terça-feira, 9 de janeiro de 2024

O PSD Morreu em 1980 e Foi Enterrado Junto com Sá Carneiro

 
Tinha eu quatro anos e meio e, como é óbvio, não percebi muito bem o que estava a acontecer na altura, mas ainda guardo essa memória viva do acontecimento da morte de Sá Carneiro em 1980 e do choque geral dos adultos que me rodeavam. E não se falava de outra coisa na televisão, ainda a preto e branco. 

E, talvez estivesse no seu direito, e até porque já os egípcios eram enterrados com os próprios gatos, e, ao ser enterrado, Sá Carneiro, ter-se-à feito acompanhar na cova do partido que fundou: o Partido Social Democrata.

Mais de quarenta anos volvidos, alguns continuam a levantar a voz para falar de Sá Carneiro mas, infelizmente, duvido que a maioria conheça sequer a história do próprio partido onde estão filiados. 

Segundo palavras do próprio Sá Carneiro, o "PSD é um partido de esquerda sem qualquer afinidade com as forças de direita". No seu plano ideológico e político, dizia-se inspirado no socialismo humanista, inerente aos partidos sociais-democratas da Europa ocidental, aceitando os ideais do socialismo e procurando realizá-lo através de uma sociedade livre e democrática. Era pois seu objetivo declarado a luta pela democracia e pelo socialismo, com um predomínio do interesse público sobre o privado, pugnando-se pelo controlo através das autarquias, sindicatos, cooperativas, co-gestão e fiscalização por parte dos trabalhadores, empresas de economia mista e nacionalizações. 

Podemos considerar que no papel, o PS de Mário Soares e o PSD de Sá Carneiro, eram dois partidos de esquerda, ambos socialistas. A este respeito podemos lembrar factos interessantes: o PSD teve um jornal intitulado "Pelo Socialismo", colocava nos próprios cartazes "pelo socialismo" e Sá Carneiro quis até que o partido integrasse a Internacional Socialista. 

Infelizmente foram meras intenções. Lembrar que, por exemplo, Natália Correia, a escritora, foi deputada do PSD porque admirava Sá Carneiro, mas saiu em litígio com o partido porque o considerou extremamente conservador. Natália Correia votou, por exemplo, ao lado do PCP na questão do aborto e contra o próprio partido onde estava (mais tarde viria a ser deputada do PRD porque admirava Ramalho Eanes).

Sá Carneiro morreu em 1980 e com ele morreu o PSD socialista, de esquerda e inspirado na social democracia alemã. Que diria hoje Sá Carneiro se visse os cartazes que por aí andam, do próprio partido que fundou, e que dizem "o socialismo empobrece"? Certamente acrescentaria à frente: os ricos. "O socialismo empobrece os ricos".

E é neste o saco de gatos que o PSD atual se tornou, confundindo-se com a própria extrema-direita, e lembrar também que o líder dessa mesma extrema-direita esteve 17 anos no PSD e foi lançado por Passos Coelho. No entanto diz-se "anti-sistema", apesar de andar no "sistema" todos estes anos e ser financiado pelos grandes grupos económicos. 

A social democracia que Sá Carneiro dizia defender  podemos encontrá-la hoje, por exemplo, no Bloco de Esquerda, considerada, agora, por alguns ignorantes, de "extrema-esquerda". E, ou são ignorantes e não sabem que os partidos de extrema-esquerda já não existem em Portugal desde o PREC, ou então sabem que não existe mas continuam a propagandear "extrema-esquerda" ou "radical" (que significa ir à raiz) por pura má fé e para enganar as pessoas. A Isabel Moreira, que nem é do Bloco de Esquerda nem do Partido Comunista Português, já o explicou muito bem:

"Talvez seja notícia para alguns, mas não há extrema-esquerda em Portugal. Já houve , o PRP ou o Projeto Global ( que incluía as FP - 25). Felizmente o PCP resistiu a quem dele se afastou para tais derivas e presta até hoje um papel fundamental na democracia .

"Imaginar que o BE, por seu turno, é uma ameaça aos nossos valores constitucionais basilares é delírio . Talvez por isso parar com simetrias absurdas e perceber que PCP e BE não foram - como se viu na geringonça - nenhuma ameaça para os direitos de quem quer se seja".

Mas eu escrevi que Sá Carneiro "dizia defender" porque só poderíamos saber se, de facto, iria defender a mesma ideologia ou ou metê-la na gaveta, tal como, por exemplo, Mário Soares meteu na gaveta o socialismo, retirando o partido da esquerda e arrastando-o para o centro. E a minha convicção, é que o PSD, pejado de reacionários e conservadores (que mandaram embora do país Saramago, o único Nobel que tivemos - porque o outro que partia cabeças não conta!) a minha convicção é que o PSD se iria naturalmente mover para a direita.

Para se saber um mínimo de política é preciso conhecer-se a história dos partidos. Saber de onde vieram e onde estão hoje. Um partido não é um clube de futebol. Devemos votar naqueles que defendem os nossos interesses, naqueles que consideramos mais capazes e não, cegamente, numa carinha laroca ou numa voz colocada, tal como os portugueses votaram, por exemplo em 2011, em Passos Coelho. No momento mais difícil da nossa recente democracia, foram a correr a votar naquele que se tornou o primeiro-ministro mais impreparado e mentiroso que há memória.  

E agora para finalizar tenho uma pergunta a todos aquele que votam no PSD. Até podem ser militantes. Por acaso sabem o que significam aquelas três setas no símbolo do partido? Pequena ajuda: a resposta está numa das imagens acima. 


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