domingo, 13 de agosto de 2023

O Amor Para Sempre é o Amor Impossível


"A 8 de março de 1933, o poeta Pedro Salinas escreveu uma carta manuscrita dirigida à sua amante, Katherine Whitmore, que constituiu um dos monumentos literários ao amor mais desconhecidos e melhores expressos, do século XX. Não é à toa que Salinas ficou conhecido, na geração de 27, como o “poeta do amor”; não é também à toa que os seus melhores trabalhos, que se acreditava serem dirigidos a Margarita Bonmatí, sua esposa, foram na verdade dirigidos a Whitmore, com quem viveu um amor apaixonado e febril durante 15 anos em que mal se viram.

“Eu continuo a falar, tenho que continuar a falar das tuas cartas. Elas possuem-me, estão presentes em mim, sou impedido pelo que me impede de pensar nelas. Vejo, entre sonhos, minhas linhas verdes, sobre o azul listrado em dois tons. (Aquela faixa azul que parece luz de verão filtrada por uma persiana)” é o início da carta.


Em 2002 foi publicado um livro surpreendente: Salinas's Correspondence with Whitmore: Letters to Katherine Whitmore. O epistolário secreto do grande poeta do amor. Surpreendente por vários motivos, desde logo porque Withmore sempre foi escrupulosamente discreto sobre o relacionamento (tão secreto que quase ninguém sabia, e quando Margarita Bonmatí, esposa do poeta soube, tentou o suicídio), e só permitiu a sua publicação quando ele morreu (foi cedido  à Universidade de Harvard em 1999 por instruções de Whitmore, que morreu 15 anos antes). Surpreendente também, porque naquelas cartas de Salinas há uma exibição absoluta da sua intimidade que é avassaladora. Referimo-nos ao autor de La voz a ti due (1933) e Razón de amor (1936), dois poemas universais escritos na febre dos seus sentimentos por Withmore; portanto, cartas particulares também escritas na época em que deixou essas obras.

Após a tentativa de suicídio da esposa de Salinas, Katherine Whitemore tentou romper o relacionamento. O casal Salinas-Bonmatí viveu nos Estados Unidos durante o exílio. Na verdade, eles viram-se sobretudo nos primeiros meses que ela passou em Madrid. Houve muito poucos encontros nos 13 anos seguintes, embora tenham deixado uma enorme correspondência. Foi um amor antes do amor, platónico e desenfreado, que, ao não se consumar, ajudou Salinas a escrever sobre ele de uma forma que ele não poderia ter escrito. A musa no seu melhor. "A vida realizada, a vida de facto e a vida desejada, a vida na esperança, são duas áreas diferentes, tragicamente separadas."


Histórias de Amor 2 / Publicado no jornal El País a 9 de Agosto de 2023


Eu tendo a concordar que o único amor para sempre é o que não é vivido, é aquele que não possui, é o que quer mas mas que, por algum motivo não pode ter. É o amor que sobrevive à rotina, às toalhas pelo chão, às dores de cabeça, ao cansaço da lida doméstica... Mas também porque, como dizia Oscar Wilde: "Cada pessoa acaba por matar a coisa que ama". Mata-a, se calhar, quando sente que a tem completamente"...

2 comentários:

  1. Respostas
    1. Olá! Sim, achei mesmo muito interessante! O El País tem vindo a publicar umas histórias de amor, por exemplo a última é sobre dois jovens que se conhecem a casam em plena ditadura de Franco e vivem na clandestinidade e são presos.. muito muito bonito!

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