Antigamente, sempre que surgia algo de novo, que não existia antes, depressa se criava uma nova palavra adaptada da língua estrangeira para o português. Na escola até aprendemos que esse tipo de palavras se chamavam neologismos.
Mas entretanto o tipo que fazia esse trabalho de inventar novas palavras deve ter morrido ou então foi para a reforma ou foi despedido por extinção do posto de trabalho porque, de repente, tudo que aparece de novo na sociedade quase não tem nenhum equivalente no português, e rapidamente impinjem-nos para usarmos o inglês. E então passamos a vida a dizer wi-fi, smarthphone, tablet, etc.
Mas não é só neste tipo de tradução para o português que deveriam ser criadas novas palavras. Há também novas coisas a acontecer na sociedade que depois não têm uma palavra apropriada e as pessoas até ficam constrangidas sem saber muito bem o que dizer.
Até há não muito tempo o casamento era para a vida e até era mesmo proibido o divórcio. E até então era fácil: ou se era solteiro, ou se namorava ou se estava casado ou viúvo. Mas hoje em dia temos uma nova categoria para a qual não há palavra e isso cria na cabeça das pessoas alguma confusão e até descriminação.
Grande parte das pessoas, e não estamos a falar de uma minoria deixaram de casar. Segundo o INE, em dez anos houve menos 39% de casamentos, e os casamentos católicos diminuíram 61%! E de 2001 para 2011 as pessoas que viviam em união de facto passaram de 381 mil para 730 mil. Ou seja, cada vez os casais vão viver juntos mas estão-se a cagar para o papel assinado.
Só que há um probleminha: não existem palavras em português, tanto para designar o seu estado civil - ninguém diz "a minha união de facto está nas ruas da amargura" pois não? porque "união de facto" foi o rótulo legal que os políticos arranjaram, tal como, por exemplo, para o corte cego de freguesias que o anterior governo procedeu e chamaram-se "união de freguesias" que fica lindo que que fode! Ninguém diz que vai à União de freguesias de Santa Cona do Assobio e de Arrebimba o Malho tal como ninguém diz que um amigo vai-se unir de facto com a namorada, pois não? E depois ainda sobra outra questão de português mais complexa. Marido e mulher (ou marido e marido/ esposa e esposa no caso homossexual) designa duas pessoas que são casadas de papel passado. Mas e quem não assinou o papel? São o quê? Companheiros? Camaradas? Unidos? Namorados? Igualmente marido e mulher? Como é que vamos uniformizar isto tudo?
A verdade é que ainda há muito preconceito, principalmente nas mentes mais velhas ou pouco arejadas para este tipo de situação. E eu ainda me lembro muito bem de ouvir referir-me a este tipo de situação de "mal casada" e tenho o exemplo da minha própria mãe, que abdicou (e mal a meu ver) da sua pensão de viuvez e quis casar, precisamente para ter um título maior de importância. Porque não estando casada parece que é uma galdéria qualquer.
Infelizmente as pessoas não se atualizam e têm muitos preconceitos nas suas cabecinhas . Ainda hoje, parece que quem decide fazer um contrato e jurar que vai ficar com aquela pessoa para a vida toda, mesmo apesar de existirem 70% de divórcios! parece que tem sempre mais importância do que quem decide estar junto da pessoa que gosta de livre vontade, sem nenhuma formalidade.
E depois é o constrangimento que cria. Quem está casado diz "a minha mulher/marido", quem vive junto nem sabe muito bem o que dizer... Por norma ouço dizer "o meu namorado(a)", mas namoro no meu entender é o estado antes de se viver junto. É diferente. Há quem use também "o meu companheiro", mas companheiros, camaradas, colegas, e tipos com quem se dá umas fodas também há muitos.
Quem me conhece sabe que eu não diferencio, e trato de igual forma quem está casado como quem vive junto. Por exemplo, à minha colega engenheira lá do trabalho falo no "marido". E eu ajo assim pois parece-me a melhor forma de não discriminar, de dar igual importância.
A este propósito, uma amiga minha, que recentemente foi viver com o namorado, até me disse por estes dias que está mesmo a pensar casar, precisamente pela pouca importância que os outros dão quando menciona o "namorado". Mas neste ponto já não estou de acordo. Nós temos que fazer a nossa vida em função do que nós acreditamos. A importância e o valor que realmente importa é o que nós damos. E temos de fazer a nossa vida pela nossa cabeça, não em função do que os outros pensam de nós.
Se queremos casar porque era uma ambição e fazer uma festa e gastar uma pipa de massa para mostrar aos outros; se queremos casar porque poderemos ter vantagens fiscais; se queremos casar por questões religiosas? Sim. Ir casar forçado, quando nem sequer se acredita na instituição, e só porque os outros torcem o nariz e não nos valorizam? Não.
Ainda assim, o que acho é que é mesmo preciso, é que se inventem novas palavras para a língua portuguesa.
Sem comentários:
Enviar um comentário