quinta-feira, 30 de março de 2017

Quando a Beleza ainda era Natural II

Marilyn Lange (Playmate do Ano 1975)

Como Água para Chocolate

Tita, de joelhos, inclinada sobre o metate, movia-se rítma e cadencialmente enquanto moía as amêndoas e o gergelim.  
Sob a sua blusa os seus seios oscilavam livremente pois usa nunca usara qualquer soutien. Do seu pescoço escorriam gotas de suor que rolavam para baixo seguindo o sulco de pele entre os seus peitos redondos e duros. 
Pedro, não podendo resistir aos cheiros que emanavam da cozinha, dirigiu-se para ela, ficando petrificado na porta diante da postura sensual em que encontrou Tita.
Tira ergueu o olhar sem deixar de se mover e os seus olhos encontraram os de Pedro. Os seus olhares apaixonados fundiram-se imediatamente de tal maneira que quem os tivesse visto só teria notado um olhar, um único movimento rítmico e sensual, uma única respiração agitada e um mesmo desejo. 



Permaneceram em êxtase amoroso até que Pedro baixou a vista e a cravou nos seios de Tita. Esta deixou de moer, endireitou-se e orgulhosamente ergueu o peito, para que Pedro o observasse plenamente. O exame de que foi objeto mudou para sempre a relação entre eles. Depois desses pescrutrante olhar que penetrava a roupa já nada voltaria a ser igual. Tita soube na prórpia carne por que é que o contacto com o fogo altera os elementos, por que é que um bocado de massa se converte em pão, por que é que um peito sem ter passado pelo fogo do amor é um peito inerte, uma bola de de massa sem qualquer utilidade. Em apenas alguns instantes Pedro tinha transformado os seios de Tita de castos em voluptuosos, sem precisar de lhes tocar. 

Como água para chocolate / Laura Esquivel / 1989

domingo, 26 de março de 2017

Sussurro-te ao ouvido...


I whisper in your ear
"Do you dream of me?"



Do you dream of me? / Wildhoney / Tiamat / 1994

Questionário: O que é que a fotografia do teu perfil diz sobre ti?

Estava aqui a passar os olhos pela imprensa domingueira, sempre tão repleta de entretenimentos ao domingo, e dou de caras com um daqueles pequenos questionários, acerca das nossas imagens de perfil. Muitas vezes estes questionários valem tanto como o horóscopo diário que vem nas revistas, mas ainda assim, tal como nos horóscopos, às vezes também acho piada a alguns destes questionários.

Segundo o questionário, as nossas imagens de perfil das redes sociais, dizem mais sobre nós, do que nós pensamos. E então o questionário coloca-nos as seguintes questões:

1. Com que frequência mudas a imagem de perfil no Facebook?
(A) uma vez por ano (B) várias vezes por ano (C) pelo menos uma vez por mês

2. A foto que tens no Twitter, é (A) uma foto mesmo tua, ou (B) um avatar?

The Guardian (foto Alamy
Resultados:

Se respondeste (A) à pergunta 1, então o mais provável é que sejas extrovertido.

Se respondeste (C)
então o mais provável é seres um introvertido, com (B) pelo meio.

Um estudo do Centro de Segurança Cibernética da Universidade de Warwick descobriu que os participantes com pontuação elevada na extroversão mudaram sua imagem de perfil com menos frequência do que os tipos mais introvertidos: exatamente o oposto do que os pesquisadores esperavam.

Se respondeste (B) à segunda pergunta, então, novamente e de forma surpreendente, és, provavelmente um extrovertido. Se respondeste (A) és introvertido. 
Mais uma vez trocando as voltas ao que seria expectável, os pesquisadores descobriram que os introvertidos são mais propensos a usar uma foto de si mesmos como seu perfil do Twitter do que extrovertidos. Por quê? Só podemos especular, mas talvez introvertidos sejam tipos sérios que usam o Twitter para negócios ou de forma profissional (onde mostrar seu rosto é importante), enquanto os extrovertidos são mais propensos a usar o Twitter para se divertir, escolhendo avatares que representam os seus gostos de uma forma mais brincalhona.

Ora bem, eu gosto muito de psicologia, e por equivalência já devo três ou quatro doutoramentos, mas nem sempre gosto muito de generalizações do género: coças-muito-no-nariz-então-é-porque-te-masturbas-muito! Ou aqueles testes dos borrões (Rorschach) em que no fundo analisa-se as respostas de cada pessoa em função do que uma maioria já disse do que via nos borrões. É óbvio que tem a sua fiabilidade mas acho que nunca poderemos generalizar ou ser taxativos. 

Ainda assim tudo isto é muito curioso, porque eu não estou registado no Facebook nem Twitter, e só isso, segundo os psicólogos já diz que sou, muito provavelmente!, um psicopata!

Mas que poderei dizer sobre mim? 
Bom, no perfil da rede social Google+ (que agrega Blogger e Youtube), uso a mesma imagem desde o início, ou pelo menos, é sempre a imagem de um Bufo-real, avatar que uso, há pelo menos cinco ou seis anos. Ou seja, segundo o estudo da universidade isto afirma claramente que eu sou extrovertido. 

Certíssimo.

sábado, 25 de março de 2017

Primeiro Verão



No tempo dos romanos e até ao século XVI, havia o Verão (a actual Primavera), o Estio (o actual Verão), o Outono e o Inverno.

A palavra Verão provém do latim vernum, com o significado de “tempo primaveril”, derivado de ver, veris, que significava Primavera. A expressão primo ver (que originou o termo Primavera) aplicava-se apenas ao começo da estação: primo + ver = o primeiro Verão (= actual Primavera), o princípio do Verão (= Primavera).


sexta-feira, 24 de março de 2017

Brasão de Família

Via Google Images
Eu sou pobre, plebeu, nunca liguei a este tipo de coisa, da heráldica e das árvores genealógicas. Percebo o fascínio, como uma amiga que tenho, que na volta ainda é descendente de um rei. Mas eu não. Nas minhas veias corre sangue sim, mas não azul. É vermelho. Nem nunca tive especial atração pela monarquia, bem pelo contrário. 
Muitas vezes até, e estou-me a lembrar das feiras medievais, por exemplo, em que até me cruzo com pessoas que vendem os brasões do nome de família. Nunca me demorei muito a procurar o meu. Mas agora, por mero acaso, aterrei aqui num blogue onde tem ali a coisa tão esmiuçada, até achei curioso que o meu nome de família, seja um dos mais antigos do país. E esteticamente, até gosto do brasão. Mas só isso! (podem colocar aí em baixo o visto no "do que te lembras"!)

O Défice mais Baixo desde 1974


A notícia que hoje não se falará será esta. Já há dias não se falou que o Estado Português emitiu dívida pública com juros negativos, o que significa que nos vão pagar para nos emprestarem dinheiro!

Mas hoje, é oficial, o governo apoiado pelos partidos mais à Esquerda no parlamento, aqueles radicais que comem criancinhas ao pequeno-almoço!, conseguiu o feito histórico de ter o défice mais baixo desde o 25 de Abril de 1974! Mas certamente que será muito difícil descobrir a notícia. 

Hoje falar-se-à de tudo, de-não-sei quem-que-matou-não-sei-quem, do terrorismo, dos santinhos de Fátima, da namoradinha do capitão-gay da seleção de futebol, de tudo, menos desta excelente notícia, porque não interessa nada aos nossos média que são suportados pelo poder capitalista.
Muito importante é saber quantos sorrisos o Centeno mandou nas SMS ao ex-administrador da CGD, isso sim é importante, e é tema para meses a fio!

Antigamente tínhamos o lápis azul da censura, hoje temos uma censura mais refinada de tempos modernos. Mas hoje também se prova que a anterior ministra das Finanças percebe tanto de matemática como eu percebo que costura! E ainda assim não sei... quer dizer, eu se calhar percebo mais, porque ainda fiz uns belos bordados nos tempos de escola!


"Aritmeticamente é impossível" disse ela! Eu no teu lugar Maria, borrava a minha cara com merda. 

quinta-feira, 23 de março de 2017

Indigno. Impróprio. Inaceitável.


Lobo em pele de cordeiro? ou: olha para o que eu faço no Governo mas não olhes para o que eu digo na Oposição?

Partidas & Chegadas



Habilitações Necessárias para Ministro


Junho 1871

Há muitos anos que a política em Portugal apresenta este singular estado:
Doze ou quinze homens, sempre os mesmos, alternadamente possuem o Poder, perdem o Poder, reconquistam o Poder, trocam o Poder... O Poder não sai duns certos grupos, como uma péla que quatro crianças, aos quatro cantos de uma sala, atiram umas às outras, pelo ar, num rumor de risos.
Quando quatro ou cinco daqueles homens estão no Poder, esses homens são, segundo a opinião, e os dizeres de todos os outros que lá não estão — os corruptos, os esbanjadores da Fazenda, a ruína do País!


Os outros, os que não estão no Poder, são, segundo a sua própria opinião e os seus jornais — os verdadeiros liberais, os salvadores da causa pública, os amigos do povo, e os interesses do País. Mas, coisa notável! — os cinco que estão no Poder fazem tudo o que podem para continuar a ser os esbanjadores da Fazenda e a ruína do País, durante o maior tempo possível! E os que não estão no Poder movem-se, conspiram, cansam-se, para deixar de ser o mais depressa que puderem — os verdadeiros liberais, e os interesses do País!
Até que enfim caem os cinco do Poder, e os outros, os verdadeiros liberais, entram triunfantemente na designação herdada de esbanjadores da Fazenda e ruína do País; em tanto que os que caíram do Poder se resignam, cheios de fel e de tédio — a vir a ser os verdadeiros liberais e os interesses do País.

Ora como todos os ministros são tirados deste grupo de doze ou quinze indivíduos, não há nenhum deles que não tenha sido por seu turno esbanjador da Fazenda e ruína do país...

Não há nenhum que não tenha sido demitido, ou obrigado a pedir a demissão, pelas acusações mais graves e pelas votações mais hostis...

Não há nenhum que não tenha sido julgado incapaz de dirigir as coisas públicas — pela Imprensa, pela palavra dos oradores, pelas incriminações da opinião, pela afirmativa constitucional do poder moderador...

E todavia serão estes doze ou quinze indivíduos os que continuarão dirigindo o País, neste caminho em que ele vai, feliz, abundante, rico, forte, coroado de rosas, e num choito tão triunfante!

A Religião no Hospital

No dia da cirurgia, as diferentes pessoas, enfermeiras e médicos, que comigo contactaram, haveriam de me perguntar, várias vezes ao longo do dia: qual é a sua religião? E até hoje, sinceramente, não consigo perceber para quê tal pergunta. Por que não perguntar a minha orientação sexual? Por que não perguntar os meus ideias políticos? Por que não perguntar se tenho um clube preferido e qual? Por que não perguntar como é que eu gosto dos ovos, se sou omnívoro ou vegetariano?

Mas o mais engraçado é que, no inquérito que a enfermeira me fez na receção, nem sequer lá contemplava a opção "Sem Religião"! Os hospitais portugueses partem do princípio - errado! -  que toda a gente tem de ter religião! 

- Qual a sua religião? 
- Eu não tenho religião.
- Mas então é agnóstico?
- Não sou ateu mas também não sou agnóstico. E agnóstico e ateu também não são religiões. Mas eu não tenho nenhuma religião.
- Mas eu não tenho aqui "Sem religião", então vou colocar agnóstico. 

Vamos lá ver uma coisa. Vivemos num país Laico, sem religião portanto. Então, porque raio perguntam aos doentes que se dirigem a um hospital público qual a sua religião? Mas por acaso a religião é tida e achada dentro de um hospital? E do ponto de vista clínico, interessa alguma coisa a um médico saber a religião do doente? Não devemos todos ser tratados de forma igual? Então para que é que querem saber da religião das pessoas?

Ah mas ó Konigvs há pessoas que não querem transfusões de sangue porque a sua religião não permite. 

Eu sei muito bem que, por exemplo, as Testemunhas de Jeová, além de quererem aparentar uma neutralidade política - como se isso fosse possível! (mas a Esquerda agradece) - são também muito conhecidos por não aceitarem transfusões de sangue. E em Portugal existem cem mil Testemunhas de Jeová, cerca de 1% da população.

Eu sempre defendi as liberdades individuais, pois certamente também concordo que cada pessoa é que deve saber o que fazer quando está doente. Não quer receber uma transfusão de sangue? Quer morrer? Muito bem, estou totalmente de acordo, cada um está no seu direito de fazer o que bem entender. Só que existem certas vontades, ou liberdades, que colidem eticamente com as liberdades dos outros.

As pessoas são livres de ter a sua religião, seja ela qual for. Totalmente de acordo. Mas as pessoas também devem ter presente que os médicos também fazem o seu juramento: o de salvar vidas. E onde é que fica o Direito do Estado Laico? Neste momento, o meu país não me deixa morrer, se esta for a minha vontade. É crime. Mas então, com que direito, é que o mesmo país, permite que se deixe morrer uma pessoa, havendo todas as possibilidades para lhe salvar a vida?

Quer dizer, as Testemunhas de Jeová são contra a Eutanásia, mas depois são a favor que deixe morrer uma pessoa, quando poderia ser facilmente salva, bastando para isso que recebesse uma transfusão sanguínea. São contra o suicídio. Só Deus pode tirar a vida. Mas então, deixar-se morrer e esvair-se em sangue não é suicidar-se? Em que ficamos então? Defendem a vida num caso mas no outro já não? Há qualquer coisa nessa linha de raciocínio que não bate certo... Mas eu percebo, a verdade é que as pessoas que têm religião não se regem pelo raciocínio, mas pelo fanatismo. 

Se eu quero morrer o Estado não mo permite. É crime. Se eu quero viver, mas como sou fanático-religioso, e quero impedir o médico de me salvar a vida, ou a vida da minha mulher ou do meu filho, está tudo bem, até há legislação sobre o assunto! Então onde é que fica o argumento da defesa da vida no caso de quem se recusa a receber uma transfusão de sangue? Dois pesos e duas medidas. 

Pois o que eu acho é que, das duas uma: ou confiámos em Deus (no santinho a quem se fez a promessa, no Diabo ou outra divindade qualquer!) ou confiamos no médico, no cirurgião, no anestesista, e no trabalho desenvolvido pela unidade de saúde. E se as pessoas preferem confiar na vontade de Deus, e estão no seu direito, mas então nunca recorram aos médicos! Pois se adoecem é porque foi a vontade divina! - e vão agora ao médico para contrariar essa vontade? Qual é a lógica e coerência disso?

Também acho muita graça aquelas pessoas que fazem uma promessa ao santinho ou santinha. Fazem as promessas, mas depois vão fazer os tratamentos ou cirurgias no hospital. E depois, se ficam curadas, vão agradecer ao santo e dizem que foi ele que as salvou! Então mas para que é que foram ao médico? Se o santo cura, para que é que procuram os médicos? Onde estão os milagres então? Quando tiverem algum problema de saúde rezem! Rezem muito que nunca terão nenhuma doença! Mas se tiverem, não vão ao médico, afinal adoeceram por vontade de Deus! E se é Deus que vos salva, então não vão chatear os médicos! 

Uma coisa é a liberdade individual, outra é o trabalho de um médico. Qualquer doente tem o direito de não ser tratado. Mas nenhum doente pode querer que o médico o deixe morrer quando o pode salvar. Há aqui um conflito de interesses! Muito pior ainda é nos casos de menores. Cada um que decida sobre a sua própria vida, e se quer morrer ótimo, mas que não interfira nas vidas dos outros.

Um hospital é um local onde se tratam doentes que decidem ser tratados. Na missa também ninguém ensina o padre-nosso ao vigário. Portanto, para assuntos religiosos, o destino é a Igreja e não o Hospital. Não queiram misturar alhos com bugalhos.

segunda-feira, 20 de março de 2017

Há tanto tempo que não vou a um concerto de Metal...



Guardians of Asgaard / Twilight of the Thunder God / Amon Amarth / 2008

As fotografias dela: Nua

Não é que eu achasse propriamente que ia morrer, mas uma operação é sempre uma situação de risco, por mais vulgar que seja. Há pessoas que vão tirar um furúnculo e depois acabam por morrer por incompetência médica, por uma qualquer complicação, ou simplesmente por azar. E os azares acontecem a qualquer um. Nós podemos morrer a qualquer momento, talvez a nossa data até já esteja marcada, não sei, mas acho que talvez seja normal, antes de uma cirurgia, refletirmos sobre a eventualidade de podermos morrer.

No dia anterior paguei as contas. Bom, neste caso não era com medo de morrer, pois se morresse, ao menos já não tinha de pagar mais nada a ninguém! Foi simplesmente para deixar as coisas já tratadas, apesar de, em princípio, vir embora do hospital no dia seguinte.

Nós podemos morrer a qualquer momento, mas na verdade nunca preparamos a nossa morte. E da minha morte, para já, só é conhecida a minha vontade de não ter nenhum padreco por perto. Não sou católico, não preciso de nenhum advogado de defesa - que ainda por cima nem sequer me conhece! - para meter uma cunha junto lá do São Pedro. Se for preciso, eu mesmo apresento a minha defesa sozinho, obrigado. Sinceramente, não acho que os 100€ que o padre cobra me irão ajudar de muito. Acho que o devem ajudar mais a ele!

E de repente pensei nas fotografias dela. Nua. 
Eu tenho aquele CD, sei lá, há uns doze anos talvez. Por que é que nunca apaguei as fotografias?Bom, em primeiro lugar aquilo não é de apagar. Apagar está à distância de dois cliques. Num disco compacto implica parti-lo. Não sei, mas parece-me algo de extrema violência. Deve ser o equivalente a rasgar as fotografias em papel ou a queimar os negativos. 

Via Pinterest

Eu guardei as fotografias, em primeiro lugar, porque as fotografias são minhas. Fui eu que as tirei. com autorização da própria. Mas depois também vos pergunto: mas será que sempre que terminamos uma relação, temos de destruir todas as fotografias? Se sim, porquê? Ou são só as comprometedoras? E por que é que teríamos de o fazer? Eu, tantos anos depois, ainda não o fiz, porque na verdade nunca achei que teria de o fazer.

Se não estou em erro, são fotografias a preto e branco. Sem dúvida que as pessoas ficam muito melhor nuas, em fotografias a preto e branco. Incomparavelmente! 

Eu não guardei as fotografias para passar a vida a andar a olhar para elas quando que me apetecesse. Aliás, há muitos anos que não as revejo. Mas também se visse, qual era o problema? Eu estou solteiro, qual é a diferença entre ver fotografias nuas de uma namorada ou, por exemplo, ver pornografia? 

Depois atentemos no seguinte. Eu se quiser ver as fotografias dela, não preciso ir buscar o CD e metê-lo aqui na gaveta do computador. Eu se quiser vê-la nua, basta ir à pasta dela, que está no meu cérebro! As nossas memórias não se apagam! Eu entendo que muitas pessoas destruam tudo que esteve ligado a uma relação anterior, como que se querendo purgar-se do passado. Mas na verdade não acho que isso faça muito sentido, tão simplesmente porque nós não apagamos o passado! Nós hoje, somos o produto de todas as experiências que vivemos no passado! Nós carregamos o passado sempre connosco e de maneiras que muitas vezes nem sequer nos apercebermos. Há pequenos acontecimentos, e que nem sequer tiveram importância, mas que ficarão guardados para sempre, e de vez em quando saltam cá para fora.

Na verdade, acho que a única coisa que me preocupa naquelas fotografias, é quando eu morrer. E não é por mim obviamente, é por ela. Quando eu morrer, já nada vai importar, mas é como se eu me sentisse o guardião da imagem dela contida naquelas fotografias. Talvez eu tenha mesmo que destruir o disco um dia destes, Não sei. Talvez o melhor mesmo fosse eu entregar-lho, mas isso também já não se coloca, desde logo, porque já não temos qualquer ligação há mais de uma década. 

Eu lembro-me frequentemente de uma frase dela quando nos despedimos, e que acho que, sinceramente, também nunca percebi muito bem o que ela quis dizer: "Preserva a nossa história". Preservar significa proteger; resguardar. Então nesse sentido, tem sido isso que eu tenho feito com as fotografias dela. Tenho-as preservado todo este tempo. 

domingo, 19 de março de 2017

Jesus Cristo: O Revolucionário Anarquista e a Inversão da sua Política

Eu não tenho religião. Nenhuma. E se algum dia vier a aderir a uma religião, façam-me um favor, internem-me, pois certamente já não estarei bem da cabeça. 

Eu acho que as religiões não são mais do que grandes organizações, travestidas de grupos do bem, mas destinadas a fazer o mal, a obter grandes benefícios, favores, e grandes quantidades de dinheiro que ainda por cima não paga impostos. E nenhuma pessoa pode negar, que certamente o mundo seria hoje um lugar bem mais igualitário, mais harmonioso e mais pacífico se não tivessem havido religiões. Os grandes líderes espirituais como Cristo, apregoaram o amor ao próximo. Ironicamente, os seus fanáticos seguidores, andaram e andam a matar quem pense de maneira diferente. 

Cristo não tinha religião! Era um homem livre que defendia a harmonia entre as pessoas. Desprezava e infringia as leis do Estado, lutava contra os políticos, contra o capitalismo, contras as fronteiras, e contra todas as formas de opressão.

Politicamente, parece-me óbvio que poderemos classificar Cristo como um Anarquista. Cristo foi considerado um agitador, um subversivo, alguém que se dava e defendia sempre os mais pobres e os excluídos. Cristo não era visto na companhia dos mais ricos, dos senhores de terras, dos comerciantes, ou dos fariseus. Pelo contrário, Cristo fazia-se rodear dos mais pobres, dos doentes, dos ladrões, das putas e dos mendigos. 

E por tudo isto, por atentar violentamente contra os interesses instalados, por pôr em causa as leis que defendiam os mais ricos, por ser um agitador e um extremista, tão radical que defendia o amor do próximo, e que defendia os pobres, Cristo foi condenado à morte. Mas aqueles que o mataram, os romanos, e que há séculos adoravam montes de diferentes deuses, rapidamente fizeram uma igreja em seu nome, para passarem, supostamente, a adorá-lo só a ele: aquele que mataram por ser  pior que o assassino Barrabás! E como qualquer bom político, os romanos começaram a fazer o oposto do que Cristo defendia!

A meu ver, ideologicamente, Cristo seria um anarquista. Mas se o quisermos integrar politicamente nos dias de hoje, entre a Esquerda ou a Direita, então teremos, sem sombra de qualquer dúvida, de o colocar certamente bem na Extrema-Esquerda do Parlamento!

Na sociedade da época tínhamos Herodes e Pilatos que defendiam os interesses dos mais ricos, que cobravam impostos e que matavam indiscriminadamente. Podemos então identificar Pilatos e Herodes, como os fascistas, os radicais de Direita, os "neo-liberais" como agora se diz, aqueles que põem o pé no pescoço dos pobres e da classe-média, para depois salvar os ladrões que levaram os bancos à falência.

E do ponto de vista económico, o que é que Jesus Cristo defendia na época? Defendia o capitalismo, o ganância de produzir mais e mais, ou defendia o seu oposto. Atentemos nas suas palavras?

"É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos Céus”. 

E deixou a estrita indicação:

“Vende tudo o que tens e dá aos pobres” 


Analisemos então. Cristo violava constantemente as leis instituídas, lutava contra os políticos, lutou contra toda a espécie de capitalismo (vende tudo e dá aos pobres) andava e lutava sempre pelos mais desfavorecidos, pelos pobres e pelos doentes. Pois então, é inegável que Cristo não tinha ideais de Direita! Bem pelo contrário! Cristo nunca que teria um partido político, pois defendia a liberdade individual. Cristo a meu ver, é um grande líder anarquista, mas se hoje fosse vivo, e tivesse de escolher de escolher um partido para votar, bom, então certamente que votaria num partido que defendesse os que menos têm. E esses partidos teriam de ser de inspiração comunista! Porque comunismo significa, precisamente, "comum", é uma política que defende (supostamente) a igualdade entre as pessoas. 

Mas o que é que se passa nos dias de hoje? Politicamente, quem são as pessoas que hoje se dizem seguidoras de Cristo? Ironicamente, são os mais conservadores! E como isto é tudo muito divertido! Quão irónico isto é? Cristo tinha um pensamento vanguardista, moderno, libertário, que apregoava o amor ao próximo. Então e não é que as pessoas mais religiosas de hoje, tal como no passado, são as mais mesquinhas, mais hipócritas e que são contra tudo que são liberdades individuais?

Se Cristo amava o próximo, e se dava com as putas, ladrões, e com toda a espécie de pessoas, aparentemente, pouco recomendáveis, porque raio é que os cristãos sempre oprimiram os mais fracos, nomeadamente as mulheres, e lutam com todas as forças contra a igualdade de direitos? Por que é que os cristãos são contra o aborto, são misóginos e homofóbicos?

E por que é que as pessoas que se dizem religiosas, e que dizem seguir a doutrina de Cristo, são na sua maioria de Direita, a política que defende, precisamente, o capitalismo e que defende os mais ricos que tenta esmagar os mais pobres? Porquê? Que raio de lógica é essa que os cristãos têm, que eu ainda não percebi? É a lógica da batata ou a lógica do "olha para o que eu digo mas não olhes para o que eu faço"?

Pior! Veja-se que em Portugal até meterem a Maria, a mãe de Cristo ao barulho! Celebra-se este ano cem anos, da invenção da aparição de Maria na Cova da Iria. E imaginem que um dos seus (supostos) segredos, era que se tinha de se acabar com o comunismo!! Reparem, até lá no céu a mãe de Deus, se preocupa com a política! E a Igreja também sempre se meteu na política. Os padres sempre tiveram junto do povo, crédulo e ignorante, grande influência e sempre tentaram manipular para que o povo votasse em quem mais lhes interessava, e que não era quem mais interessava ao povo!
Portugal viveu uma ditadura durante 50 anos, e quem foi o grande aliada do ditador Salazar? Para que foi que se inventou a confissão, se não para descobrir segredos e aniquilar os subversivos? 

Mas hoje em dia as pessoas já não andam com os olhos tapados. E então por que é que as pessoas não praticam os ensinamentos de Cristo? Por que é que os cristãos vão todos à missinha bater com a mão no peito, mas depois não dão nada a ninguém, nem fazem nada por ninguém? Por que é que as falsas instituições de caridade, associadas à igreja, angariam tanto dinheiro com a desculpa de ser para dar aos pobrezinhos, mas depois, como foi agora revelado, a Caritas tem milhões e milhões no Banco, para dar aos seus administradores? E por que é que o Vaticano, o país do Papa e dos cardeais, há-de ser o país mais rico do mundo se Cristo disse que nenhum rico vai para o céu?

Afinal, que puta de religião é essa?

sábado, 18 de março de 2017

Queres vir dar uma volta de bicicleta?

Desde sempre que me lembro de andar de bicicleta. Há uma fotografia minha, a agarrar na primeira bicicleta que tive, e que foi o meu pai que a montou com as próprias mãos. Só tinha três anos de idade nessa fotografia. Antes disso lembro-me do triciclo e da trotinete. E toda a gente pensava que eu me ia matar com a trotinete, quando pegava nela e ia a toda a velocidade monte abaixo. 

Andei muito de bicicleta em criança, quando a rua de minha casa ainda era em terra. E andei mais ainda na adolescência, quando o piso já era de um asfalto manhoso, cheio de sulcos. Era uma simples camada fina de espiche por cima da brita, e montado em cima da bicicleta sentia-se uma leve trepidação. 

Chegou a vida adulta, e trouxe os passeios frequentes com o melhor amigo e com a namorada, não raras vezes na companhia de ambos. Muitos anos passaram entretanto. Foi-se o amigo, foi-se a namorada. Ficou a minha vontade de continuar a andar de bicicleta. 


Um outro companheiro haveria de chegar depois: o desemprego. O desemprego fez de mim uma pessoa muito rica, não em dinheiro obviamente, mas em tempo. E para aproveitarmos a vida, nem que sejam só as pequenas coisas da vida, é preciso tempo. E há tanta coisa bela na vida, se as pessoas conseguissem ver. Sim, nem que fosse só um grilo a cantar. E juntos, eu e o desemprego, divertimo-nos imenso. E com tanto tempo livre que o desemprego me deu, pegava na bicicleta e andava por aí, a conhecer coisas, na minha própria aldeia, coisas que eu nem sabia que existiam. Por vezes pedalava como um desvairado pela aldeia toda. Era também para as pessoas verem. Afinal eu ainda não estava numa cadeira de rodas, eu estava muito bem até, obrigado. 


E agora tenho, de novo, duas bicicletas. Uma de montanha (por que é que os carro são "todo-terreno" e as bicicletas são de "montanha"?) e outra dobrável. A desculpa que eu dou a mim mesmo é que me vai dar muito jeito, para meter na mala, e até na hora de almoço do trabalho, poder ir dar uma volta. Se quiser até a posso deixar lá no trabalho. Também posso sair, e ir até ao mar. Afinal, eu trabalho a menos de 10Km do mar. Posso, um dia de vez em quando, sair do trabalho, e ir até ao mar. Pegar na bicicleta que se dobra e desdobra facilmente, e ir pedalar um pouco. Apanhar a maresia. Talvez me faça bem, talvez me limpe o diabito que por vezes carrego comigo. 

Dou a mim todas estas desculpas, que nem serão propriamente desculpas. Até porque, eu não tenho por hábito comprar coisas para depois as encostar sem lhes dar utilidade. Mas não terei eu comprado uma segunda bicicleta, e as duas até caberão dentro na carroça, para um dia destes perguntar a alguém: queres vir dar uma volta de bicicleta?

sexta-feira, 17 de março de 2017

Mulher a Condizer

Ora bem, com estes óculos, depois tinha de arranjar uma namorada a condizer!! Acho que poderia ser uma coisa assim:

Via Pinterest
Ou assim:

Via Pinterest
Ou então ou pouco mais formal:


Esperem! Para tudo! Esta! Esta sim seria os meus óculos-metade!

Via Pinterest

E se eu comprasse estes Óculos de Sol?

Agosto de 2016. Uma terrível tragédia abateu-se sobre mim: perdi os meus queridos óculos de sol!
Claro que quando cheguei pela primeira vez ao pé dos meus colegas - e ainda me lembro bem - foi num sábado, ao almoço, depois de ter estado a fazer horas-extra (no tempo em que ainda se pagavam horas-extra ao dobro da hora normal) e estava sentado em frente do chefe. E os colegas de imediato quando viram gozaram. Mas é sempre assim, primeiro estranha-se, depois entranha-se. Primeiro critica-se, depois pede-se para experimentar e ver como fica!

Os meus óculos-de-sol eram únicos. Eu pelo menos nunca vi ninguém com uns iguais, e isso já deve querer dizer alguma coisa não? Já nem sei ao certo quando os comprei...Talvez em 2008 ou 2009, mais ou menos por aí. Fiz uma pesquisa na net e gostei logo deles porque eram esquisitos, pareciam uns óculos de proteção de um qualquer operário. (curioso, cada vez menos se ouve esta palavra: operário). Eram da marca Vuarnet. Eu nunca tinha sequer ouvido falar desta marca! Mas claro está que eu também não percebo nada de óculos de sol! O que sei é que devem proteger bem da luz solar, ponto. Depois é tudo uma questão de gosto pessoal.

E há uns meses comecei a minha epopeia na busca de uns novos óculos de sol. E eu quando procuro algo, procuro mesmo, não fico com a primeira coisa em que tropeço! E tropecei neste belo exemplar:



Comentei com uma amiga minha que de imediato me disse que gostava, mas chamou-me a atenção:


"Isso são óculos para gajo solteiro e sem pretensões de arranjar namorada(o). Imagina lá dar um beijo a alguém com isso!!"


Ora bem.. de facto ela tem razão. Até há um provérbio brasileiro que diz que "dois bicudos não se beijam" o que de facto faz todo o sentido. 

Mas eu sou um gaijo solteiro! E sem grandes pretensões! Portanto parece-me bem!

Os óculos custam cerca de 70€ e são de uma coisa meia sinistra chamada ByTheR, que ao que me parece é uma marca sul-coreana que tem como lema: "Not for public, just for mania". Têm umas roupas e acessórios meias futuristas, urbanas e góticas. Entre outras coisas gostei também desta mochila, mas isto seria mais coisa para oferecer uma eventual namorada! porque no meu entender parece-me mais feminino:



Eu entretanto comprei hoje mesmo uns óculos de sol. Não são assim nada de mais. Só não são azuis, nem verdes, nem às cores, todos apaneleirados, como agora se vê. Mas são um pouco discretos parece-me. E eu já sei que é sempre um risco comprar sem experimentar, sem ver com fica na cara. Mas pronto, estão comprados. Mas ainda assim estes todos cheios de picos ficaram-me na retina. E se eu comprasse estes óculos de sol?

ByTheR

# Mulher a Condizer

....Tão Perto. Que eu Suspiro


... a nossa hora aproxima-se
Tão perto...
que eu suspiro...


"Sear Me MCMXCIII" / Turn loose the swans" / My Dying Bride / 1993

quinta-feira, 16 de março de 2017

Alternativas de Relacionamento Afetivo

"Espero mesmo que não encontres uma namorada ciumenta
 que não te deixe mais corresponderes-te comigo"


Basta ver alguém chorando e poderemos apostar que a pessoa em questão está nesse lamentável estado emocional justamente por causa de quem deveria ser a sua fonte de felicidade. Então, há algo de errado aí. Há algo equivocado no conceito de relacionamento afetivo.
(...)
Parece-nos que o componente mais dramático do relacionamento afetivo é o cerceamento da liberdade. Não é à toa que o termo esposa em espanhol significa algemas. Contudo, não é só o homem que se sente algemado pelo enlace afetivo. A mulher é até mais vitimada pelas convenções sociais, afinal, vivemos numa sociedade patriacal, que se carateriza pela restrição da liberdade. 
É preciso que preservemos a liberdade, o nosso bem mais precioso. Entretanto, parece estar implícito que para nos relacionarmos afetivamente com alguém, precisaremos de abrir mão da nossa liberdade. Isso não está certo.
(...)
O melhor é não se casar. Mas... quem consegue? Quase todo o mundo adquire, já na infância, uma fixação cultural pela instituição casamento. Assim, mais cedo ou mais tarde, a maior parte das pessoas acaba-se casando, seja formal ou informalmente.
(...)
No filme Um caminho para dois, o jovem Peter Finch pergunta à adolescente Audrey Hepburn: "Por que as pessoas casadas não conversam uma com a outra?"  (...)
Então, por que as pessoas se casam? Por lavagem cerebral. Afinal, nem cogitam se há outra opção de relacionamento, fora daquele modelo único que a sociedade vigente nos impõe.
(...)
Você já notou que quando está acasalado (mesmo num simples namoro) os amigos não o convidam tanto para sair? É como se se afastassem polidamente para "não atrapalhar". Fora isso, ainda há um bom número de casais que se fecham em copas e passam a declinar os convites dos amigos - convites esses que já não são tantos. O resultado disso é que o casal vai-se isolando por discrição dos demais. No entanto, se você descasa ou fica sem parceiro(a) os amigos, frequentemente, retomam e começam a convidá-lo outra vez. Parece, portanto, que há uma conspiração, para que os casais fiquem sós, a saturar-se um ao outro com o excesso de invasão de espaço vital. Isso acaba resultando mal.
(...)
A monogamia foi originalmente uma boa ideia. Com ela, equilibravam-se numericamente as populações masculina e feminina, evitando confrontos entre os homens que ficassem sem parceiras. A monogamia ainda oferecia vantagens únicas para aquele período: evitavam-se as doenças sexualmente transmissíveis, para as quais não havia cura, e garantia-se a sucessão tanto genética quanto de bens e de títulos hierárquicos. Era mesmo uma ideia genial. Tão genial que durou milénios. Um sucesso, indiscutivelmente.
(...)
Hoje, a monogamia tem demonstrado ser uma instituição falida e mais do que isso, fonte de infelicidade, de mentira e de hipocrisia. Uma proporção avassaladora de pretensos monógamos trai a sua proposta de manter contacto com uma só pessoa. Todos traem, todos sabem, todos negam, todos fingem que acreditam. E assim caminha a Humanidade, aos trancos e barrancos, em direção a um nível maior de lucidez e de honestidade que deve estar em algum lugar, lá no fundo do túnel (..)
Quando conversava com uma amiga sobre esta modalidade comportamental, ela me contou uma anedota que ilustra a atitude das pessoas desse grupo:
O psicanalista perguntou ao paciente:
- Você tem um relacionamento monogâmico?
Ele respondeu:
- Sim, tenho vários
(...)
Tenho testemunhado muita gente declarando  que é monogâmica e não compreende ficar com mais de uma pessoa, mas trocam de parceiro quase semanalmente. Convencionamos designar esse procedimento de monogamia sequencial. Apesar de ser muito comum, não creio que precisemos analisar esta modalidade, pois ela já é bem descritiva por si só.
(...)
Biologicamente o Ser Humano não é monogâmico, porém vivemos em sociedade e não na selva. Criamos todas uma organização social baseada em sistemas de herança e responsabilidade pelo sustento de família e filhos que, embora esteja obsoleta, ainda é vigente.
(...)
A primeira alternativa com que nos deparamos é a do casamento aberto. Ele, na verdade, não deixa ser uma vertente do casamento monogâmico, só que com atenuantes. Ambos os parceiros mantêm uma relação afetiva estável e está muito claro para cada um dos dois que o seu ponto de referência no universo é a cara-metade. Entretanto contam com o beneplácito do cônjuje para ter relações extra-conjugais, o que na opinião de muitos deles, enriquece o relacionamento e reforça os laços de amor, confiança e honestidade.


No casamento aberto há inúmeras variantes. Poder-se-ia dizer que existem tantas quanto o número de casais, pois cada qual cria as suas próprias normas de conduta de acordo com a respetiva cultura.
Há os concedem o respeito pela liberdade do parceiro, mas não querem saber de nada. (...) Outros, ao contrário, só ficam bem se estiverem a par de tudo. "Não me escondas nada, quero saber o que está a acontecer" é a regra para este grupo.(...)
No casamento fechado, chega o momento em que novidade acabou e os parceiros já são antigos. Ora, sabe-se que o erotismo alimenta-se muito do elemento novidade. Enquanto os parceiros não pulam a cerca, as coisas sustentam-se  com uma aparência consistente. No dia em que uma pessoa nova cruzar o caminho de um devoto do casamento fechado, ele simplesmente se desestruturará. É o fator novidade. Ficará apaixonado e, como não professa o relacionamento aberto, terá de optar. Muitas vezes optará por uma pessoa extremamente inferior ao seu companheiro e, mais tarde, arrepender-se-á amargamente pela tolice cometida.
(..)
Ficou célebre o casamento que o filósofo Sartre mantinha com a sua esposa Simone de Bauvoir, mulher notável, escritora de uma inteligência raríssima. Para a época, década de 50, foi um escândalo. Só não teve consequências mais nefastas porque viviam em Paris e ambos eram intelectuais - casta à qual concedem-se exceções.
Embora casados e fiéis, moravam separadamente, cada um na sua casa. Fiéis eles eram, mas usufruíam da óbvia liberdade que o facto de viver em sua própria casa proporciona. Portanto, fiéis de acordo com o conceito de fidelidade que exponho aqui. Foi um casamento bem sucedido e que serviu de inspiração a muita gente.
(...)
Se você prestar atenção, vai notar que aquela pessoa com quem relacionava-se sem nenhum rótulo ou compromisso era um doce de tão cordata. Era compreensiva, não fazia cobranças,não reclamava de nada, não enchia o recipiente escrotal. Mas quando essa pessoa (homem ou mulher) foi elevada à categoria de titular, alguns azedumes começaram a transpirar. Você passou a perceber, não sem alguma deceção, que aquele ser humano tinha lá as suas mesquinhezas. E quanto mais essa criatura for se sentindo dona do pedaço, mais irá tentando impor as suas exigências.
(...)
Certo é tudo aquilo que lhe trouxer felicidade, bem-estar, ausência de conflitos, tensões ou desgastes para você e para os demais. Certo não tem nada a ver com moral. Algo pode ser certo para determinada pessoa ou grupo de pessoas e ao mesmo tempo inadequado para outro indivíduo ou comunidade.
(...)
Ser fiel é não trair. Trair é mentir,é prometer que não fará uma coisa e fazê-la. Se um cônjuje declara que não vai comer doces para emagrecer e come, isso é traição. Se não for assumido nenhum compromisso de abstinênica sexual com relação a terceiros, o contacto sexual não poderá ser classificado como traição.
(...)
Se você quer azedar o seu relacionamento afetivo, a receita é infalível. Seja ciumento(a). Ou o relacionamento deteriora e vai cada um para o seu lado, ou acabarão sendo personagens de manchetes policiais.
(...)
Se você conseguir um bom relacionamento afetivo com o seu parceiro, o que não vai faltar são os falsos amigos, e principalmente, as falsas amigas que em conversas íntimas procurarão descobrir um ponto fraco para inocular ali a sua peçonha. Primeiramente, procure minimizar os pontos fracos. Depois, não deixe ninguém saber quais são eles. Disfarce-os como se disso dependesse a sua vida - e ela depende mesmo!
(...)
Já que estamos repensando o relacionamento, para evoluir como pessoas, por que não repensarmos também o momento em que esse mesmo relacionamento precisa de um tempo, ou de uma reciclagem?
Acredito que as pessoas não devam afastar-se, privar-se do convívio de quem lhes deu tanto, apenas por estar numa outra etapa da sua evolução, da sua vida, ou da sua sexualidade. Devemos, sim, preservar esse relacionamento   que agora extrapolou os limites da relação homem-mulher e alcançou patamares excelsos de dois seres que são mais do que casal, mais do que amigos, mais do que irmãos.
É fundamental que ao conluir uma etapa do relacionamento e galgar uma outra, haja muita elegância e consideração.

Alternativas de Relacionamento Afectivo / DeRose / 2002

terça-feira, 14 de março de 2017

Irão os robots extinguir as putas?

Diz-se que a prostituição é a mais antiga profissão do mundo. Mas também se diz muita coisa. Talvez seja, talvez não, não sei. Se calhar a primeira profissão foi o agricultor, ou o pescador, ou o gaijo que afiava as pedras para ir à caça, ou o gaijo que aprendeu a fazer fogo - ou o tipo que descobriu a roda! Se calhar, muitas outras profissões chegaram antes da prostituição, ou não. Nunca saberemos, nem importa para o caso, mas assumamos que trocar favores sexuais por outros bens terá sido mesmo a profissão mais antiga do mundo. 

Via Pinterest
Há quem diga que não é uma profissão fácil. Mas se fosse uma profissão assim tão difícil, se calhar, digo eu, não haveria tanta tanta oferta. Basta abrir as páginas do Jornal de Notícias, um dos maiores chulos do país, que cobra cerca de 200€ por anúncio, numa prática, que não é preciso ter feito um curso de Direito para perceber que é lenocício.  

E também há diferentes tipos de prostituição. Na base da pirâmide temos aquele trabalho mais precário e sem direitos, que é a prostituição da beira de estrada; depois temos as putas que estão na rua mas têm o seu quarto na pensão; temos as putas que fazem da sua própria casa ou apartamento o seu bordel; depois há as mulheres que se despem na net e depois aí vamos nós, pirâmide acima, até chegamos lá ao pico, em que as próprias putas já se acham no direito de nem se chamarem putas, afinal só há sexo se quiserem. No fundo já se dão à esquisitice de não prestar o serviço a qualquer um. Mas um trolha, que só faz paredes para ricos não deixa de ser um trolha não é verdade?

Existe ainda, outro tipo de prostituição, mas que geralmente ninguém a vê como tal, que são aquelas putas travestidas de esposas, casadas e boas mães de família. Estas putas, são senhoras de bem, que se alugam por anos a fio num casamento, mas cá está, mais uma vez a troco de desafogo financeiro. Este tipo de prostituição mais comum, é um flagelo que atinge mulheres, mas não raras vezes, também muitos homens. 

A prostituição existe porque existem pessoas que a ela recorrem. Se não houvessem interessados nestes serviços, deixaria de haver prostituição. Assim, seguindo este raciocínio, a prostituição é algo necessário à sociedade, e como tal o Estado só teria que legalizar a atividade, e muito dinheiro se iria ganhar nos impostos. Assim, o Estado português continua a enterrar a cabeça na areia, fazendo de conta que não está a ver o problema.

Mas antes que me tomem por especialista no assunto, afirmar que não. De facto não sou especialista em putas porque tampouco recorri ao serviço de alguma. Na volta talvez não saiba o que ando a perder. Mas não sei, a mim a coisa nunca me entusiasmou. Se calhar acharia muito mais piada sair eu com o dinheiro, ser eu usado para, eu mesmo, como deve ser, fazer o serviço bem feito.
Mas ainda há não muitos anos, era quase tradição, aquando da inspeção para o serviço militar, os mancebos irem juntos às putas.

Mas as coisas têm mudado muito rapidamente. Também ainda há não muitos anos, era prática, de quem tivesse muito dinheiro, comprar apartamentos e meter lá dentro uma senhora, para todo o serviço. Depois, muitas vezes vendia-se o apartamento mais à frente, e anos depois de prazer ainda se ganhava dinheiro! Mas hoje em dia não acho que seja necessário ter amantes e sustentá-las em apartamentos. Existe uma coisa chamada Internet, existem os sites de sexo, e para quê sustentar uma só amante e trair a legítima sempre com a mesma cona? Na volta isso acaba também por se tornar aborrecido não? Então nada como o jogo de sedução constante e faturar, gratuitamente diferentes mulheres (ou homens).

Via Pinterest
O mundo está a mudar. Para grande parte dos jovens japoneses, por exemplo, é impensável ter uma namorada para lhe dar umas boas trancadas. Que coisa nojenta acham eles! Preferem jogar, e masturbar-se com brinquedos. E depois das bonecas insufláveis, que tinham uma cara que mais parece que acabaram de ter um AVC, chegaram agora as bonecas, mais realistas, que custam quase tanto como um automóvel. A par disto tudo o advento da robotizarão, que se estima que coloque, nos próximos anos, metade da população mundial no desemprego.

E irão os robôs também extinguir a prostituição?  Chegaremos aos tempos dos homens e das mulheres terem o seu robot-para-todo-o-serviço que trocarão de meio em meio ano, como fazem agora com os telemóveis?

Bom, para já, enquanto não chegam as robôs-humanoides, abriu em Barcelona o primeiro bordel com bonecas sexuais. Ali não há carne, só silicone. E uma hora com a bonecada custa 80€. Mas será este o futuro? Será que o futuro é os homens e mulheres, terem o seu robot-marido ou robot-esposa? Será que os robôs estão a chegar para nos foder literalmente?

domingo, 12 de março de 2017

Anda tudo fodido dos cornos!

Já por aqui referi mais do que uma vez, que há desde há muito que faço compras e vendas pela Internet, ainda no tempo do saudoso Escudo, e no tempo em que até se enviava dinheiro escondido por carta como meio de pagamento. 

Sempre comprei e vendi, e há algum tempo também estou num site de trocas, porque parece-me um conceito interessante. Tu tens uma coisa que já não queres e dá-me jeito, e então se eu tiver algo que te interesse podemos trocar sem gastar qualquer dinheiro. Acho isso porreiro, com a vantagem do site Troca-se.pt ter um índice de reputação, que nos permite trocar com toda a confiança, ao contrário, por exemplo, com o que acontece com os sites OLX e Custo Justo, em que basta fazer uma pesquisa por fraudes e em que vemos o mato que para ali vai. 



No Troca-se.pt estou sempre a colocar novas coisas que pretendo, para que se alguém vir e tiver me contacte. E por estes dias coloquei lá mais um nome de um pequeno livro, que até cá entre nós, mal possa conduzir vou trazer da biblioteca aqui da terra, pois já vi na catálogo de títulos que tem. E o livro chama-se "Alternativas de relacionamento afetivo". 

Poucos dias depois, um iluminado qualquer faz a pergunta: "m ou f". Eu fiz-me desentendido, como que não querendo perceber o que se estava a passar, e coloco um mero ponto de interrogação. Pois não é que agora mesmo, outro engraçadinho coloca também ele um ponto de interrogação? Já um bocadinho irritado respondo: "Estou à procura deste livro - qual é a dúvida?  E não que me respondem: "pensei que estivesses a trocar sexo por outra coisa"???  Espera, com um anúncio na secção de livros???

Mas anda tudo fodido dos cornos ou quê?

Medo: Há uma televisão inteligente atrás de mim


David Foldvari

São 17h45 e eu estou num quarto de Hotel em Guildford. Estou cheio de medo. Há uma televisão inteligente montada na parede atrás de mim. 

Eu só tenho um aparelho de televisão inteligente há 18 meses, então eu já evitei anos de vigilância secreta pela CIA, FBI, MI5, CI5 e NWA. Ninguém está a salvo da Samsung-Olho-de-Sauron-que-tudo-vê. Aparentemente um programa profundamente incorporado permite atualmente que as agências de inteligência observem e façam a monitorização de qualquer pessoa que esteja a ver o The Nightly Show da ITV, na crença que eles devem ser um estranho solitário-desajustado inexplicavelmente fascinado pelo sofrimento humano, uma bomba-relógio que está prestes a explodir. 

Eu ainda tenho um telemóvel velho da Nokia, tão básico que nem sequer tem o Snake nem câmara integrada.

Eu soube que a Nokia vai relançar um telemóvel como que a relembrar um artigo antigo fixe. E isto só mostra que se tu ficares parado muito tempo no mesmo sítio acabarás por te tornares um ícone da moda. Ou então és atropelado por um autocarro!

O meu sobrinho acha que é engraçado que eu não saiba o que é Candy Crush. Eu acho engraçado que ele nunca vá ser capaz de ser dono da sua própria casa. 

Mas talvez essa ignorância me tenha dado segurança. Será que eles nos estão a espiar através das nossas televisões assim como no Big Brother fez a Winston Smith em 1984 do Orwell? Tornou-se um chiche invocar a natureza profética da ficção distópica de Orwell, mas só porque fazer isso é um chiche, não faz as profecias de Orwell menos proféticas.

Stweart Lee 
(ler texto original aquiThe Guardian)

sexta-feira, 10 de março de 2017

Os Guerreiros da Internet

Quem são as pessoas por detrás dos comentários odiosos na internet? O cineasta norueguês Kyrre Lien mergulhou nesse mundo durante três anos e diz-nos que:

Comecei a olhar para os perfis das pessoas, tentando descobrir quem elas eram. Muitos pareciam bastante normais. Tinham famílias e pareciam bastante agradáveis, mas os comentários que escreviam no espaço público eram muito extremos. Havia uma desconexão

E então começou uma viagem de três anos, mergulhando na vida de alguns dos comentadores mais prolíficos da Internet, e que deu origem ao seu documentário: The Internet Warriors, numa tradução livre "Os guerreiros da Internet". 


Eu ouço muitas vezes  as pessoas dizerem que agora não se pode fazer nada, que há sempre alguém a criticar. Os humoristas, por exemplo, como o Ricardo Pereira, um dos que mais aprecio, já disse que um dia destes não se pode fazer humor com nada porque as pessoas indignam-se com tudo. 
Mas a meu ver, o problema não é as pessoas agora poderem expressar a sua opinião, aliás, eu acho isso muito bom, é quase uma verdadeira democracia. O problema é vivermos agora uma verdadeira censura com medo dos "Não Gosto"dos extremistas-sensíveis da internet! Humoristas com medo de exercerem a sua liberdade de expressão? Ao que isto havia de chegar!

O problema a meu ver, é vivermos tempos do "quando pior, melhor". Quanto mais aberrantes forem as coisas melhor. Mais se vendem. E infelizmente os média em geral, portugueses e estrangeiros, só dão destaque a este tipo de coisa. 99% das pessoas podem ser tolerantes e solidárias, mas os médias só darão destaque ao 1% de energúmenos fascistas. E é assim que a mensagem populista passa, porque está constantemente a ter muita publicidade, mesmo que seja a dizer constantemente mal deles. E como se sabe, não há má publicidade, pois como alguém disse, toda a publicidade é boa.   

Mas este tipo de mentalidade sempre existiu. Muito antes de haver Internet. Só que agora antes não tinham opinião. Revoltavam-se em silêncio. Hoje as pessoas, também podem manifestar a sua ignorância e a sua estupidez. Mas a meu ver isso só pode ser uma coisa boa, porque agora também sabemos quem eles são e o que eles pensam. Não podemos é fazer o seu jogo, porque se o fizermos perderemos. Eles são muito mais experientes que nós em estupidez!

quinta-feira, 9 de março de 2017

Estrela do Chaos

De nós os dois, acho foste tu quem teve certamente a juventude mais rebelde. Logo para começar, tu namoraste comigo, logo, isso dá-te uns pontos extra! Eras uma adolescente que não tinha propriamente grandes preocupações com a roupa e com a forma como se apresentava. Vestias o que te apetecia, incluindo roupa do teu irmão mais velho ou até casacos da juventude do teu pai. E combinavas tudo muito descontraidamente. Lembro-me do pormenor dos rasgões das calças na zona dos joelhos, certamente feitos por ti, e que te davam, lá está, um ar ainda mais rebelde. Hoje não dá ar rebelde nenhum. Olha é como as tatuagens, hoje qualquer pita-choca tem tatuagens, e as calças esburacadas há muito que entraram na moda.

Na verdade, em ti, acho que ninguém prestava muita atenção à roupa que usavas. Tu impunhas-te pela tua presença e pela tua personalidade. E assim de repente até acho que é isso que falta às jovens de hoje. Sempre tão preocupadas com a forma com que se apresentam, e tantas vezes pouco preocupadas com a firmeza do seu caráter.  

Mas apesar da rebeldia, outra coisa que nos caraterizava, era a responsabilidade. Passar pela adolescência, sem fumar nem beber bebidas alcoólicas, demonstra sempre alguma firmeza e ainda tinha mais graça por não sermos propriamente uns meninos de coro. Agora até me lembrava dum casal que conheci, pouco tempo depois de nos termos separado, acho que eram de Espinho, e encontrei-os várias vezes em concertos, e eles  como que ficavam fascinados quando me encontravam. Eu ele aquele tipo com mais de trinta anos, que nunca tinha fumado nem bebido álcool! E não deixa de ser engraçado que, apesar de ser complicado passar a adolescência a resistir aos comportamentos unanimemente tidos como fixes - "não bebes não fumas não és fixe" - mas depois, quando somos mais velhos, sejamos reconhecidos por nunca o termos feito. 

Talvez tu me ganhasses em rebeldia porque eu ganhava-te em responsabilidade. Embora fôssemos ambos responsáveis, havia uma diferença: tu gostavas de experimentar. Se eu sabia que algo não era bom para mim, eu fugia das situações; já tu, não querias morrer estúpida, o que, desculpa lá, mas é um bocado estúpido. Repara, se calhar eu também gostaria de saber, como é mandar-me lá do cimo da Ponte Dom Luiz abaixo e saber como é o sentir corpo a bater lá em baixo no rio Douro. Mas para isso, para saber como é, tenho de morrer! Estás a ver? É estúpido. Pois eu desde novo prefiri morrer estúpido acerca de muitas coisas, porque em muitas situações, o problema das pessoas é precisamente esse: é quererem experimentar para saber como é. E já diz o ditado: "a curiosidade matou o gato"! 

Já lá vão quase vinte anos e como é normal há pormenores que já me escapam. Mas tenho quase a certeza que deveríamos estar a namorar há dois meses, quando tu, a Ana, a Raquel e a Joana (e agora não me lembro do nome daquela tua amiga da Ribeira, que tu gostavas muito, pelo menos até ela ter arranjado namorado). Já não sei ao certo quantas foram contigo, mas tenho ideia que vocês eram umas três ou quatro, contigo cinco no máximo. 


Tinham decidido ir, todas juntas, passar uma noite, acho que era para Afife... Ou seria Esposende? Acho que só pode ser Afife, até porque eu nunca estive em Afife. Não conheço Afife! Só posso ter esse nome gravado na cabeça por causa da tua ida com as tuas amigas burguesas, para um sítio na praia, para experimentarem umas "cenas". 

Eu terei sido veementemente contra a tua ida. Nem tenho dúvidas sobre isso. Eu sou um chato do caralho, da pior espécie mesmo. Mas claro que tu não precisavas da minha aprovação para ir, apesar de eu saber que, naquela altura, eu era a pessoa mais importante para ti. E eu sabia que aquilo tinha tudo para correr mal. Vocês acharam que tinham arquitetado tudo muito bem. Foram ao Centro Comercial STOP comprar as substâncias ilícitas ao dealer de serviço (a legalização do consumo das drogas leves só chegaria dois anos mais tarde pela mão do hoje Secretário Geral das Nações Unidas, António Guterres , e, nesse tempo, fumar um simples charro, era um fruto proibido, talvez por isso, muito mais apetecido)  e lá foram vocês, um grupo de mulheres, no fim do secundário, e quase a atingir a maioridade, de comboio para Afife. 

Eu, como bom namorado, fui contigo levar-te à estação, mas voltei para casa apreensivo, pois como diz o nosso amigo Murphy: "se algo pode dar errado, dará". E claro que deu.

Lembro-me de já serem altas horas da noite. E nesse tempo ainda ninguém tinha telemóveis. E tocou o telefone. Era uma amiga tua... Tu tinhas batido muito mal com as merdas que experimentaste. E eu fiquei completamente passado com o que estava a ouvir. Tu, em pânico, terás pedido para me ligarem... Claro, só podia ser assim, só tu sabias o meu número de cor. Eu acho que chegamos a falar um pouco e eu ter-te-ei acalmado...

A coisa correu tão mal que me disseste que nunca mais na vida quererias experimentar nada daquilo. Mas eu sempre me perguntei: e se não tivesse corrido mal? Irias ter ficado só por ali, só para não morreres estúpida, ou irias continuar a experimentar? E eu, iria conseguir impedir-te de repetires a gracinha, ou iria ter de aceitar? Resignado não iria certamente ficar. Ainda por cima, nesses tempos, ambos, já tínhamos problemas graves o suficiente para tentarmos sair deles, não precisávamos de mais nenhum.

Mas no meio disto tudo há um pormenor que nunca me esqueci. Na estação, quando te deixei para ires com as tuas colegas, eu tirei o fio que usava há já uns anos. Não era um fio com uma cruz. Tirei-o e coloquei-o em ti. Era uma Estrela do Caos.


terça-feira, 7 de março de 2017

Não há Famílias em K-PAX

Por diversos motivos, há já muitos anos que não vou acompanhando o que se vai passando no cinema, e certamente que há mais de vinte anos não acompanho os Óscares, pois cedo percebi que se trata, mais ou menos como o Euro Festival da Canção, de uma questão política e de interesses financeiros, bem mais que um justo prémio para os melhores da sétima arte. 

Eu nem sou grande entendido em cinema como por aqui já o devo ter referido por mais que uma vez. Eu nem conheço os artistas, os realizadores, os pintores das obras. Vejo os filmes mas na maioria dos casos nem retive quem foi o realizador. Muita gente mal começa a ver a forma como o filme está filmado ou editado já sabe quem filmou. Eu não. E claro que é bem mais fácil lembrar os atores. E um dos meus atores preferidos, creio que é mesmo o meu ator preferido, é o Kevin Spacey. E já cheguei a diversos filmes por causa dele. Até vi o "Super Homem Regressa" (não seria filme que me interessaria minimamente à partida) simplesmente porque ele participava, fazendo de Lex Luthor. E acho que isto é comum à maioria das pessoas. 


K-PAX é um filme de 2002. Depois de ter ido ao cinema ver, em dois anos seguidos, dois filmes dele, vi este filme já em DVD, porque K-PAX, se não estou em erro, quase nem entrou no circuito de cinema e foi quase de imediato para o mercado de aluguer/venda. 

O filme desenrola-se quase exclusivamente num hospital psiquiátrico. Um homem é apanhado pela polícia, sem documentos, dizendo que a luz deste planeta é demasiado brilhante para ele. Depois de algum tempo a ser tratado e a não se obter qualquer resposta, ele é entregue aos cuidados de Mark, um psiquiatra experiente (Jeff Bridges). Mas o problema é que Prot (Kevin Spacey) é muito convincente, e Mark começa a encarar este novo doente quase como um desafio pessoal, como se tivesse "escolhido este para salvar" como lhe dirá a sua mulher. 

O filme coloca muitas questões éticas ou filosóficas, muito pertinentes em que podemos refletir. Uma delas é sobre as famílias e sobre as relações que estabelecemos uns com os outros:


Mark: Bem, Prot, gostava que me contasse mais a sua terra...
Prot: O que é que quer saber?
Mark: Bem... tem família em K-PAX?
Prot: Em K-PAX não é como aqui. Não temos famílias como vocês as considerariam. Na verdade, a família seria um "nom sequitur" no nosso planeta. como em muitos outros. 
Mark: Por outras palavras...você...nunca conhecer os seus pais...
Prot: Em K-PAX as crianças não são criadas pelos pais biológicos. mas sim por todos. Circulam entre nós, aprendendo, com um e com outro. 
Mark: Tem um filho?
Prot: Não. 
Mark: Tem alguma esposa à sua espera? 
Prot: Mark, Mark, Mark... Você não está a prestar atenção ao que lhe estou a dizer pois não?
Não temos casamentos em K-Pax. Não há esposas nem maridos. Não há famílias. 
Mark: Estou a ver.. e a estrutura social... Governo?
Prot: Não precisamos.
Mark: Não há leis?
Prot: Nem leis, nem advogados. 
Mark: Como distinguem o bem do mal?
Prot: Todos os seres do Universo distinguem o bem do mal. 
Mark: Mas e se... alguém fizesse algo de errado? Cometer um homicídio. Ou uma violação. Como o puniriam? 
Prot: Deixe-me dizer-lhe uma coisa Mark. A maioria de vós, humanos, subscrevem esta política do "olho por olho, dente por dente"...que é conhecida em todo o Universo pela sua estupidez. Até o vosso Buda e o vosso Cristo o entendiam diferentemente. Mas estão-se todos nas tintas, até budistas e cristãos.Vós humanos...Às vezes é difícil entender como conseguiram chegar tão longe. 

Diz-me que Mãe tiveste, dir-te-ei o Destino que Terás

Março 1872

"A valia de uma geração depende da educação que recebeu das mães. O homem é "profundamente filho da mulher", disse Michelet. Sobretudo pela educação. Na criança, como num mármore branco, a mãe grava; mais tarde os livros, os costumes, a sociedade só conseguem escrever. As palavras escritas podem apagar-se, não se alteram as palavras gravadas. E educação dos primeiros anos, a mais dominante e que mais penetra, é feita pela mãe: os grandes princípios, religião, amor ao trabalho, amor do dever, obediência, honestidade, bondade, é ela que lhos deposita na alma. O pai, homem de trabalho, e de atividade exterior, mais longe do filho, impõe-lhe menos a sua feição; é menos camarada e menos confidente. A criança está assim entre as mãos da mãe como uma matéria transformável de que se pode fazer - um herói ou um pulha. 

Diz-me que mãe tiveste - dir-te-ei o destino que terás. 
A ação de uma geração é a expansão pública do temperamento das mães. A geração burguesa e plebeia de 1789 a 93, em França, foi livre sensível e humana - porque as mães que a conceberam tinham chorado e pensado sobre as páginas de Rousseau.
A geração de 1830, gerada durante o primeiro império - foi nervosa, idealista romântica, porque as mães tinham vivido nas emoções heróicas das guerras, na contemplação das fortunasmaravilhosas. 

Se a geração de 1851, em Portugal, foi mais forte e original do que a nossa - é porque as mães, de onde ela saiu, tinham sido as raparigas vivamente sacudidas pelos tempos dramáticos das lutas civis. 


É, pois superiormente interessante saber o que são hoje, em 1872, essas gentis raparigas de 15 a 20 anos de quem nascerá, para o bem e para o mal, a geração portuguesa de 1893. Assim poderemos prever o que elas serão mais tarde como mães, como educadoras (...)

A menina solteira! Vejamos o tipo geral de Lisboa. É um ser magrito, pálido, metido dentro de um vestido de grande puff, com um penteado laborioso e espesso, e movendo os passinhos numa tal fadiga, que mal se compreende como poderá jamais chegar ao alto do Chiado e da vida. O primeiro sinal evidente é a anemia (..) A palidez, as olheiras, o peito deprimido, o ar murcho - revelam um ser devastado por apetites e sensibilidades mórbidas. Ora entre nós as raparigas não têm saúde. Em primeiro lugar não respiram. Os seus dias são passados na preguiça, no sofá, com as janelas, fechadas (...)Depois não fazem exercício. (...) Depois não comem: é raro ver uma menina alimentar-se racionalmente de peixe, carne e vinho. Comem doce e alface. Jantam as sobremesas. A gulodice do açúcar, dos bolos de natas, é uma perpétua desnutrição (...)

Outra causa de doença é a toilette. Com estes penteados enormes, eriçados, insólitos, em forma de capacete, de fronha, de chalé, de concha, e com os materiais tenebrosos que metem por baixo (...)
Lisboa é a cidade do Universo onde as meninas mais se apertam e espartilham (...)
De modo que o balanço das condições físicas de uma rapariga portuguesa é este: músculos sem exercício; pulmões sem ar; circulação comprimida; digestão estrangulada. (...)

É a moda dizem.  - Cruel razão! A moda começa por ter isto de absurdo: não é ela que é feita para o corpo - mas o corpo que tem de ser modificado para se ajeitar nela. (...) A moda destrói a beleza e destrói o espírito. (...) 

Depois da anemia do corpo, o que nas nossas raparigas mais impressiona - é a fraqueza moral que revelam os modos e hábitos. (...)
A sua preguiça é um dos seus males. O dia de uma menina de dezoito anos é assim dissipado: almoça, vai-se pentear, corre o Diário de Notícias, cantarola um pouco pela casa, pega no croché ou na costura, atira-os para o lado, chega à janela, passa pelo espelho, dá duas pancadinhas no cabelo, adianta mais dois pontos no trabalho, deixa-o cair no regaço, come um bocadinho de doce, conversa vagamente, volta ao espelho, e assim vai puxando o tempo pelas orelhas, derreada com a sua ociosidade, e bocejando as horas. (...)

Uma menina portuguesa, não tem iniciativa, nem determinação, nem vontade. Precisa ser mandada e governada; de outro modo, irresoluta e suspensa, fica no meio da vida, com os braços caídos. Perante um perigo, uma crise de família, uma situação difícil, rezam. (...)

Veja-se uma criança educada numa quinta. Pela manhã já ela está solta, com um bife, uns largos sapatos, um velho chapéu. Corre, visita os bois, luta com o carneiro, abraça o pacífico e grave jumento, preside à reunião de galinhas, conhece os ninhos, sabe de cor as árvores; cai, enlameia-se, arranha os joelhos, cura-se pulando, recebe os largos abraços do sol penetra-se de ar, de vida, de viço; e inocente como um bicho, fresca como uma madressilva, com o bife sujo, as mãos cheias de terra, o rosto vermelho como uma amora, as narinas palpitando de vida, sem sensibilidade e sem tristezas, com um cheiro de fenos e prados atravessados, espírito vivo da verde natureza, entra em casa aos pulos, berrando pela sua sopa. À noite, cheia de fadiga, dorme como um canário. - E que educação superior, em verdade, não sai das árvores, das relvas, do pacífico marchar dos regatos, das recolhidas sombras, das searas, dos milhos, de todos os tranquilos seres que cumprem nobremente, e sossegadamente, o seu dever de crescer! (...)
Em contraste veja-se uma menina de dez anos, aqui em Lisboa, nestas altas casas encarceradas: pálida, curvada, acanhada, com olheiras, lendo já o jornal, cheia de si, caprichosa, ardendo em vontades, em curiosidades - uma boneca de cera habitada por um bico de gás. (...)

"As meninas da geração nova em Lisboa e a educação contemporânea" 
Uma Campanha Alegre / Eça de Queiroz

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Ao ler este mordaz artigo do Eça, algumas reflexões e perguntas me assaltam. Desde logo, agora não é a mãe que educa os filhos. Nem o pai. Não é mãe nem o pai juntos. São os infantários e os depósitos de crianças, chamados de escolas (e neste longo artigo também se criticam os colégios da altura). Pergunto-me sobre como seriam as mães, que da minha idade, deram os filhos que têm hoje vinte anos. E pergunto-me também - quem são as adolescentes de hoje, que têm agora 15 ou 18 anos? E que portugueses teremos na próxima geração...?