segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Amar a sério

Ontem à noite, depois de jantar, apanhei na RTP uma reportagem que pretendia dar uma ideia de como se vive a sexualidade em Portugal nas diferentes idades, e que abordou até junto de uma investigadora que se dedica a estudar estas coisas "chatas" do sexo, quais os fatores recentes que contribuíram para uma mudança de comportamentos. Explicou a senhora que identificou três  fatores: O "25 de abril", as telenovelas brasileiras e a Internet. Mas quase nada do que foi mostrado ao longo da reportagem me surpreendeu, nem mesmo o facto de em 1960 só 1,1% dos casamentos dar em divórcio, ao passo que em 2012 subiu para os 73,4%!

O que me chamou realmente a atenção, foi quando a jornalista, vestindo a pele de Carrie Bradshaw do Sexo e a Cidade deixa a pergunta: "Mas haverá quem faça da traição uma forma de manter o casamento?" 
E então entrevista uma senhora que, com a cara oculta por uma planta e voz modificada, e já com idade para ter juízo e saber bem o que quer - também se não é depois dos cinquenta nunca mais seria! - começa logo por esclarecer muito bem as coisas para que não hajam dúvidas nos telespetadores: "Eu amo o meu marido. Mas amo-o a sério!" Claro que ama, aliás, quem sou eu para julgar quem quer que seja, ainda para mais uma pessoa que desconheço, mas quis-me parecer que a senhora ao afirmar o que disse, quer antes de mais convencer-se disso a si mesma, para que continue tudo bem na sua cabeça. Aliás, não deixou de ser até caricato que, depois ter ter afirmado solenemente que o ama, seguidamente explica todas as razões do seu descontentamento para o trair! Mas ama-o a "sério". Claro.


E de seguida abordou-se um desses sites que se dedicam a permitir o contacto entre pessoas casadas que querem dar umas trancadas mas sem ninguém saber, como aliás convém para manter as aparências da boa moral e dos bons costumes. E a tal senhora que ama o marido "a sério", acaba por confessar que se apaixonou por uma pessoa que conheceu no tal site. E isto não deixa de ser curioso, pois recentemente conheci dois casos em que me disseram "Ah, eles conheceram-se num site de sexo, deram umas trancadas e depois começaram a namorar". E isto deixa-me realmente a pensar.

Depois a senhora, volta a meter os pés pelas mãos referindo que "todas" aquelas pessoas que estão naquele site "não precisam pagar para ter sexo", quando a jornalista anteriormente tinha dito que os homens pagam 30€/mês para poderem estar no site! Pequeno detalhe sem importância!

No fundo este site é um excelente modelo de negócio e um enorme exemplo de empreendedorismo! Então é assim, no fundo o site contrata mulheres de borla, como esta senhora que ama o marido a sério e depois prostituem-nas junto dos homens que querem dar umas trancadas, ganhando dinheiro agindo como se fossem verdadeiros chulos e elas uma verdadeiras putas! Mas é tudo virtual, muito bem engendrado! Sublinho que foi muito bem engendrado só é pena, e parece que ninguém reparou ainda no pormenor, de violar claramente o princípio da igualdade consagrado na Constituição Portuguesa. E, neste caso, o violar por acaso até se aplica na perfeição! 

Foi dito que o site nasceu na Holanda, não sei se a representante em Portugal alguma vez leu a Constituição Portuguesa, mas ela é muito clara quando fala no princípio da Igualdade: 

"Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual." 

Acho que é por demais evidente que neste caso, as pessoas registadas do site que têm um pénis são descriminadas em favor das que têm uma vagina.

domingo, 24 de novembro de 2013

Ser desempregado em Portugal

Escrever sobre a realidade do desemprego é um tema que, infelizmente, uma grande parte da população portuguesa recentemente se tornou especialista. Estamos a falar de milhões de especialistas forçados porque esse flagelo lhes bateu à porta, e não daqueles especialistas em multi-temas, que os noticiários das televisões pagam a peso de ouro para opinarem sobre-tudo-e-mais-alguma-coisa, e explicarem as notícias às pessoas como se estas fossem criancinhas de cinco anos, ou como se fossem uns atrasados mentais. 

Mas sobre este tema, creio que já me posso considerar um verdadeiro especialista. Quase dez anos depois, a empresa onde trabalhava e que prestava serviço à maior multi-nacional da sua área tecnológica fechou. Não fechou porque faltasse trabalho, porque na verdade esse nunca faltou, mas fruto da volatilidade de um mercado concorrencial em constante mudança e em consequência da crise mundial iniciada em 2008 essa multi-nacional resolveu cancelar o contrato de prestação de serviços, e apesar da empresa trabalhar para outras marcas, a administração foi, aparentemente, forçada a encerrar portas.


Foi a segunda vez que me vi na situação de desemprego forçado. A primeira vez tinha sido uma década antes, mas após alguns currículos enviados e a presença em várias entrevistas, pude quase dar-me ao luxo de escolher qual a empresa que mais me convinha. Mas dez anos depois depois o cenário é um bocadinho diferente. 

Rapidamente descobri que afinal, ser-se desempregado era agora um crime! Descontei durante mais de dez anos para a (In)segurança (Anti-)Social, que deveria ser uma espécie de seguro para o caso de ficar desempregado contra a minha vontade, entidade que deveria proteger os seus segurados, mas afinal agora só tinha direito a ser roubado nos meus direitos, mas pior, o criminoso era eu! 

Um desempregado nesta anedota de país é agora tratado como um arguido, com termo de identidade e residência. Ah pois! Descontei, fui valentemente roubado no valor do subsídio e na duração do mesmo, mas fui brindado com apresentações quinzenais na Junta de Freguesia, mais ou menos como um criminoso que tem de se deslocar à polícia. E se faltasse duas vezes à apresentaçãozinha, de imediato ficava sem subsídio para o qual descontei e era meu por direito, pois eram assim as leis quando tinha começado a descontar, e não me parece lá muito correto que o governo, só porque andou a gastar o que não tinha, arranje formas de fugir às suas obrigações, roubando os trabalhadores.

Depois existe o IEFP, vulgarmente conhecido como o centro de emprego. Para quem não é especialista em desemprego, eu explico. O centro de emprego é, basicamente a entidade que serve para cortar o subsídio de desemprego nada mais! Pelo menos aqui na minha área de residência é assim. Não, não é nada um organismo público que ajuda o empregado a voltar à vida ativa, quer conseguindo ofertas de trabalho na sua área ou formações, esqueçam isso! O centro de emprego é uma espécie de alarme que dispara quando a Junta de Freguesia comunica a violação da liberdade condicional do desempregado.

Estive com subsídio de desemprego durante ano e meio, e depois mais meio de "subsídio subsequente". Quantas vezes fui chamado por eles? Nenhuma! Zero! Durante todo este tempo tive de lá ir uma única vez porque faltei a uma apresentação. Lá, a gaija, passou-me um novo papel para entregar na Junta, pôs a sua melhor cara ameaçadora e disse-me "Para a próxima fica sem subsídiozinho"! E foi esta a minha relação com o centro de emprego de Gondomar durante os dois anos que estive a receber dinheiro do Estado. 

Agora, de vez em quando, lembram-se de mim e enviam-me uma carta. "Já está a trabalhar? Não está? Então se quiser continuar inscrito no centro de emprego devolva esta cartinha no espaço de dias senão a sua inscrição é cancela" e sai automaticamente das estatísticas, e assim o INE já pode dizer que o desemprego está a descer, acrescento eu!

Estar desempregado em Portugal é isto, é ser-se criminoso aos olhos dos governos que as pessoas elegem para, supostamente as representar e defender, e é ainda ser olhado de lado pelos outros, os que ainda têm sorte de estar a trabalhar, como se fossem entidades divinas imaculadas e que podem julgar a vida dos outros.

Certo dia encontrei um ex-colega de trabalho e em conversa ele dizia-me que, apesar de estar desempregado há pouco tempo, de vez em quando quando ia ao café, ouvia uns comentários do género "anda para aí muita gente à boa vida sem querer trabalhar" e ele achava que essas bocas seriam para ele. 
Perguntei-lhe - mas sentes-te estigmatizado? Por acaso não fizeste os teus descontos durante todos os anos que trabalhaste e não ficaste desempregado contra a tua vontade?" 
"Sim" respondeu-me ele".
- Então manda-os foderem-se!

sábado, 23 de novembro de 2013

Multi-resistente

Muita gente citando Nietzsche diz que "o que não nos mata torna-nos mais fortes", afirmação com a qual eu não concordo. 

Vamos imaginar que saímos de casa e somos atropelados. Não morremos mas ficamos paraplégicos agarrados a uma cadeira-de-rodas para o resto da vida. Será que a partir desse momento ficamos mais fortes? Mas nem é preciso ir tão longe, vamos imaginar que a coisa resultou unicamente numas fraturas, hematomas e escoriações e que em breve já andaríamos por aí alegres e contentes novamente - Será que depois desta experiências traumática sairíamos mais fortes? Não, quanto muito mais vigilantes, até porque "depois da casa arrombada trancas à porta" e passaríamos a olhar vinte vezes para a estrada antes de atravessar.



Mas vamos a outro exemplo. Vamos supor que alguém que tem uma relação de exclusividade, dessas que são sempre fieis até que se descubra prova em contrário. O gaijo chega a casa e surpreende a mulher na cama a fornicar com dois pretos - será que a partir desse momento essa pessoa vai fortalecer a sua crença no amor eterno até que a morte os separe? Cheira-me que não.

O que nos faz mal, nos agride e deixa fragilizados,  não nos torna mais fortes, deixa-nos sim mais preparados e resistentes a futuras investidas. E quando ao longo da vida resistimos e sobrevivemos a uma série de batalhas difíceis, torná-mo-nos numa espécie de super-bactéria-multi-resistente que nenhum antibiótico conseguirá aniquilar.