terça-feira, 1 de março de 2016

(In)sensibilidades

Já não faltavam muitos minutos para sair e ela estava no vício, junto do portão, a deitar fumo pela chaminé. Não perdi a oportunidade de, discretamente, longe dos olhares e dos ouvidos alheios, de me ir lá meter com ela, afinal, agora mal falamos. E comecei pela pergunta retórica mas com um fundo de preocupação: - "Então, quando é que deixas de fumar"? 

Instantes depois, ela olha para mim diz?
- "Tu nunca pensaste em cortar o cabelo"?
Uiiii.. Então mas por acaso não cortar o cabelo faz mal à saúde?

E afinal onde é que ela quereria chegar com esta pergunta? Bem sei que não estava a apalpar terreno, pois até já sabia que agora, depois de quase ter tido de contratar uma secretária para gerir a sua agenda de gaijos que andam atrás dela, agora acabaram-se as preocupações: está apaixonada! Pior. Contrariamente ao que ainda me dizia há não muitas semanas, espera ser pedida em casamento em breve. Pois é, "nunca digas nunca". E claro que, discreto como sou, nunca lhe perguntaria se não era demasiado cedo para passar do "nem pensar em voltar a casar" para rapidamente ter conhecido alguém, e mesmo não tendo gostado dele ao início, já achar que é a melhor gota de orvalho da manhã, a ponto de fazer já de olhos fechados, o que já tinha dito que não voltaria a fazer. 

Mas fiquei intrigado. Afinal, porque raio, para uma mulher, a quem não aqueço nem arrefeço, se interessará por saber quando vou cortar o cabelo? E os pêlos públicos também interessa saber o comprimento que têm?


Stellan Skarsgård (King Arthur) 

Vamos analisar a frase: Nunca pensaste em cortar o cabelo? O que é que eu interpreto daqui? Se devo cortar é porque comprido (apesar de o ter cortado e ninguém ter reparado) me fica mal certo? Ou seja, no fundo a pergunta, sem usar vaselina ou lubrificante, assim mesmo à bruta, deveria ser: "Tu que estás tão feio, talvez se cortasses o cabelo ficasses com melhor aspeto".

Dizer-nos, ainda que indiretamente, que estamos mal não me parece assim lá muito abonatório para a nossa auto-estima. Mas isto é o tipo de observação que já nem sequer ligo. Já estou habituado. Eu não tenho cabelos compridos há meia dúzia de anos. Não foi uma fase, não foi para chatear os pais. Não. "Eu posso ter cara de puto mas já sou muito rodado". E eu já tive (e tenho) problemas de auto-estima que cheguem, para agora me importar minimamente com o que pensam ou deixam de pensar do tamanho do meu cabelo. Não gostam? Têm bom remédio. Deixem na bordinha do prato e depois deitam no saco do lixo que eu faço igual.

Mas mais interessante ainda, é o constatar que o mulherio, também ele - sim! - olha para os atributos masculinos, ou pelo menos para o embrulho. Dizem que não, que se sentem atraídas é pelo sentido de humor, ou que é a sensibilidade e a simpatia, ou o número de zeros da conta bancária, mas não só. Tal como os homens também elas também olham para o pacote. Obviamente - até porque têm dois olhos e não são cegas! E por vezes até olham ainda mais para as outras mulheres.
Mas se a maioria achará asqueroso, outras há que até acharão muita piada aos cabelos comprido, é como tudo, são gostos. E será que, assim por acaso, já pensaram que eu ando como bem me apetece? Se calhar não.

Depois por último constatar que não é só os homens a quem falta alguma sensibilidade. E não me venham dizer que não é falta de sensibilidade aqui no caso. Andarem-me sempre a perguntar quando é que vou cortar o cabelo, é o mesmo que chegar junto de uma mulher e perguntar:
"Olha lá, tu nunca pensaste fazer exercício para perder esse cu, que tem quase o tamanho da Rotunda da Boavista"? Muito sensível não é? 

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