segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Onde Estão os Teus Sonhos?

"- Sabe que gosto agora de lembrar e de visitar, em certas datas, locais onde um dia fui feliz à minha maneira; gosto de edificar o meu presente de harmonia com o meu passado, e, muitas vezes, vagueio como uma sombra, sem objetivo, sombrio e triste, por sítios afastados e pelas ruas de S. Petersburgo?

- Que recordações! Lembro-me, por exemplo, de que neste local, há justamente um ano, precisamente a esta hora, neste mesmo passeio, vagueei tão solitário e tão sombrio como hoje! E repare que nessa altura também os pensamentos eram tristes; ainda que não fosse mais feliz, sentia apesar de tudo, que a vida era mais fácil e tranquila, não existindo nela esta ideia negra que agora a mim se apegou; nada destes problemas de consciência, sombrios e severos remorsos, que nem de dia nem de noite me deixam descansado. E uma pessoa interroga-se: mas então onde estão os teus sonhos? E sacode a cabeça, dizendo: como os anos passam depressa!

E novamente nos interrogamos: mas o que fizeste tu dos teus anos? Onde foste enterrar o teu tempo mais precioso? Viveste verdadeiramente? Sim ou não? Repara, dizemos para nós mesmos, repara como o mundo arrefeceu. Passarão ainda mais anos e, após eles, virá a triste solidão, virá com a sua bengala a vacilante velhice e, após eles, o tédio e o desespero. O teu mundo fantástico empalidecerá; os teus sonhos morrerão, fenecerão, cairão como as folhas mortas caem das árvores.  


"Noites Brancas" / Fiódor Dostoiévski  (1848) 


4 comentários:

  1. Respostas
    1. Acho que só fecham mesmo no fim do livro! Livro que, já agora acrescento, foi o primeiro que li estes ano.

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    2. Melhor que eu que este ano ainda não li nenhum! E já tenho saudades!
      Vamos lá ver se este ano volto a dar uma oportunidade a Haruki Murakami.
      Beijinho

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    3. Eu passei de Dostoiévski para Steinback (já citei aqui no blogue o "Ratos e Homens" que gostei bastante) e agora estou a ler "As vinhas da ira", já passei as 100 primeiras páginas, e estou a gostar bastante também. É considerada uma das suas melhores obras, e acho que me cai bem, porque ele defende intransigentemente os direitos dos trabalhadores. Mas tenho tanta coisa pendente para ler que às vezes nem sei para onde me virar!
      Obrigado pela visita. Bom fim-de-semana.
      Beijinho

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