ALDOUS HUXLEY
Segundo Voltaire, a arte que os médicos praticam consiste em entreter o doente até que a Natureza o cure. Atualmente, inverteu-se a conclusão do filósofo francês: a medicina faz crer às pessoas que a Natureza as ataca constantemente com novas doenças que só podem ser curadas pelos médicos. Dado o facto de cada cultura e cada povo gerar doenças próprias, até há pouco tempo a doenças era considera ainda um fenómeno social. Neste livro falo de uma alteração ocorrida na Alemanha e no resto dos países industrializados em relação a este assunto: hoje em dia, as empresas farmacêuticas e os grupos de interesse médicos inventam doenças: a doença transformou-se num produto industrial. Para tal, as empresas e as associações convertem os processos normais da existência humana, em problemas médicos, medicalizam a vida.
É fácil inventar novas doenças e novos tratamentos", constata o British Medical Journal. "Muito processos normais da vida - o nascimento, o envelhecimento, a sexualidade, a infelicidade e a morte - podem ser medicados".
O aumento dos diagnósticos nos países industrializados assumiu proporções grotescas. Os médicos dizer ter encontrado cerca de 30 000 epidemias, síndromes e doenças no Homo Sapiens. Mas para cada doença há um comprimido. E cada vez com maior frequência, para cada comprimido, há também uma nova doença. Em inglês, o fenómeno já tem um nome: dicease mongering, tráfico de doenças.
Os inventores de doenças obtêm o seu dinheiro graças às pessoas saudáveis a quem convencem que estão doentes. Por acaso também não sofre de vez em quando de cansaço, mau humor ou de fastio? Tem dificuldades em concentrar-se? É tímido?
A venda de problemas pessoais e sociais como problemas médicos
Em neurologia, a transformação das pessoas saudáveis em doentes funciona especialmente bem, sobretudo porque "não escasseiam teorias, segundo as quais praticamente ninguém está são", como assinala com conhecimento de causa o psiquiatra hamburguês Klaus Dörner.
O número de perturbações reconhecidas oficialmente revela uma tendência: nos Estados Unidos, o número de doenças anímicas existentes aumentou de 26 para 395 a partir da Segunda Guerra Mundial.
"Sabe do que o senhor precisa? De um grama de farinha".
ALDOUS HUXLEY
"Admirável mundo Novo"
O que a uns dá de comer, a outros tira-lhes o seu bem mais precisoso, a saúde. A crítica norte-americana Lynn Payer verifica o seguinte: a conduta do inventor de doenças "destrói a nossa confiança em nós próprios e isso sim, faz-nos adoecer". Transformando-nos num povo de inválidos saudáveis, não atacados pela enfermidade, mas tolhidos por causa da ilusão de estarmos doentes? O médico e escritor norte-americano Lewis Thomas foi um dos primeiros a alertar para este perigo: "Se continuarmos a ouvir estas charlatanices, corremos o rico de nos transformarmos um povo de hipocondríacos saudáveis, que vive mergulhado no desalento e que se angustia quase até à morte.
Uma pessoa saudável foi mal examinada.
OPINIÃO MÉDICA
Em aproximadamente metade das pessoas que vão ao médico não é possível provar que padecem de qualquer enfermidade orgânica, mas isso não dá para o sistema sanitário viver: os formulários dos seguros, as caixas complementares médicas e as caixas de aposentação exigem que se registe um diagnóstico.
Com uma desfaçatez de pasmar, inventam-se doenças doenças e epidemias que na realidade não existem. as denominadas "não doenças".
Lista de êxitos das "não doenças"
1. A velhice
2. O trabalho
3. O aborrecimento
4. Os papos nos olhos
5. A ignorância
6. A calvície
7. As sardas
8. As orelhas de abano
9. O cabelo grisalho ou branco
10. Ser feio
11. O parto
12. A alergia ao século XXI
13. O jet lag
14. Ser infeliz
15. A pele laranja
16. A ressaca
17. O medo do tamanho do pénis/inveja do pénis
18. A gravidez
19. Os acessos de fúria em plena circulação viária
20. A solidão
A "indústria farmacêutica tem nessa altura um papel-chave na medicalização", comenta David Gilbert, perito em saúde de Londres. "Assim que um medicamento está disponível, as campanhas da indústria tentam redefinir a doença na cabeça dos médicos e dos potenciais pacientes." Os supostos problemas de saúde são apresentados como um enfermidade, e a melhor maneira de combatê-los é através de produtos farmacêuticos".
Muitas pessoas são sensíveis a esta estratégia. É indiferente que se trate de calvície, de mau humor ou de obesidade; assim que a medicina moderna fornece uma causa biológica e a possibilidade de um tratamento para o problema, dá-se uma transformação maravilhosa: o desejo de ser mais feliz, ou a preocupação com a queda de cabelo,transforma-se imediatamente num problema médico.
Psicofárcos no Recreio
Mas a verdadeira carreira dos SHDA só começa algumas décadas mais tarde. Deve-se a uma descoberta casual de laboratório: Leandro Panizzon, um químico da empresa Ciba, sintetizou o metilfenidato em 1944 e experimentou-o em si próprio, sem obter qualquer resultado digno de menção. Mas a sua mulher Margarita, ou Rita, provou também aquela substância e verificou um efeito bastante estimulante. Posteriormente Rita foi tomando a substância com regularidade antes de jogar ténis, pelo que o químico batizou a substância com o nome dela: Ritalin.
A princípio, o remédio só foi ministrado a adultos para tratar estados de cansaço intenso, quadros depressivos e episódios de confusão no envelhecimento: ainda não fora inventado o quadro clínico que tornaria tristemente célebre o Ritanlin.
O dilema da indicação médica inexistente foi resolvido pelos médicos americanos nos finais dos anos 60 com um truque cujas consequências ainda se fazem sentir hoje em dia: o medicamento em si mesmo podia ser usado, segundos os cientistas, para diagnosticar a doença das crianças: aquele que ingerir o fármaco modificava o seu comportamento, estava doente. Inversamente, as crianças saudáveis não reagiam à substância.
Esta jogada de mestre abriu caminho à venda de psicofármacos a crianças em quantidades industriais.
Muito bom, obrigado.
ResponderEliminarObrigado eu pela visita.
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