sábado, 22 de outubro de 2022

Explicar o Delírio Coletivo



"Um espectro ronda o mundo - o espectro da dissonância cognitiva coletiva. Espectro materializado em um movimento transnacional, favorecido pela onipresença do universo digital e das redes sociais no dia a dia planetário.

Crimes e irresponsabilidades

Nas (não) comemorações do 7 de Setembro, Jair Messias Bolsonaro se superou: presenciamos um festival de mentiras, dados falsos, declarações preconceituosas e crimes de responsabilidade, em uma rapidez surpreendente mesmo para os padrões hiperbólicos do mito. Os quatro eternos anos da Presidência resumidos em 24 intermináveis horas. Síntese, aliás, desafiadora.

Ultrapassamos 680 mil mortes em função da pandemia de Covid, número que poderia ser muito menor se o governo não tivesse flertado coma criminosa noção de imunidade de rebanho por contágio direto.

Assistimos, consternados, ao retorno do Brasil ao mapa da fome. Indefesos, somos assaltados pelo dragão da maldade da inflação toda vez que vamos ao supermercado para comprar uma quantidade sempre menor de produtos.

Muito pouco surpresos, soubemos das “comissões” que seriam cobradas por intermediários improváveis de vacinas que não existiam no balcão de negócios escusos que se tentou montar no Ministério da Saúde, eque só não prosperou pelas denúncias da CPI.

Nada pasmos, fomos informados de que, agora sim com êxito, converteu-se o Ministério da Educação em um armazém de secos e molhados, cujas improvisadas gôndolas traficavam barras de ouro e bíblias superfaturadas, além de profanadas com fotografias do pastor ex-ministro e de dois pastores velozes e furiosos, indicados para tenebrosas transações pelo Messias Bolsonaro, responsável pelo apocalipse da educação pública.

Pela primeira vez na história da Nova República, um presidente em exercício acrescentou à sua já rica ficha corrida todos os crimes eleitorais possíveis e imagináveis, usando com o despudor que melhor define o personagem recursos da máquina pública em proveito próprio, em uma rachadinha eleitoral de proporções épicas.

A enumeração do caos da administração do governo enquanto arquitetura da destruição poderia seguir indefinidamente. Contudo, Bolsonaro mantém uma base sólida do eleitorado, tendo chegado a 51 milhões de votos no primeiro turno.

(Mas devagar com o andor que Bolsonaro é feito de barro. Em uma inegável derrota pessoal, também pela primeira vez na história da Nova República, o presidente ficou em segundo lugar no primeiro turno das eleições. Um fracasso que ameaça reduzir o mito à impotência política.)

Passemos a palavra à Esfinge: “Qual o ser que, em todas as idades, troca verdades por óbvias mentiras e, confrontado com a falsidade, desafia o mais elementar princípio de realidade? Em que teia foi enredado?”.

Vamos passo a passo - o caminho é longo e árduo.

Dissonância Cognitiva Coletiva

O bolsonarismo, como fenômeno de massa, enraizado em diversos setores da sociedade, como a eleição comprovou, é a expressão brasileira de uma onda transnacional que levou a extrema direita ao poder por meio do voto, ou seja, conquistando corações e mentes. É preciso reconhecê-lo para clarear o horizonte plúmbeo que nos ameaça.

Trata-se de constelação inédita, favorecida pela onipresença das redes sociais. A fim de enfrentar esse desafio, proponho dois conceitos: dissonância cognitiva coletiva e midiosfera extremista.

Dissonância cognitiva é um desconforto subjetivo causado pela consciência da distância entre crenças e comportamentos. Em 1957, o psicólogo social norte-americano Leon Festinger lançou o livro “Uma Teoria da Dissonância Cognitiva”, sistematizando uma experiência que viveu como pesquisador, relatada em uma obra anterior, “Quando a Profecia Falha” (1956).

Festinger tomou como base de sua teoria a Fraternidade dos 7 Raios, desenvolvida ao redor de Dorothy Martin, uma moradora de Chicago que dizia receber mensagens de seres extraterrestres de um planeta distante, Clarion.

O conteúdo era perturbador: em 21 de dezembro de 1954, um dilúvio de proporções bíblicas destruiria boa parte da Terra. Contudo, seus seguidores sentiam-se confiantes, pois no dia D, na hora H, um disco voador pousaria no quintal da senhora Martin e resgataria os que atendessem a seu chamado.

O dia azado chegou, mas também duas decepções amargas se apresentaram, embora a segunda tenha representado um alívio. O disco voador não apareceu, mas pelo menos o dilúvio também faltou ao encontro marcado.

Leon Festinger e alguns colegas conseguiram infiltrar-se na seita. Puderam, assim, responder à pergunta-chave: o que ocorre na dinâmica de um grupo de fanáticos quando a profecia falha?

Ora, como reagiram os bolsonaristas após o 7 de Setembro de 2021? Vale dizer, quando, após incitar sua base a violentas ações golpistas, o mito recuou e, dócil, demasiadamente dócil, assinou uma cartinha contrita que, emasculação máxima, foi redigida por Michel Temer. E, ao que consta, em ligação para o ministro do STF Alexandre de Moraes, não se esqueceu das lágrimas, muitas e nada caladas.

Festinger e seus colegas fizeram duas descobertas de grande relevância. De um lado, os adeptos da Fraternidade não abandonaram suas convicções. Pelo contrário, racionalizaram o fracasso da profecia dobrando a aposta: o anúncio do dilúvio teria prevenido sua ocorrência! A energia mental empregada na advertência da catástrofe foi razão suficiente para alterar os desígnios dos habitantes de Clarion.

De outro, a última frase do livro inaugura uma radicalidade para a qual o próprio Festinger não estava preparado, mas que explodiu no século 21: “Eventos conspiraram para oferecer aos membros da seita uma oportunidade verdadeiramente magnífica para que crescessem em números. Tivessem sido mais efetivos, a fracassada profecia poderia ter sido o começo, não o fim”.

A publicidade vertiginosa, gerada pelo espetacular malogro da predição, permitiria converter o insucesso em fator de crescimento, em uma fase inédita de expansão da fraternidade, em lugar de seu desaparecimento. Soa familiar?

A suprema humilhação de Bolsonaro diante do ministro Alexandre de Moraes não esmoreceu o ânimo de seus seguidores para novas escaladas golpistas, combas e em ridículas teorias conspiratórias a respeito das urnas eletrônicas. Como explicar esse comportamento de povo marcado, ê, povo feliz?

Midiosfera Extremista

A abertura de “Quando a Profecia Falha” ata as pontas do argumento que fez Festinger hesitar: “Um homem convicto é resistente à mudança. Discorde dele, e ele se afastará. Mostre fatos e estatísticas, e suas fontes serão questionadas. Recorra à lógica, e ele não entenderá sua perspectiva”.

Retrato acabado do tipo ideal do bolsonarista? Acrescente a essa certeza paranoica o caráter coletivo de um poderoso circuito comunicativo e o caldo entorna, ou seja, o caos cognitivo torna-se realidade alternativa. Como lidar com o Brasil paralelo de dezenas de milhões de pessoas?

Festinger escreveu “Uma Teoria da Dissonância Cognitiva” para responder à perplexidade causada pela história interna da fraternidade. A petição de princípio é inequívoca: “A presença de dissonância gera pressões para reduzir a dissonância. [...] A presença de dissonância estimula ações para sua redução; de igual modo, a presença de fome leva a ações para reduzir a fome”.

Os itálicos são do autor, assim como o estilo tautológico. A reiteração angustiada retorna no último parágrafo do ensaio: “É também evidentemente necessário ser capaz de especificar quais são as mudanças específicas na cognição, ou quais os novos elementos cognitivos, que reduziriam a magnitude da dissonância assim determinada”. A redundância, deselegante, e a expressão, convoluta, sugerem o desconforto do autor.

Na verdade, o desconforto tornou-se parte do mundo contemporâneo na figura do que sugiro chamar dissonância cognitiva coletiva, circunstância tornada possível pelo contágio favorecido pela mais poderosa máquina de desinformação da história: midiosfera extremista.

Trata-se de uma poderosa máquina de produção de narrativas polarizadoras, com base em fake news e teorias conspiratórias. Combustível da retórica do ódio, compõe-se de cinco elementos, quatro internos e um externo. Complexo sistema integrado que gera conteúdo radicalizador ininterruptamente.

Nele se encontram as malfadadas correntes de Whatsapp, as indefectíveis redes sociais, uma rede altamente tóxica de canais de Youtube e, por fim, aplicativos como TV Bolsonaro e Mano.

No interior dessa teia, circula sem cessar produção audiovisual que difunde o sistema de crenças bolsolavista, com exortação incessante a golpes de Estado e à eliminação física de adversários. Ainda mais importante: os membros da seita firmaram um pacto que atemorizaria o próprio Mefistófeles —ignorar toda informação que não provenha da midiosfera extremista.

O elemento externo é muito grave: a “mídia amiga” dos donos do poder, que, ao dar voz para fantasias as mais lunáticas, desestabiliza seriamente a democracia e estimula, no limite do crime, o projeto autoritário do bolsonarismo.

Na iminência do segundo turno das eleições, a midiosfera extremista transformou-se em uma usina sórdida de desinformação e seus artífices incorrem nos mais variados tipos criminais como se não houvesse amanhã. Todavia, se eles pararem para pensar, na verdade, descobrirão que o amanhã sempre vem.

O propósito da midiosfera extremista é a criação de dissonância cognitiva coletiva: temível máquina eleitoral pela transferência para a política da alta intensidade de engajamento das redes sociais. A fim de despolitizar a pólis, esteio de seu projeto político autoritário, o bolsolavismo tornou o Brasil um laboratório mundial de criação metódica de realidade paralela.

Eis a Esfinge que desafia a pólis brasileira. Sem decifrar sua dinâmica, não saberemos como superar o desafio maior da história republicana: a barbárie-bolsonaro.

Artigo de João Cezar Rocha publicado no jornal Folha de São Paulo a 9 de Outubro

Coisas da Minha Infância - Dartacão

Esta semana morreu aos 82 anos Claudio Biern Boyd, o criador de Dartacão e de Volta ao Mundo de Willy Fog, desenhos animados de grande sucesso na década de oitenta. 

Dartacão estreou na RTP em 1983, teria eu uns seis anos e o impacto foi tão grande que é das coisas que mais recordo da infância. Tudo naquilo cativava, da música do genérico aos desenhos das personagens que eram quase todas cães (excetuando Milady que era um gato e Richelieu que é um graxaim-do-campo) bem como o enredo e as aventuras em que Dartacão e os Moscãoteiros se envolviam. 

Contou o autor que quando nasceu não havia televisão, então, tornou-se um devorador de livros e os que havia na sua época era o Dumas, Júlio Verne, Salgari, Dickens. 

Como toda a gente sabe Dartacão foi a transposição para a animação da obra clássica "Os três mosqueteiros" de Alexandre Dumas que, confesso, que nunca li. 

Como é normal quando era criança eu consumia desenhos animados que, diga-se, quando tinha seis ou sete anos nem davam muito na televisão porque, não esquecer, quase só havia um canal. Dava ao fim-de-semana de manhã (e ainda tínhamos que gramar com a missa, o TV Rural ou o 70x7) mas depois sim,  com o passar do tempo começou a dar cada vez mais. 

Nessa altura os desenhos animados tinham conteúdo, não eram violentos e transmitiam uma mensagem. Eu só vi desenhos animados aí até aos meus 15-16 anos. E como não tenho filhos nem sobrinhos não acompanho o que se dá agora às crianças para ver, mas suspeito, até pelo que vou ouvindo, que muito disso se perdeu.

Os episódios de Dartacão tinham 25 minutos. Hoje, pelo que vou ouvindo, duvido que uma criança consiga estar quietinha durante quase meia hora como eu estava quando tinha seis anos. 

Outra coisa que se irá perder é que, daqui por quarenta anos esta geração de crianças que tem hoje seis anos não terá memórias coletivas. Hoje, todas as pessoas na casa dos quarenta recordam Dartacão, Wily Fog ou Era uma vez... Como também todas as pessoas na casa dos setenta recordam hoje a Gabriela que parava o país à hora que dava. Hoje cada pessoa vê a sua série, a sua novela, e cada criança tem o seu próprio canal de desenhos animados preferidos.

Há quarenta anos todos víamos à mesma hora Dartacão na RTP.

quinta-feira, 20 de outubro de 2022

O Presidente dos Afetos Pedófilos


Numa altura em que os portugueses sofriam cortes salariais e de pensões, Cavaco Silva, então Presidente da República em 2012, com 73 anos, veio queixar-se que com os 15 mil euros que recebia mal dava  para pagar despesas. 

Marcelo Rebelo de Sousa, com os mesmos 73 anos disse há dias que quatrocentos abusos sexuais na Igreja (que são muitos mais) nem é muito!

Não, não vou avançar com a teoria que é a partir dos 73 anos que os políticos começam a dizer e a fazer disparates! Até porque hoje mesmo, dia 20 de Outubro de 2022, demitiu-se Liz Truss, a senhora primeira-ministra do Reino Desunido que era contra a monarquia e depois a favor, que era contra o Brexit e depois foi a favor, que ia revolucionar a economia britânica baixando os impostos aos mais ricos, ou talvez não, e demitiu-se! 

Perguntaram-me se este seria o ponto de viragem na popularidade de Marcelo. Não creio. Se  Trump e Bolsonaro podem dizer e fazer o que querem que não perdem eleitorado, também não me parece que o comentador-presidente e rei das sefies vá perder popularidade por dizer esta enorme aberração. 

E depois as indignações das pessoas (e principalmente dos media) são muito seletivas. Na mesma semana que ficamos a saber da podridão da Igreja Católica portuguesa, que no fundo não é nada diferente do resto do mundo e, na mesma semana em que soubemos do esquema da Federação Portuguesa de Futebol que fugiu ao fisco em milhões de euros no pagamento do salário do selecionador, as pessoas indignam-se com o facto da Catarina Furtado cortar as pontas dos cabelos ou o Casillas dizer no Twitter que é gay. 

Voltando ao nosso comentador-presidente, relembrar que o senhor telefonou para um programa de televisão para desejar boa sorte a uma apresentadora de televisão. Agora, antes que a bronca rebentasse, ele mesmo serviu a vichyssoise e veio dizer que avisou o bispo, desculpando-se, que tinha encaminhado o processo para o Ministério Público. 

Só foi pena que Marcelo não tenha ligado à viúva do ucraniano assassinado pelo SEF para "não abrir uma exceção" quando estava "uma investigação criminal em curso"!

Como disse, não creio que Marcelo vá perder muita popularidade com o caso da pedofilia na igreja, contudo, considero que o presidente dos afetos pedófilos começa a meter-se num caminho muito apertado.

sábado, 15 de outubro de 2022

Coisas que as Pessoas Deixam Dentro dos Livros (3)


Em 1975, o ano em que fui fabricado, Portugal vivia o "verão quente" com ataques à bomba da rede bombista de extrema-direita (MDLP e ELP com o apoio da Igreja, do CDS e do PSD) e um bilhete dos Serviços de Transportes Coletivos do Porto (STCP) custava 2$50 (1,25 cêntimos).

A Velocidade da Trolltinete e o Carrinho-de-Mão Parado


Aqui há uns dias parece que circulou pela net (eu não cheguei a ver) um vídeo que mostrava uma Trolltinete a circular em Oeiras a 100Km/hora.

É verdade que isso me surpreendeu um pouco porque eu, no meu novo maquinão, de quarenta e poucos cavalos acho que ainda não ultrapassei essa velocidade estonteante!

Mas isso isso não é nada! Um carrinho-de-mão parado em Santa Maria da Feira, foi apanhado em Lisboa a circular a 112Km/hora!

sexta-feira, 14 de outubro de 2022

Desgostos de Amor em Tempos de Instagram


No Instagram, a rede do ego por excelência, o amor não só é maravilhoso e mais intenso do que na vida real; a água do mar é mais turquesa, os diamantes brilham mais e ninguém tem barriga ou rugas. As separações também são idílicas e harmoniosas... até que deixem de ser.

Um dos primeiros a patentear esse modelo de separação acordada e em bons termos foram Sara Carbonero e Iker Casillas, que há poucos dias se meteu numa chatice ao declarar-se gay no Twitter, farto de tantas namoradas que lhe atribuem desde que estão separados. 

Belas fotos e palavras sinceras são escolhidas para dizer adeus. Exalam tanta harmonia que nem parece o fim de um relacionamento romântico.
Shakira e Piqué também compartilharam uma imagem juntos no Dia dos Namorados deste ano, quando ele já arrastava a asa para outra. A imagem já tem 33 semanas e não há um dia que um seguidor não peça para a colombiana apagá-la.

Em tempos de exibição da vida privada nas redes, o ditado "diz-me o que presumes que eu dir-te-ei o que te falta" foi superado por outra teoria: as imagens mais açucaradas e com os protagonistas mais apaixonados do que nunca assinando mensagens de amor eterno, o mais provável é que a coisa termine de forma conturbada. 

Excerto traduzido do texto "El desamor en tiempos de Instagram" publicado no jornal La Vanguadia.

domingo, 9 de outubro de 2022

A Realidade do Brasil em 2022 - A Fome, Todos os Dias


Quem quiser conhecer a realidade do que é o Brasil em 2022 ouça a reportagem da Antena 1 "A Fome, Todos os Dias" de Isabel Meira.

Deixo aqui algumas frases soltas da reportagem.

"Ninguém escolhe ser pobre. Alguém escolheu ser pobre?
Muita gente diz: "está na rua porque quer". Vocês acreditam nisso? E então cai em cima da pessoa a culpa. Ele está na rua porque é culpa dele, porque quer".

"Só na cidade de São Paulo mais de quarenta mil pessoas vivem na rua".

"Há uma grande exploração da mão-de-obra da população de rua. Todos os shows do Rock in Rio, por exemplo, quem monta as estruturas duras do show é a população de rua. E muito explorada. (Recebem 1€ por hora, trabalhando 12 horas por dia)

"No Brasil 33 milhões de pessoas passam fome". (não têm uma única refeição para comer ao longo do dia e dependem de apoios)

"Com a destituição de Dilma a partir de 2016 houve um retrocesso na lei do trabalho. A maior parte dos trabalhadores hoje no Brasil está sem contrato".

"Quem está passando fome é também quem trabalha mas sem contrato de trabalho".

"Segundo a FAO tudo que nos tirou do mapa da fome foi destruído".


"A fome tem vários rostos mas há um que se destaca: mulheres, monoparentais, com crianças, negras"

"Quase 120 Milhões de brasileiros vivem hoje com algum grau de insegurança alimentar" (mais de metade da população)

"O paradoxo do neoliberalismo brasileiro: mais uma vez este ano vamos bater recordes de produção de alimentos; vamos bater recordes de fome no Brasil; recordes de desmatamento; e recordes de obesidade".

"Os quatro problemas estão ligados que tem na sua raiz o sistema alimentar que consegue gerar e ser responsável por um PIB e pelas nossas exportações e ao mesmo tempo gera fome, gera miséria e gera má alimentação".

"No Brasil a esperança média de vida das pessoas trans é de 35 anos. Metade da média nacional".

"Os pobres vão morrer. A fome n é uma sensação passageira. É uma privação contínua. A lógica do capitalismo neoliberal é o descarte. O capitalismo neoliberal n funciona sem o descarte. A população que vc viu ela é descartável. Dificilmente eles vão ter saída".

"Tudo é política. Mas tem uma política que é predatória e que atua para produzir fome e miséria no mundo. É política".

"Não tem um lugar no mundo em que eu deixaria uma flor brotar com a confiança que ela não será esmagada".

Roma, Paris, Barcelona, Viena, Florença, Edimburgo...? Nada Disso!


 

Se te dessem a escolher o que visitar no velho continente o que é que escolherias?

Coliseu de Roma
Louvre
Torre Eiffel
Palácio de Buckingham
Palácio de Versalhes

Nenhum! Qualquer europeu sabe que a melhor coisa para ver são umas tábuas colocadas numa serra toda queimada?

Mais não seja porque Portugal continua a pagar para ganhar estes premiozinhos da treta. 

As Preocupações Ridículas da A.S.A.E.


 

A A.S.A.E. é a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica. Como este nome existe desde 2005 e é uma espécie de polícia que deveria verificar o que se produz e vende, nomeadamente no que se refere à higiene dos alimentos e regular as atividades económicas. 

A face visível da A.S.A.E. foi ter encerrado centenas de restaurantes pelo país todo. E, se uns acredito que terá sido por falta de higiene ou por falta de cumprimento de determinadas normas, muito restaurantes foram encerrados simplesmente, e isto foi dito pelo seu presidente da altura, porque "havia restaurantes a mais no país"!

Mas quem é a A.S.A.E. para decidir que há cafés e restaurantes a mais no país? A A.S.A.E. só tem que garantir que os estabelecimentos cumprem as normas de higiene e de licenciamento, não tem que ter opinião sobre se há a mais ou a menos. Isto é uma completa arbitrariedade. Se houvesse restaurantes a mais estariam fechados porque não tinham clientes. Se estão abertos é porque as pessoas os frequentam! 

A outra face visível da A.S.A.E. ficou também conhecida por entrar feitas adentro, munidos de metralhadoras e apreender filmes e CD piratas bem como roupa contrafeita. Tudo coisas menores, tudo em perseguição do pequeno delito porque ao grande fecha-se os olhos, pois como sempre, a justiça é forte com os fracos e fraca com os fortes.

Bom, por esta altura talvez seja já bom fazer já uma declaração de intensões não vá algum leitor fantasma ter segundas interpretações a meu respeito. Eu nunca vendi nem comprei bilhetes de espetáculos, entendido? Então prossigamos. 

Com o streaming hoje em dia já ninguém compra filmes nem CD piratas, até porque se calhar nem tinha onde os enfiar. E agora também existe a Primark, que vende roupa mais barata que na feira mas em centros comerciais finos, porque ir à feira é coisa de pobre e nos centros comerciais não há pobres. Vai daí isto complicou a vida à A.S.A.E. Não tendo que ir às feiras aprender filmes piratas ou roupa martelada para onde é que se viraram? Para os bilhetes dos espetáculos!

Aqui há umas semanas ficou-se a saber que Coldplay é a banda preferida dos portugueses. Bichas que nunca mais acabavam, milhares de pessoas sem bilhetes, para logo se seguida serem anunciadas mais não sei quantas datas. Uns conseguiram bilhetes, outros não

E rapidamente os bilhetes começaram a ser vendidos na internet e o pessoal da A.S.A.E. pensou: "bem, vamos lá mostrar quem é que manda!"




O argumento da A.S.A.E. é o valor facial e argumenta com a especulação. O preço está lá marcado no bilhete, então, não se pode vender a um preço superior. 

Tudo isto é muito interessante, mas então porque atividades como a filatelia ou a numismática não encerram portas? Os selos, as moedas e as notas têm lá marcado o seu valor. No entanto há moedas de 2€ a valerem muito dinheiro! Mas isso a A.S.A.E. já não considera especulação! Até os próprios livros antigos têm lá marcada o seu valor. Eu tenho livros que quando foram vendidos tem lá marcado o seu valor, alguns custaram uns 5 escudos!

Vivemos um sistema capitalista, uma economia de mercado, que visa o máximo lucro. Todas as grandes empresas especulam preços, muitas vezes juntando-se várias empresas fazendo cartelização, o que é ilegal. Muita gente ganha, legalmente, dinheiro de forma absurda. Mas para a A.S.A.E. o grave problema são os negócios privados, entre duas pessoas, em que uma sabe perfeitamente quanto custava o bilhete quando foi vendido mas aceita pagar muito mais porque, primero tem dinheiro e segundo porque quer muito ver esse espetáculo e considera aceitável pagar esse valor. 

E depois a questão hipócrita. O próprio presidente da altura da A.S.A.E. disse em entrevista que se coisa foi na esfera privada não tem qualquer mal. Mas aqui não são lojas que estão a vender os bilhetes, são pessoas, particulares que compraram esses mesmos bilhetes e estão a vendê-los, tentando obter lucro com algo que é seu.


Para mim nada disto faz sentido. Podemos falar em moral, se é moralmente aceitável cobrar 300€ por um bilhete que custou 85€, mas não é isto que os neoliberais e defensores do capitalismo selvagem defendem? Deixar o mercado a funcionar? 

Há uns vinte anos eu vendi um CD por 150€ que só me tinha custa três contos e quinhentos. Ainda bem que não existia A.S.A.E. na altura senão sei lá o que me poderia ter acontecido!

Nada disto faz sentido. É um daqueles absurdos sem lógica nenhuma. Trabalhem mas é, e façam aquilo que é suposto fazer senão vão parecer ridículos. 

sábado, 8 de outubro de 2022

O Orgulho de Ter Posto a Colega a Ler um Livro



Foi em Agosto que recolhi centenas de comentários à pergunta deixada no Twitter: "que livro dar à colega que nunca leu nada"? A minha escolha acabou por recair no livro "História de uma gaivota e do gato que a ensinou a voar" de Luís Sepulveda (sugestão da Fernanda Freitas) e autor que, curiosamente, eu nunca li nada. 

Passei na biblioteca e deixei-lhe o livro em cima da sua secretária. Ela agradeceu e disse que o ia ler. Mas as semanas foram passando e eu comecei a perder a esperança que ela o fosse ler. Não pressionei grande coisa, do género, todos os dias perguntar se já tinha pegado no livro. Fui esperando para ver. É verdade que pelo meio ela teve um problema pessoal que certamente a deixou sem vontade de fazer o que quer que seja, e eu tive inclusive que prolongar o empréstimo da biblioteca.

Mas eis senão quando chega ao trabalho com o livro e disse que o acabou e que gostou muito, e que, na parte final final até se emocionou! 

Fiquei muito contente porque afinal valeu a pena. Agora é arranjar-se um segundo livro para ler. Tinha pensado trazer da biblioteca "Mataram a cotovia" de Harper Lee mas já estava requisitado. Logo vejo o que lhe arranjarei para ler. Mas de qualquer forma, apesar de saber que é algo insignificante, não deixo de me sentir menos orgulhoso por isso.

domingo, 2 de outubro de 2022

Quando as Novelas Brasileiras Ensinavam Política


Nos final dos anos oitenta uma pergunta intrigou todos os portugueses: Quem matou Odete Roitman?

Hoje, dia 2 de Outubro, Bolsonaro, o militar fascista que foi eleito presidente do Brasil em 2018 graças a uma fakeada e a mentiras absurdas como a Mamadeira de Piroca e o Kit Gay será varrido da presidência da república conseguindo um feito que nenhum outro presidente conseguiu: o de não ser reeleito. Ou, pelo menos assim espero. Ainda assim fico intrigado como é que ainda consegue ter mais de trinta por cento das intensões de voto, algo que, infelizmente, diz muito sobre a falta de cultura e burrice do povo brasileiro. 

O ano é 1988. Cavaco Silva era primeiro-ministro e Mário Soares presidente da República. George Bush sucedeu a Ronald Reagon e o Reino Unido era governado por Margaret Thatcher. 1988 foi também ano de Jogos Olímpicos de Seul, na Coreia do Sul e Rosa Mota emociona os portugueses vencendo a medalha de ouro na maratona. 

      

Em Vale Tudo pontificava a personagem Odete Roitman, rica, morava no estrangeiro, tinha os seus amantes jovens, era dona de uma multinacional e tinha um verdadeiro ódio pelos pobres. E na trama todos se apunhalam pelas costas e passa por cima de quem for preciso para subir e se dar bem na vida. 

E a novela mostrava assim, na prática, o que é e como funciona o neoliberalismo capitalista, que foi aplicado nos Estados Unidos, no Reino Unido por de Margaret Thatcher ou, mais tarde, aqui em Portugal por Passos Coelho. O neoliberalismo é isto, uma verdadeira selva em que "vale tudo" para subir na vida e a fome e a pobreza são meros efeitos secundários. O que importa somos nós, os mais ricos, o que nos interessa os pobres, esses, que se fodam, que tivessem nascido em boas famílias.