Agora que já fiz a digestão do meu próprio livro, eu acho que o meu livro e os últimos livros que eu tenho escrito, são sobre a nossa incapacidade de amar. Não é só azar não é só incompatibilidade de feitios... Não. É que acabaram algumas coisas que antes eram sagradas. E ainda bem que já não são como a renúncia, a entrega, a dádiva o amor incondicional, o amor unilateral que acontecia muito no caso das mulheres, etc. O próprio sentido de sacrifício. Isso tudo está completamente arredado da nossa vida do quotidiano... O pragmatismo chegou ao amor.
Isto é a minha última descoberta, que parece uma paliçada, e que eu não acho que seja. Eu tenho três casamentos falhados, e tenho uma tendência universal de dizer: "foi azar". Não foi azar porquê? Primeiro porque isto é um bocadinho a história da Cinderela ao contrário. Tens um sapato que servia e é aquela a amada. E aqui é: "nós temos que ter o mesmo sapato". O sapato está um bocadinho apertado já não andamos bem; se está largo já andamos como umas patas. Portanto, a chinela para o nosso pé é das coisas mais raras e difíceis de conseguir. É como acertar no Euromilhões. Ou desromantizamos a hipótese de termos ao virar da esquina uma pessoa que seja a chinela do nosso pé, e percebemos que quando isso acontece, é aí sim, uma bênção extraordinária que temos que honrar, ou não nos vamos sentir frustrados quando cada vez que um sapato começar a apertar ou a alargar. Basicamente é a nossa incapacidade de amar.
Rita Ferro, a propósito do seu último livro "Um amante no Porto" no programa "À volta dos livros".
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