domingo, 24 de novembro de 2013

Ser desempregado em Portugal

Escrever sobre a realidade do desemprego é um tema que, infelizmente, uma grande parte da população portuguesa recentemente se tornou especialista. Estamos a falar de milhões de especialistas forçados porque esse flagelo lhes bateu à porta, e não daqueles especialistas em multi-temas, que os noticiários das televisões pagam a peso de ouro para opinarem sobre-tudo-e-mais-alguma-coisa, e explicarem as notícias às pessoas como se estas fossem criancinhas de cinco anos, ou como se fossem uns atrasados mentais. 

Mas sobre este tema, creio que já me posso considerar um verdadeiro especialista. Quase dez anos depois, a empresa onde trabalhava e que prestava serviço à maior multi-nacional da sua área tecnológica fechou. Não fechou porque faltasse trabalho, porque na verdade esse nunca faltou, mas fruto da volatilidade de um mercado concorrencial em constante mudança e em consequência da crise mundial iniciada em 2008 essa multi-nacional resolveu cancelar o contrato de prestação de serviços, e apesar da empresa trabalhar para outras marcas, a administração foi, aparentemente, forçada a encerrar portas.


Foi a segunda vez que me vi na situação de desemprego forçado. A primeira vez tinha sido uma década antes, mas após alguns currículos enviados e a presença em várias entrevistas, pude quase dar-me ao luxo de escolher qual a empresa que mais me convinha. Mas dez anos depois depois o cenário é um bocadinho diferente. 

Rapidamente descobri que afinal, ser-se desempregado era agora um crime! Descontei durante mais de dez anos para a (In)segurança (Anti-)Social, que deveria ser uma espécie de seguro para o caso de ficar desempregado contra a minha vontade, entidade que deveria proteger os seus segurados, mas afinal agora só tinha direito a ser roubado nos meus direitos, mas pior, o criminoso era eu! 

Um desempregado nesta anedota de país é agora tratado como um arguido, com termo de identidade e residência. Ah pois! Descontei, fui valentemente roubado no valor do subsídio e na duração do mesmo, mas fui brindado com apresentações quinzenais na Junta de Freguesia, mais ou menos como um criminoso que tem de se deslocar à polícia. E se faltasse duas vezes à apresentaçãozinha, de imediato ficava sem subsídio para o qual descontei e era meu por direito, pois eram assim as leis quando tinha começado a descontar, e não me parece lá muito correto que o governo, só porque andou a gastar o que não tinha, arranje formas de fugir às suas obrigações, roubando os trabalhadores.

Depois existe o IEFP, vulgarmente conhecido como o centro de emprego. Para quem não é especialista em desemprego, eu explico. O centro de emprego é, basicamente a entidade que serve para cortar o subsídio de desemprego nada mais! Pelo menos aqui na minha área de residência é assim. Não, não é nada um organismo público que ajuda o empregado a voltar à vida ativa, quer conseguindo ofertas de trabalho na sua área ou formações, esqueçam isso! O centro de emprego é uma espécie de alarme que dispara quando a Junta de Freguesia comunica a violação da liberdade condicional do desempregado.

Estive com subsídio de desemprego durante ano e meio, e depois mais meio de "subsídio subsequente". Quantas vezes fui chamado por eles? Nenhuma! Zero! Durante todo este tempo tive de lá ir uma única vez porque faltei a uma apresentação. Lá, a gaija, passou-me um novo papel para entregar na Junta, pôs a sua melhor cara ameaçadora e disse-me "Para a próxima fica sem subsídiozinho"! E foi esta a minha relação com o centro de emprego de Gondomar durante os dois anos que estive a receber dinheiro do Estado. 

Agora, de vez em quando, lembram-se de mim e enviam-me uma carta. "Já está a trabalhar? Não está? Então se quiser continuar inscrito no centro de emprego devolva esta cartinha no espaço de dias senão a sua inscrição é cancela" e sai automaticamente das estatísticas, e assim o INE já pode dizer que o desemprego está a descer, acrescento eu!

Estar desempregado em Portugal é isto, é ser-se criminoso aos olhos dos governos que as pessoas elegem para, supostamente as representar e defender, e é ainda ser olhado de lado pelos outros, os que ainda têm sorte de estar a trabalhar, como se fossem entidades divinas imaculadas e que podem julgar a vida dos outros.

Certo dia encontrei um ex-colega de trabalho e em conversa ele dizia-me que, apesar de estar desempregado há pouco tempo, de vez em quando quando ia ao café, ouvia uns comentários do género "anda para aí muita gente à boa vida sem querer trabalhar" e ele achava que essas bocas seriam para ele. 
Perguntei-lhe - mas sentes-te estigmatizado? Por acaso não fizeste os teus descontos durante todos os anos que trabalhaste e não ficaste desempregado contra a tua vontade?" 
"Sim" respondeu-me ele".
- Então manda-os foderem-se!

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