Cada vez menos me apetece sair da cama de manhã, ainda que nunca tenha precisado de despertador. Se antes da mudança da hora de Outono é a luz que penetra por entre os orifícios do estore que me desperta, agora é o desconfortável entumescimento pressionado contra o colchão que me acorda para aliviar a bexiga. Mas o que apetece é ficar no quentinho da cama e cagar para esta vida de escravidão. Tem sido com cada vez maior sacrifício que lá atiro os cobertores para trás e encaminho-me para o quarto-de-banho para me meter debaixo do chuveiro. É de novo a muito custo que lá fecho a torneira e saio da banheira com os longos cabelos ainda pingar nos pés, e me enrosco na toalha para regressar ao quarto, para aplicar a merda da espuma gélida na psoríase e vestir-me para ir para o pequeno-almoço. E é quando as necessidades básicas estão saciadas que apetece, de novo, voltar para a cama e saciar a necessidade que ainda não está totalmente saciada: o sono.
É ainda de noite e com as luzes da rua acesas que lá tenho ir à cavalariça, carregar no botão da ignição e acordar o cavalo preto para me levar até à empresa que dista vinte e cinco quilómetros de casa. À hora que nesta altura do ano poderia estar a acordar é a hora a que tenho que começar a trabalhar. Entretanto nove horas depois, à hora que saio da empresa é de novo de noite. Um dia da minha vida, um dia atrás do outro, desperdiçado, fechado todo o dia num caixote de cimento, sem janelas nem luz natural. Dias e dias perdidos sem sequer ver sequer a luz do dia.
E de repente lembro-me de quando era criança e via os pintainhos em caixotes de cartão com a luz de um candeeiro por cima, para os aquecer. Estamos no século XXI e a vida dos seres humanos é igual às dos pintainhos. Dias passados dentro de grandes caixotes, não de cartão mas de cimento e iluminados por luz artificial, cumprindo uma função estúpida e desperdiçando as suas vidas enclausurados.
Hoje acordei às 6 horas e já não dormi. Às 8 já estava a pé...Custa-me acordar com dias escuros e que o final do dia seja anunciado também com pouca luz bastante cedo. Se chove tudo piora. E tudo melhora no verão. Se tivesse de ir viver para países mais a norte morria. Ainda que digam que a gente a tudo se habitua. A rotina do trabalho não é lá muito gloriosa, não.É o que temos de fazer. Herdamos isso. Pode ser que daqui a gerações seja diferente. Dizem que no futuro haverá menos trabalho, semanas de 4 dias de trabalho...mas não sei o que isso poderá significar ao certo. São tudo especulações. Para mim, o ideal seria o meio-tempo de trabalho. Se pudéssemos ganhar o suficiente assim, isso seria óptimo.Assim resta-nos ser pintainhos e às vezes nem lâmpada.
ResponderEliminarÀ medida que vamos envelhecendo não precisamos dormir tantas horas. Mas enerva-me sair de noite de casa e chegar de noite a casa, sem ver a luz do dia, sem apanhar sol. Que as coisas vão melhorar já se dizia nos anos oitenta. Que os computadores iam substituir as máquinas de escrever e nem papel ia ser preciso; que íamos trabalhar menos horas. Tudo mentiras. Cada vez temos menos tempo para nós, cada vez os impostos são maiores e os salários mais baixos. Trabalhamos para comer e pagar contas. Tempo livre de qualidade que é bom nem vê-lo. E por cá nem a merda das 35H semanais para todos nos deram. O peso da escravidão sente-se mais no Outono/Inverno...
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