sábado, 14 de julho de 2018

Quando Ele Deixou de Lhe Saltar Para Cima

É sabido que as relações dos casais podem ter problemas de vária ordem. Só assim de repente estou a pensar nos ciúmes doentios, muitas vezes da vida do outro em que o casal ainda nem sequer se conhecia ("antes de mim o dilúvio"); as diferenças comportamentais em casa; personalidades incompatíveis; a gestão do dinheiro; e por fim, e não menos importante, claro, o sexo.

Quando nos interessamos por alguém (por norma) não sabemos como o outro é do ponto de vista sexual. A pessoa pode ser mais ou menos culta, mais ou menos bonita, mais ou menos qualquer outra coisa qualquer, mas não sabemos como ela é do ponto de vista sexual. Digo por norma, porque eu ainda sou do tempo em que primeiro conhecíamos a pessoa, sabíamos o seu nome e a sua maneira de ser e só depois, mais à frente, se entrava noutras aventuras, ao passo que hoje em dia nem sempre é bem assim. Hoje em dias, muitas vezes as pessoas encontram-se, dão umas traulitadas com perfeitos desconhecidos, e de quem nada sabem, e isso não invalida que depois de umas ramboiadas, as pessoas até se queiram conhecer e entrem numa relação afetiva. Mas "por norma", o percurso natural nos humanos não é esse. Conhece-se a pessoa e então só mais à frente desvendamos alguém que só quer fazer sexo com a luz apagada, ou alguém verdadeiramente ninfomaníaca que não descansa enquanto não nos esvaziar o saco escrotal!

As pessoas conhecem-se, apaixonam-se, entram numa relação e têm sexo (não necessariamente por esta ordem, pois como disse anteriormente podem ter sexo, conhecer-se, apaixonar-se e só depois entrar numa relação ou nunca sequer se apaixonarem). E "por norma" as pessoas vão-se ajustar em tudo. Nos interesses, na divisão do tempo, nas escolhas para sair, e também poderão ter necessidade de se ajustar no sexo, pois quem vê caras não vê libidos. Tentarão ajustar o número de vezes, a variedade, a duração, tudo na tentativa de manter ambos os elementos mais ou menos satisfeitos.

A relação segue o seu percurso, mais ou menos feliz, e sempre numa base de fidelidade, com mais ou menos sexo, que "por norma" irá acentuadamente decrescer ao longo do tempo, mas o casal vai vivendo bem com isso. Mas o que acontece se, de repente, um dos elementos do casal não mais quer ter sexo? Como é que ficamos?

E eu estou em crer que, numa relação nenhuma pessoa chega ao pé do outro e diz "olha, ando sem vontadinha nenhuma. Por favor deixa-me estar no meu canto. Não me apetece. Agora se te apetecer usa as mãozinhas, ou compra uns brinquedos porque eu não estou para aí virado(a) e não sei quando ou se voltarei a estar".

Não, "por norma" imagino que os problemas simplesmente se vão empurrando para a frente como a dívida portuguesa. Quem não tem vontade não procura o outro. Se o outro não procura ótimo, problema resolvido. Mas se procura então vai ter de arranjar desculpas. É o cansaço; são as dores de cabeça; é o sono; é o ter de levantar cedo de manhã; é a desculpa de andar deprimido; porque afinal o Benfica não foi penta; porque a seleção foi eliminada no mundial e não há clima; qualquer desculpa servirá. E não se faz hoje; não se faz amanhã; não se faz para a semana; não se faz daqui por um mês. Quando se dá conta não se faz há anos.

Foi ao ler este artigo em que uma mulher se queixa que só tem uma vez sexo por ano com o marido, que relembrei um caso que fui acompanhando de perto, e em que se passaram vários anos até que a mulher tivesse decido pôr ponto final na relação.

"Ainda sou muito nova para passar o resto da vida sem sexo", disse-me.



E o que é que se faz numa situação destas? Quem não quer sexo sente-se incomodado com as pressões do outro para o fazer. Quem quer fazer sente-se completamente frustrado e diminuído na sua auto-estima. Começa-se a ficar farto de ouvir "só pensas nisso" como se desejar a pessoa que se ama fosse uma doença, como se quem tem vontade de está ali pronto para a ação é que estivesse errado. É a frustração e a culpa de, por exemplo ter de meter mãos à obra para acalmar o problema quando, supostamente, um companheiro(a) serve também para não ter que se usar as mãos sozinho.
As dúvidas começam a assaltar-nos a mente. "Ele(a) ainda gosta de mim"? "Será que já não me deseja?" "Será que tem outro(a)"? "Será que afinal descobriu que é gay"? Isto não é minimamente saudável, mas quando se gosta deixa-se a situação ir-se arrastando, mantendo a secreta esperança que aquilo seja só "uma fase". O problema é quando a fase passa a ser o estado habitual e até nós já nos cansamos de tentar.

E se até aqui só ouvíamos os homens queixarem-se das eternas dores de cabeça das mulheres que não queriam nada "ir ao castigo", agora, fruto no meu entender da sua emancipação, são também as mulheres que reivindicam a sua sexualidade e saem porta fora se os companheiros ficam eternamente com enxaquecas e sem vontade nenhuma de lhes saltarem para cima.

Lembro-me de ouvir, nos tempos em que ainda via televisão, a ginecologista Maria do Céu dizer que aconselhava sempre as suas pacientes a fazer sexo com os maridos quando eles queriam. Não estão com vontade? Deixem-se levar na mesma. Depois de começarem começam a lubrificar, ficam excitadas e até vão gostar. Aliviam a pressão dos os companheiros e no fim ficam todos satisfeitos.

Outra coisa que acho é que, excluindo situações de doença, ou de tomas de medicamentos que tenham implicações na libido, a ausência de sexo, ou a falta de intimidade no casal, seja por ambos ou por parte só de uma das pessoas, "por norma" significará que algo não vai bem no reino de suas majestades. Acho que o sexo poderá ser um bom barómetro da relação, mas, logicamente, tendo em conta que, nada será igual aos primeiros tempos, porque aos poucos tudo está desvendado. Mas quando, sem nada que o fizesse esperar, as coisas mudam radicalmente, então é porque algo se passa. E se, como eu costumo dizer, não vai ser o sexo que vai manter uma relação insuportável, pode muito bem ser o sexo um motivo que, aos poucos, possa começar a minar uma excelente relação.

E como é que se resolve então uma situação em que, numa relação baseada na fidelidade, um deixa de querer sexo?
- Deve a pessoa sujeitar-se a estar toda a vida sem sexo, porque afinal é "na saúde e na doença" e se for preciso toda a vida sem sexo só porque o outro não quer?
- Tentar falar, expor o que se sente e se as coisas não melhorarem termina-se a relação?
- E se a pessoa que não quer sexo se virasse para a pessoa que e lhe desse um livre trânsito para ela, só durante o tempo que durasse o retiro sabático, pudesse fornicar com quem quisesse? Não seria isso aceitável? Mas também ninguém disse que a outra pessoa aceitaria não é?

Não será nada fácil. E foi por isso que na situação que fui acompanhando ela acabou mesmo por ter de terminar com a relação que era vista por todos como a relação perfeita. Ela passou a ser a má da fita, a cabra (ou outro animal se preferirem), porque abandonou o lar e deixou um excelente marido. Na volta tem algum amante a puta. Só que nunca ninguém soube que as coisas acabaram tão simplesmente porque ele deixou de lhe saltar para cima. Pois é...

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