terça-feira, 15 de março de 2016

À Luz da Escuridão

Este é um daqueles dias em que quereríamos esquecer a efeméride que passa. Mas... vá lá saber-se porquê, não esquecemos. Passam dezassete anos e mesmo não pensando nesse passado, há sempre qualquer coisa neste dia que nos faz olhar para a data e lembrar. 

Mas só lembrei a data. Não passei o dia a pensar nesse passado longínquo. 
Como que ironicamente até passei o dia a pensar no passado recente. É que quando o efeito da droga começa a passar, começamos a ressacar. E então das duas uma, ou vamos em busca de mais uma dose, ou então as dores começam a fazer-se sentir. Violentamente.



No trabalho foi um dia engraçado. Falhou a luz por um longo período. É preciso arranjar o que fazer mas que não necessite de eletricidade. E lá se arranjou entretenimento. Querendo, há sempre muito que se pode fazer. E é curioso, quando ponho outras pessoas a trabalhar, e agora tenho-o feito quase todos os dias, digo-lhes "pronto, já tens entretenimento". E o trabalho não deveria ser precisamente isso?

Mas houve uma coisa que não teve graça alguma. Todos se riram e achavam muita piada. e até faziam piadas da deficiência dela. E ainda por cima depois descobri que ela não estava muito longe. Será que eles se aperceberam disso? E se ela tivesse ouvido o que eles disseram dela? Quase fiquei embaraçado ao vê-la chegar de novo. Fiquei muito mal impressionado. Não gosto que se faça pouco de deficiências físicas. E nas costas dos outros vemos as nossas. Sim, sempre achei que o humor tem limites, e se não tem deveria ter. Nem que seja por uma questão de bom gosto. Não lhe vi a deficiência, porque sou discreto. Não fico a olhar as pessoas de cima abaixo. Mas eu achei-a simpática, pelo menos sorriu para mim. Posso achar que uma mulher bonita, que saiba sorrir, vale mais que uma deficiência? Posso pensar diferente? Posso?

Mas esta quebra de rotina, a falta de luz, deixou-nos um pouco mais próximos. Ainda por cima chovia. Ninguém saiu à hora de almoço. E teve de se conversar. Às vezes tudo fica em silêncio se eu não falo. Outras vezes falo demais. Outras ainda consigo ser espirituoso, sem ter necessariamente a mania que sou engraçado. E às vezes até consigo ter graça.

E talvez estivesse inspirado. A cada novo tópico de conversa saía-me um tema de uma música. Falou-se do silêncio. Poderia ter citado a "Enjoy the silence". Até me lembrei da banda de uma amiga do passado em que no CD até me colocou lá o meu nome nos seus agradecimentos. E eu só anos mais tarde é que vi isso lá, por mero acaso.

Mas preferi falar dos versos do refrão:

"Silence is not a way
 we need to talk about it".




E já ao fim do dia de trabalho, disse: "Estamos aqui... À luz da escuridão". 
E olha que belo título que isto dava.


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