fosse obrigado a pagar, aposto que se começavam a tomar medidas a sério pelo ambiente.

segunda-feira, 28 de julho de 2025

As Pessoas de Direita Não Fodem?

 


As urgências dos hospitais continuam fechadas e as grávidas continuam a parir em ambulâncias, mas o tema discutido toda a semana - enquanto os filhos da puta dos israelitas matam os palestinianos à fome e os bebés com tiros na cabeça - foi a exclusão da sexualidade das aulas de cidadania. 

No jornal O Público li este excelente título:

"Deus, pátria e família. Sexo não"

De imediato surgiu-me outro excelente título?

"As pessoas de direita não fodem"?

E depois lembrei-me quando a Natália Correia, em 1982, que era deputada pelo PSD, num debate na assembleia da República sobre a despenalização do aborto, em resposta ao deputado João Morgado do CDS, sobe à tribuna para lhe dar uma resposta em forma de poema e em que, segundo se lê sobre o sucedido, as gargalhadas foram tantas que foi preciso proceder à interrupção dos trabalhos. 

Já que o coito - diz Morgado -
tem como fim cristalino,
preciso e imaculado
fazer menina ou menino;
e cada vez que o varão
sexual petisco manduca,
temos na procriação
prova de que houve truca-truca.
Sendo pai só de um rebento,
lógica é a conclusão
de que o viril instrumento
só usou - parca ração! -
uma vez. E se a função
faz o órgão - diz o ditado -
consumada essa excepção,
ficou capado o Morgado.

(Natália Correia - 3 de Abril de 1982 )

sexta-feira, 25 de julho de 2025

Camaradas é o Que Somos


Essa é a minha luta e é a luta de muitos camaradas (aprende-se no primeiro dia de redação que “colegas” são as senhoras de má vida, “camaradas” é o que somos).

Margarida Davim / Visão (3 de julho)

sábado, 19 de julho de 2025

É o Que dá Escrever Discursos no ChatGPT, Luís!

 


Eu borrava a minha cara com merda e não saía mais de casa. 

Montenegro quer fazer bonito e cita Sophia, que até foi deputada do Partido Socialista, mas acaba a citar o maior comunista de todos: Saramago!

Mas esta até a burrice artificial já sabe.



sexta-feira, 18 de julho de 2025

Limbo

 O que é o Limbo, papá?

Limbo, meu filho, é o sítio para onde vão os Papeis do Panamá, os clientes da Spinunviva, os ficheiros do Epstein e tudo o resto que se quer enterrar vivo. 

quinta-feira, 17 de julho de 2025

Merditocracia

 Merditocracia é fazeres uma valente merda no ministério da saúde e depois não seres reconduzida mas o governo arranja-te um valente tacho noutro sítio para continuares a tua carreira merdosa.




terça-feira, 15 de julho de 2025

Os Melhores 50 Anos de Sempre

Por estes dias, a separar tralhas para o lixo, dei de caras com um trabalho que fiz na escola e encontrei cópias da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que, recorde-se, em Portugal, só foi ratificada trinta anos mais tarde. Tão simplesmente porque tivemos quarenta e oito anos de ditadura, período no qual o único direito que as pessoas tinham era de estar caladinhas, isto se não queriam que a vida lhes corresse mal. 


Já agora, para recordar como estes últimos cinquenta anos foram os melhores da nossa História basta ler alguns factos na crónica de Filipe Luís na Visão do dia 3 de julho:

"Os últimos 50 anos, período que coincide com o regime democrático, foram, provavelmente, aqueles em que o nível de corrupção, em Portugal, terá sido mais baixo (...) Os cartazes e os discursos populistas – sim, refiro-me ao Chega – que falam de 50 anos de corrupção são desmentidos pelos factos: houve imensa corrupção, como há, em todos os regimes, mas nunca ela tinha sido tão sistematicamente prevenida, investigada e, no final – o mais difícil e, portanto, ainda com caminho para andar –, punida. Os portugueses mais velhos, com boa memória, lembram-se do País da “atençãozinha”, do “empenho”, do untar as mãos ao fiscal, ao polícia de trânsito ou ao simples manga de alpaca das Finanças. Tudo isto ainda se passa? Sim, pontualmente. Mas é muito mais arriscado. Na pirâmide de favores, cunhas e endogamia sistémicos, a dimensão da metástase corruptiva aumentava consoante crescia a importância do detentor do cargo público ou do servidor do Estado, até à dimensão da oligarquia pura e simples. Antes disso, desde os Descobrimentos, passando pela Monarquia Constitucional e pelos desmandos da I República, é bom nem falar. No Estado Novo, a inexistência de imprensa livre e a ficção de uma separação de poderes que não existia eram sinónimo de inexistência, também, de exemplos de corrupção. Claro, nunca apareciam à luz do dia. E até um escândalo sexual, o caso Ballet Rose, em que altas figuras do regime estiveram comprovadamente envolvidas numa terrível organização de pedofilia, quando foi denunciado, pela oposição, à imprensa internacional, valeu aos seus denunciadores perseguições políticas implacáveis, ordenadas pelo governo e pela polícia de Salazar.

# Ao Menos no Tempo de Salazar Não Havia Corrupção

Liverpool Pagou Imposto pela Morte de Diogo Jota

 Nem de propósito, e refiro-me à publicação anterior, para ilustrar como, de repente, parece que "tributo" mudou de significado, vejamos a mesma notícia pelo olhar de dois jornais diários portugueses:

Comecemos pelo tabloide Correio da Manhã: "Tributo - emoção no primeiro dos "reds" sem Diogo". Um gajo lê isto e o que pensa? Pá, mas então mas o Liverpool pagou imposto por causa da morte do Diogo Jota?


Mas depois vemos a mesma notícia tratada pelo Jornal de Notícias:


E percebemos que não era um imposto, mas unicamente uma homenagem!

domingo, 13 de julho de 2025

Tributo é Imposto



"Dois milênios antes do debate atual sobre justiça tributária, a palavra latina “tributum” já queria dizer aquilo que só pés-rapados pagavam.

Tributo é um dos frutos de “tribus”, tribo, divisão do povo romano que, como em outras culturas da Antiguidade, englobava pessoas ligadas por território e parentesco.

Ainda no latim clássico, o sentido geográfico de “tribus” se desdobrou no sentido classista de “povo, classe pobre (em oposição aos senadores e aos cavaleiros)”. As palavras estão no dicionário latino-português de Santos Saraiva, obra do século XIX insuspeita de ser veículo da esquerda populista.


Encontramos o DNA de “tribus” em vocábulos como contribuição (o que se dá para o bem de todos), distribuição (a repartição de algo entre os membros da coletividade), retribuição (o que se devolve em paga a um benefício recebido de outro) e, claro, tribuno (magistrado que defendia os interesses do povo no Senado romano).

No entanto, é no “tributo”, no imposto, na taxação que se revela o fosso estrutural entre quem tem muito e quem tem quase nada. O tributo nasceu em tempos perdidos nas amnésias da história para nomear a grana que os membros mais pobres de uma tribo tinham de pagar à elite, aos donos da terra, para nela poderem trabalhar, fazer negócios, viver.

O tributo se chamava imposto porque era imposto mesmo, de impor, “imponere”.

Sérgio Rodrigues | Folha de São Paulo