Mostrar mensagens com a etiqueta Alberto Caeiro. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Alberto Caeiro. Mostrar todas as mensagens

sábado, 14 de julho de 2018

Que Opinião Tenho Sobre Deus e a Criação do Mundo?

Há metafísica bastante em não pensar em nada. 

O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.

Que idéia tenho eu das cousas?
Que opinião tenho sobre as causas e os efeitos?
Que tenho eu meditado sobre Deus e a alma
E sobre a criação do Mundo?

Não sei. Para mim pensar nisso é fechar os olhos
E não pensar. É correr as cortinas
Da minha janela (mas ela não tem cortinas).

O mistério das cousas? Sei lá o que é mistério!
O único mistério é haver quem pense no mistério.
Quem está ao sol e fecha os olhos,
Começa a não saber o que é o sol
E a pensar muitas cousas cheias de calor.
Mas abre os olhos e vê o sol,
E já não pode pensar em nada,
Porque a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.

A luz do sol não sabe o que faz
E por isso não erra e é comum e boa.


Metafísica? Que metafísica têm aquelas árvores?
A de serem verdes e copadas e de terem ramos
E a de dar fruto na sua hora, o que não nos faz pensar,
A nós, que não sabemos dar por elas.
Mas que melhor metafísica que a delas,
Que é a de não saber para que vivem
Nem saber que o não sabem?

"Constituição íntima das cousas"...
"Sentido íntimo do Universo"...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão.

Pensar no sentido íntimo das cousas
É acrescentado, como pensar na saúde
Ou levar um copo à água das fontes.

O único sentido íntimo das cousas
É elas não terem sentido íntimo nenhum.
Não acredito em Deus porque nunca o vi.
Se ele quisesse que eu acreditasse nele,
Sem dúvida que viria falar comigo
E entraria pela minha porta dentro
Dizendo-me, Aqui estou!

(Isto é talvez ridículo aos ouvidos
De quem, por não saber o que é olhar para as cousas,
Não compreende quem fala delas
Com o modo de falar que reparar para elas ensina.)

Mas se Deus é as flores e as árvores
E os montes e sol e o luar,
Então acredito nele,
Então acredito nele a toda a hora,
E a minha vida é toda uma oração e uma missa,
E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos.

Mas se Deus é as árvores e as flores
E os montes e o luar e o sol,
Para que lhe chamo eu Deus?
Chamo-lhe flores e árvores e montes e sol e luar;
Porque, se ele se fez, para eu o ver,
Sol e luar e flores e árvores e montes,
Se ele me aparece como sendo árvores e montes
E luar e sol e flores,
É que ele quer que eu o conheça
Como árvores e montes e flores e luar e sol.

E por isso eu obedeço-lhe,
(Que mais sei eu de Deus que Deus de si próprio?).
Obedeço-lhe a viver, espontaneamente,
Como quem abre os olhos e vê,
E chamo-lhe luar e sol e flores e árvores e montes,
E amo-o sem pensar nele,
E penso-o vendo e ouvindo,
E ando com ele a toda a hora.


O Guardador de rebanhos / Alberto Caeiro 

sexta-feira, 13 de julho de 2018

Ironias Bíblicas

Estamos no ano 2018. Nunca como agora tivemos ferramentas ao nosso dispor para investigar e tentar chegar um pouco mais perto da verdade. Ainda assim, e mesmo sendo o povo muito instruído, e tendo ferramentas ao seu dispor para investigar e se informar, é comummente aceite que os jornais dizem aldrabices. Ou seja, ainda assim, é perfeitamente reconhecido por todos nós que muitos média como jornais e televisões manipulam e mentem.

Há muitos séculos atrás o povo não tinha instrução. Nem sequer sabia ler. E então publicaram-se uns escritos, que mais não são do que cópias de cópias de cópias, porque convenientemente os originais perderam-se todos, e disse-se nesse tempo que esses escritos eram a "palavra de deus" e era para cumprir à risca senão ia tudo arder no fogo do inferno. E o povo, sem instrução e que não sabia ler acreditou. 

Em 2018 aceitamos tranquilamente que, apesar de sabermos ler, de termos bibliotecas,  jornais, revistas, televisões, e podermos confrontar toda essa informação e termos internet à descrição, aceitamos que os média nos mentem. Contudo, ainda assim, mesmo hoje, em 2018, uma grande parte da população, instruída e esclarecida, acredita piamente naqueles conjunto de escritos, naquelas cópias de cópias de cópias de sabe-se lá o quê, e afirma cegamente que aquilo é a "palavra de deus"! 

Em 2018 aceita-se que as televisões mentem. Que os jornais mentem. Mas ai de que diga que há mais de dois mil anos alguém mentiu ou manipulou o povo que nem ler sabia. 



sábado, 7 de julho de 2018

Porque Não Tinha que Ser

Se eu morrer novo, 
Sem poder publicar livro nenhum, 
Sem ver a cara que têm os meus versos em letra impressa, 
Peço que, se se quiserem ralar por minha causa, 
Que não se ralem. 
Se assim aconteceu, assim está certo. 

Mesmo que os meus versos nunca sejam impressos, 
Eles lá terão a sua beleza, se forem belos. 
Mas eles não podem ser belos e ficar por imprimir, 
Porque as raízes podem estar debaixo da terra 
Mas as flores florescem ao ar livre e à vista. 
Tem que ser assim por força. Nada o pode impedir. 

Se eu morrer muito novo, oiçam isto: 
Nunca fui senão uma criança que brincava. 
Fui gentio como o sol e a água, 
De uma religião universal que só os homens não têm. 
Fui feliz porque não pedi cousa nenhuma, 
Nem procurei achar nada, 
Nem achei que houvesse mais explicação 
Que a palavra explicação não ter sentido nenhum. 

Não desejei senão estar ao sol ou à chuva — 
Ao sol quando havia sol 
E à chuva quando estava chovendo (E nunca a outra cousa), 
Sentir calor e frio e vento, 
E não ir mais longe. 

Uma vez amei, julguei que me amariam, 
Mas não fui amado. 
Não fui amado pela única grande razão — 
Porque não tinha que ser. 

Consolei-me voltando ao sol e à chuva, 
E sentando-me outra vez à porta de casa. 
Os campos, afinal, não são tão verdes para os que são amados 
Como para os que o não são. 
Sentir é estar distraído.