sábado, 16 de outubro de 2021

A Psicologia Sobre a Personalidade Autoritária das Pessoas dos Partidos Conservadores e Fascistas

 A teoria das frustrações continua a ser uma das bases de explicação psicanalítica dos antagonismos políticos, mas pareceu insuficiente ao próprio Freud, que a completou com outras. Na segunda parte da sua vida pensou que a agressividade e a violência, sobretudo assentavam também num "instinto de morte", que descreveu em conflito com a líbido. A luta de Eros e de Tanatos, no coração de cada homem, é um dos aspetos mais grandiosos, mas o mais desconcertante e obscuro das doutrinas psicanalíticas. Cada ser, como que tomado por vertigem, seria, ao mesmo tempo, levado a querer viver através do prazer e a procurar a sua própria destruição. Contudo, ninguém ousa olhar a morte de frente; ela repele, ao mesmo tempo que atrai. Transfere-se assim para os outros o desejo de autodestruição: a agressividade, quer dizer, a tendência para destruir os outros, seria, pois, uma transferência do instinto da morte por aqueles que são por ela dominados, aqueles em quem Tanatos tende a recalcar Eros. 

A agressividade, a violência, o domínio, o autoritarismo - fatores evidentes de antagonismo político - também podem ser o resultado de um fenómeno de compensação. A psicanálise insiste muito na ambivalência dos sentimentos e das atitudes de carácter contraditório. Para ela, a propensão para o erotismo pode ser uma consequência, quer de uma forte potência sexual, quer, pelo contrário de uma impotência que impele a sua vítima a afrmar-se nesse domínio, para disfarçar a sua insuficiência. Do mesmo modo, o desejo de dominar, a atitude autoritária pode resultar, quer da vontade real de poder de um indivíduo forte e enérgico, quer de uma fraqueza psicológica, de uma perturbação íntima e de uma incapacidade de se dominar  e de se fazer respeitar pelos outros, que é disfarçada por detrás de uma atitude oposta. 


Sob este aspeto é muito interessante o célebre inquérito realizado nos Estados Unidos em 1950, por T. Adorno, sobre a "personalidade autoritária". Este demonstrou que atitude conservadora em política está ligada a um certo tipo de estrutura psicológica. A personalidade autoritária é definida  por um conformismo rigoroso, pela submissão cega aos sistemas de valor tradicionais, pela obediência fiel às autoridades, pela visão sumária de um universo moral e social dividido em categorias bem marcadas (bem e mal, negro e branco, bons e maus), em que tudo é claro, regulamentado, delimitado; em que os poderosos merecem mandar porque são os melhores, e os fracos merecem a situação subordinada porque são inferiores sobre todos os aspetos;  em que o valor das pessoas é determinado unicamente segundo critérios exteriores, baseados na condições social. 

Este conjunto de comportamentos políticos é, sobretudo, uma característica dos indivíduos com falta de confiança e si próprios, que nunca conseguiram construir a sua própria personalidade, estabilizá-la, que duvidam do seu "eu" e da sua própria identidade. Agarram-se aos aspetos exteriores porque não têm nada dentro de si a que agarrar-se. É a eles próprios, é a base do seu eu, é o seu equilíbrio psicológico que eles defendem ao defenderem a ordem social. Daí a sua agressividade e o seu ódio aos opositores, e sobretudo "aos outros", aos "diferentes", àqueles cuja forma de existência e sistema de valores constituem um desafio à ordem social, cujo fundamento e generalidade põem em dúvida. 

As personalidades autoritárias aderem aos partidos conservadores nos tempos calmos, quando a ordem social não está ameaçada. Se esta é contestada, a sua agressividade cresce naturalmente e impele-os para os movimentos fascistas. Assim, são as pessoas menos sólidas interiormente que exibem a maior solidez exterior, e os partidos baseados na força são sobretudo constituídos por fracos

O autoritarismo , o domínio, a violência, têm ainda outras explicações psicológicas. São por vezes uma compensação para os fracassos individuais. Vingamo-nos nos outros do facto de nos detestarem, de troçarem de nós, de nos considerarem inferiores. Os fracos, os imbecis, os falhados, procuram afirmar-se humilhando os que lhe são superiores, procurando rebaixá-los abaixo do seu nível.

Introdução à Política / Maurice Duverger (1964)

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